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Política

PT foi varrido por um ‘tsunami’, diz Eduardo Suplicy

27 nov 2015 - 16h50
(atualizado às 17h53)
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Suplicy diz que administrações estaduais e municipais do PT devem dar "exemplo"
Suplicy diz que administrações estaduais e municipais do PT devem dar "exemplo"
Foto: Eduardo Suplicy (Arquivo Pessoal / BBC News Brasil

Eduardo Suplicy, senador por 24 anos e hoje secretário de Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo, diz ter sido atingido pelo que define como um “tsunami” que varreu o PT nos últimos meses. Um dos políticos da sigla com melhor imagem perante a opinião pública, Suplicy é tido como íntegro e idealista – embora, para alguns críticos, também um pouco ingênuo ou "contraditório".

Foi, em 1991, o primeiro senador eleito pelo PT, partido que ajudou a fundar nos anos 80. No Congresso, redigiu pedidos de CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) que resultariam no afastamento do então presidente Fernando Collor e no escândalo dos Anões do Orçamento. No governo Lula, contrariou uma diretriz da legenda e assinou, chorando, o pedido de criação da CPI dos Correios, que escancararia o escândalo do mensalão.

Com um estilo pouco convencional, recebe cumprimentos e pedidos de foto por onde passa. Mas a boa imagem não foi suficiente para reelegê-lo no ano passado, quando perdeu a cadeira no Senado para José Serra (PSDB). Ele atribui a derrota justamente a esse "tsunami" antipetista.

Depois da eleição, muitos simpatizantes vêm abordando Suplicy nas ruas e redes sociais pedindo que deixe o PT. Em outubro, porém, ele chegou a ser hostilizado durante um debate numa livraria. “Um grupo de 10 ou 12 pessoas começou a gritar, de maneira bastante ofensiva, ‘Suplicy, vergonha do Brasil’”, lembra.

Em entrevista à BBC Brasil, ele falou sobre corrupção, a prisão do senador Delcídio Amaral, a filiação da ex-mulher, a senadora Marta Suplicy, ao PMDB, e nomes petistas que poderiam ser alternativas a Lula na disputa pela Presidência em 2018. Confira os principais trechos da entrevista:

BBC Brasil - O senhor sempre abraçou a bandeira da ética e, em função dos escândalos recentes, é abordado por pessoas que pedem que deixe o PT. Por que permanece?

Eduardo Suplicy – Se houve problemas sérios com algumas pessoas em uma organização com mais de um milhão e meio de filiados, avalio que é da minha responsabilidade procurar prevenir e corrigir os erros, onde eu estiver. Por exemplo, hoje estou aqui na secretaria, onde agimos com correção e transparência. O mesmo vale para o prefeito Haddad, que criou uma controladoria para prevenir problemas.

Se você olhar meu Facebook, a maioria das mensagens é de apoio, positivas. Há, de fato, aqueles que falam: “Como você ainda está no PT? Gostaria que deixasse o partido.” Respondo isso: me sinto na responsabilidade de buscar prevenir e corrigir os erros. Por exemplo, quando era senador, apresentei projetos propondo que toda e qualquer contribuição (de campanha) fosse registrada na página eletrônica dos candidatos e partidos.

Em 2002, numa reunião do diretório nacional do PT, o deputado Chico Alencar (hoje no PSOL) também propôs transparência total das contribuições. Eu o apoiei. Conversei com o Delúbio (ex-tesoureiro do PT) que disse que isso poderia inibir a doação da parte de algumas empresas. Se tivéssemos aprovado o que sempre defendi...

Fui convidado a ser um dos fundadores do PT porque tinha afinidade com os propósitos do partido: construir uma nação mais justa, dando voz e vez àqueles que por tanto tempo estiveram excluídos da sociedade. E fazer isso com democracia, liberdade de expressão, retidão ética. Estes princípios são os que defendo até hoje.

Para o ex-senador, Haddad tem chances de se reeleger em São Paulo
Para o ex-senador, Haddad tem chances de se reeleger em São Paulo
Foto: Divulgação/BBC Brasil / BBC News Brasil

BBC Brasil - Mas não fica difícil defender a ética em um partido envolvido em escândalos dessa magnitude? Colegas com os quais o sr. tem afinidade deixaram o partido: a Luíza Erundina (PSB), a Heloísa Helena (PSOL), a própria Marta (PMDB).

