Entenda o julgamento das 3 ações contra Bolsonaro no TSE e as consequências para o ex-presidente
Parecer da Procuradoria Eleitoral é pela improcedência dos pedidos, o que diminui chances de novas condenações; Braga Netto, que também é réu, tem mais a perder
O mesmo plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que tornou Jair Bolsonaro (PL) inelegível em junho deste ano volta a julgar o ex-presidente nesta terça-feira, 10, em três ações de investigação judicial eleitoral por abuso do poder político durante a campanha de 2022. O general Walter Braga Netto (PL), vice na chapa, também é réu nessas ações.
Duas foram propostas pelo PDT e são assinadas pelo advogado Walber Agra, que foi à tribuna do TSE defender a inelegibilidade de Bolsonaro. Essas ações são sobre as lives feitas pelo ex-presidente nos dias 18 de agosto e 21 de setembro de 2022, com o argumento de que teria usado as estruturas do poder público para pedir votos para ele mesmo e para apoiadores.
Um dos políticos que, na ocasião, esteve ao lado de Bolsonaro pedindo votos para ele na campanha é Romeu Zema (Novo), que, um ano mais tarde, tem dado sinais de que quer se distanciar do ex-presidente. As investigações conduzidas pela Polícia Federal sobre o caso das joias sauditas e a fraude nos cartões de vacinação, além da inelegibilidade decretada pelo TSE, têm reduzido a fidelidade dos apoiadores bolsonaristas.
Benedito Gonçalves, o corregedor-geral eleitoral, é o relator das três ações que vão a julgamento nesta terça. Bolsonaro será julgado pelos mesmos ministros que o tornaram inelegível.
Nos casos desta terça, MPF é contra condenação de Bolsonaro
Um fator que diferencia esses três processos do que tornou Bolsonaro inelegível é o entendimento da Procuradoria-Geral da República (PGR). Por ser um braço do Ministério Público Federal (MPF), mesmo sem sem ser autora do processo, a Procuradoria Eleitoral se manifesta nas ações de investigação judicial eleitoral, opinando pela procedência ou pela improcedência dos pedidos.
Apesar de ser uma manifestação, o que a PGR diz tem bastante peso na decisão do Tribunal. Nos três casos que vão a julgamento nesta terça, o vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gustavo Gonet Branco, opinou pela improcedência das ações. Em junho, ele se manifestou pela inelegibilidade de Bolsonaro e disse, no plenário do TSE, que o ex-presidente fez uma "investida ardilosa" contra a democracia.
"Assim, a discussão em si sobre a possibilidade de realização de lives no palácio perde interesse, ante a falta de evidência da repercussão danosa do fato sobre a legitimidade do processo eleitoral", disse Gonet em um dos processos do PDT que vai a julgamento nesta terça.
Sobre os encontros com governadores e artistas, o vice-procurador disse que não é possível garantir que "essas manifestações de abono produzidas em prédios públicos" tiveram "impacto substancial" sobre a validade das eleições.
De acordo com a lei, os ministros do TSE não precisam concordar com a PGR e podem condenar Bolsonaro mesmo assim. Agra, advogado do PDT, diz que a sigla continuará lutando por uma condenação. "As provas do caso não são individuais, são sistêmicas", disse ao Estadão.
Bolsonaro pode ser declarado inelegível de novo
As ações de investigação judicial eleitoral têm três possíveis sanções: a inelegibilidade, a cassação da chapa e o encaminhamento para investigação criminal. De acordo com a advogada eleitoral Izabelle Paes, sócia do escritório Callado, Petrin, Paes e Cezar, a cassação não é mais possível, porque as eleições já se encerraram e Bolsonaro foi derrotado. Por isso, essa punição não teria efeito algum.
Já a inelegibilidade é um horizonte possível tanto para Bolsonaro quanto para Braga Netto, mas terá pesos distintos para os dois. Se o TSE discordar da PGR e decidir que houve abuso de poder político no caso das lives e dos apoios de governadores e artistas, Bolsonaro pode ser declarado inelegível de novo.
No entanto, a inelegibilidade não funciona como uma pena criminal - em que uma condenação vai sendo somada com a outra e ficando cada vez mais longa. "Não haverá uma somatória de penas, cada período de inelegibilidade vai correr em separado. No caso (de Bolsonaro), o prazo de inelegibilidade será coincidente", explicou Paes.
Na ação julgada em junho, Bolsonaro se tornou inelegível por ter atacado, sem provas, o sistema eleitoral brasileiro em reunião feita com embaixadores de todo o mundo em julho de 2022. Os oito anos de inelegibilidade são contabilizados a partir do primeiro turno da eleição na qual ocorreu o episódio.
Como as ações em julgamento nesta terça são referentes à mesma campanha eleitoral, se Bolsonaro for condenado, os oito anos de inelegibilidade terão a mesma vigência. Ou seja, o ex-presidente permanecerá inelegível até 2030.
A principal questão para o ex-presidente é que múltiplas condenações de inelegibilidade minam a possibilidade de ele voltar às urnas por meio de recursos judiciais. Se for condenado nas três ações em pauta nesta terça, ele terá quatro decisões de inelegibilidade para tentar reverter no Supremo Tribunal Federal (STF).
Braga Netto é quem tem mais a perder
Na ação que tornou Bolsonaro inelegível, em junho deste ano, o vice na chapa, Braga Netto, foi inocentado. Por isso, ele ainda está na corrida eleitoral e tem se apresentado como pré-candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro em 2024.
Por isso, se o TSE decidir condenar os dois, Braga Netto é quem mais tem a perder. Bolsonaro está recorrendo ao Supremo da sua condenação de junho, mas, até segunda ordem, tem oito anos fora das urnas pela frente. Naquele caso, a Corte Eleitoral entendeu que o vice não teve participação nos atos que foram interpretados como abusos de poder.
Na última sexta-feira, 6, Bolsonaro criticou publicamente o TSE durante uma agenda em Belo Horizonte. "Não sei o que vai acontecer. O TSE é um julgamento muito político, de esquerda, que tem acontecido lá. Isso é ruim para a democracia", disse o ex-presidente a jornalistas.
Possibilidade de investigação criminal
Outra eventual punição da ação de investigação judicial eleitoral é que os ministros do TSE enviem cópia do processo para o Ministério Público, indicando a possibilidade de que seja aberta uma ação criminal.
A Justiça Eleitoral só pode punir dentro dos limites das questões eleitorais. Por isso, ninguém pode ser preso, por exemplo, por ordem do TSE. No entanto, se ao avaliar o processo, os ministros entenderem que há indício de crime, podem enviar o caso para a Procuradoria, pedindo a abertura de um inquérito - hipótese que não está descartada nas ações desta terça.
A palavra final sobre a possibilidade de abrir ou não um processo criminal é do Ministério Público, que vai colher provas ao longo da investigação. No entanto, uma indicação vinda de um tribunal tem maior peso.