Suplicy - Tenho todo o respeito e muita afinidade com pessoas como a Heloísa Helena, a Luiza Erundina. Também respeito a decisão da Marta de sair do PT, mas achei que não era o caso de seguir o mesmo caminho. Prefiro continuar no PT, em cujos propósitos de fundação eu acreditei e acredito.

Reitero que, sim, erros graves, gravíssimos, aconteceram. Eu sempre lembro as palavras do Lula: “Parece que Deus é brasileiro, ajudou a Petrobras a encontrar essa extraordinária reserva petrolífera que vai nos permitir em breve erradicar a pobreza e melhorar a educação”. De repente, vemos pessoas na Petrobras se enriquecendo de forma ilícita, desviando recursos que deveriam ser canalizados para o bem do povo. É um erro gravíssimo.

Mas acho que, felizmente, temos os instrumentos no Brasil (para lidar com isso). Desde a Polícia Federal, que tem a cooperação da Controladoria Geral da República e do governo, até a Advocacia Geral da União, os órgãos da Justiça. É muito importante que todos os que foram apontados como responsáveis por desvios sejam responsabilizados. Eles precisam ter seu direito de defesa assegurado, mas quem procedeu com incorreções precisa ser punido.

Se pessoas (com as quais convivi) ao longo de minha vida no PT procederam com incorreção, me sinto entristecido. Isso me machuca profundamente. Mas não é que precise sair do PT. Posso ter para com eles uma compreensão. Qualquer ser humano pode errar. Mas precisa fazer tudo para não incidir novamente nesses erros. E nós, como organização, precisamos tomar as medidas para recuperar o que um dia foi uma das bandeiras mais importantes do PT: a defesa da ética. Sei que isso não será fácil, mas colaborarei no que puder.

E não foi apenas o PT que teve pessoas denunciadas por malfeitos. Praticamente em todos os partidos temos problemas. Então se uma pessoa sai do PT dizendo que tomou a decisão em função de incorreções, mas vai para outro partido no qual também está havendo problemas sérios, como fica?

Marta Suplicy deixou o PT pelo PMDB
Marta Suplicy deixou o PT pelo PMDB
Foto: Marta Suplicy (Agência Brasil / BBC News Brasil

BBC Brasil - O sr. parece estar se referindo a Marta. Como vê sua filiação ao PMDB?

Suplicy - Ela lá (no PMDB) estará tomando conhecimento de que algumas pessoas no PMDB agiram de forma muito inadequada. Como disse, respeito a decisão dela, mas é claro que ela está consciente desses episódios envolvendo lideranças do PMDB. Em especial, o presidente da Câmara (Eduardo Cunha). Acho que você pode perguntar a ela qual é sua posição sobre essa pessoa que é tão importante para o PMDB.

BBC Brasil - E a posição do PT sobre Cunha? Há a possibilidade de um acordo velado com o deputado?

Suplicy - Ainda hoje li nos jornais que a bancada do PT vai votar pelo afastamento de Cunha. Com isso, vai deixar clara a posição do partido sobre uma pessoa que afirmou no Conselho de Ética da Câmara que nunca teve contas no exterior. E depois a Justiça da Suíça expôs com clareza que ele e seus familiares movimentaram quantias muito grandes de recursos em contas no exterior, que certamente tiveram origem inapropriada.

É claro que é preciso resguardar o direito de defesa. Cunha terá e está tendo oportunidade de se defender. Mas cabe mencionar que o próprio relator (do processo sobre cassação), que é da sua base de apoio, fez um parecer favorável a apreciação das denúncias. Até o PSDB, que há um mês estava se aliando a Cunha visando afastar a presidente Dilma, hoje está declarando, pela voz do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que ele precisa renunciar ou “será renunciado”.

A Marta, claro, está lendo essas noticias e tem ciência de que não é apenas no PT que ocorreram procedimentos incorretos. Quando ela estava para sair do PT, em algumas ocasiões eu fui perguntado (sobre o que deveria fazer). Mas ela preferiu a respeito desse assunto não dialogar comigo. A respeito de nossos filhos queridos, nossos netos, sempre temos de dialogar. Agora, sobre decisão de vida política (não).

Ex-senador vê o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, como possível nome do PT para 2018
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Foto: Jacques Wagner (Agencia Brasil / BBC News Brasil

BBC Brasil - Então em uma disputa entre Haddad e Marta em São Paulo, o sr. apoiaria Haddad?

Suplicy - Sim. Ela sabe disso. Considero Haddad um bom prefeito, com bons propósitos. Reconheço trabalhos de grande mérito que Marta realizou na prefeitura, como a construção dos CEUS (Centros Educacionais Unificados), que continuam a ser criados e agora também têm recebido cursos superiores e para idosos.

Marta tem sido critica da atual gestão, mas eu, que estou vendo mais de perto, sei que tem méritos consideráveis. Ainda nesses dias têm saído boas noticias sobre a diminuição da velocidade nas marginais e outras vias de São Paulo: em 2015, houve uma redução significativa de mortes no trânsito. Também houve resistência quando foram colocadas as ciclovias, mas hoje a maior parte da população concorda que precisamos estimular o uso de bicicletas.

BBC Brasil - Por que os índices de popularidade de Haddad estão baixos, inclusive nas periferias?

Suplicy - Tenho a convicção de que a aprovação de Haddad vai crescer bastante em todas as regiões da capital. Quando chegar o momento das eleições, com os debates, os eleitores vão poder confrontar as palavras e argumentos do prefeito com os dos demais (candidatos). E aí ele tem uma chance enorme de crescer muito e vencer as eleições. Hoje, grande parte dos meios de comunicação tem uma certa postura (crítica) sobre ele...

BBC Brasil – O problema é que a mídia é injusta com o prefeito?

Suplicy - É normal que ocorram as críticas e que os jornalistas e veículos da imprensa queiram estar um mais atento que o outro para mostrar falhas na administração publica municipal. Nem sempre fazem isso com a mesma ênfase em relação ao governo do Estado, do PSDB. Mas sabemos que isso acontece.

Além disso, todos do PT estamos vivendo uma situação bastante difícil, em especial em São Paulo. Fui eleito para o Senado em 1990, 1998 e 2006. Em 2006, mesmo depois do mensalão, recebi mais de 8 milhões de votos.

Em 2014, fui um candidato forte, mas o que houve foi um verdadeiro tsunami sobre o PT em São Paulo. A presidente Dilma teve 25% dos votos por aqui, contra 70%, 80% no Nordeste. O nosso candidato a governador, Alexandre Padilha, teve 18%. Tive uma boa votação, de 6,7 milhões de votos, mas não suficiente para vencer. É da democracia. Tudo bem.

BBC Brasil – A que o sr. atribui esse tsunami contra o PT?

Suplicy - Por causa das denúncias ligadas a operação Lava Jato. criou-se uma imagem do PT muito negativa, principalmente nos lugares onde os grandes meios de comunicação estão sediados – e em especial em São Paulo. (Esses meios) destacaram muito isso junto a opinião pública e tivemos esse efeito que eu chamei de tsunami sobre o PT, mas acho que vamos dar a volta por cima.

Delcídio Amaral foi preso acusado de tentar obstruir as investigações da Lava Jato
Delcídio Amaral foi preso acusado de tentar obstruir as investigações da Lava Jato
Foto: Delcídio Amaral / BBC News Brasil

BBC Brasil – Culpar a imprensa não é atirar no mensageiro por não gostar da mensagem?

Suplicy - Acho que houve críticas muito fortes em função de problemas que foram causados por nós mesmos. Reconheço isso. Mas o efeito foi tão forte que mesmo pessoas que não estavam envolvidas em malfeitos acabaram prejudicadas por ser do PT.

BBC Brasil – O senhor foi hostilizado em uma livraria por manifestantes críticos ao PT…

Suplicy - Foi durante um debate com Haddad. Havia umas 170 pessoas lá para ouvir, mas alguns queriam impedir o evento. Começaram a gritar, mostrar faixas contra o prefeito, mesmo antes do debate começar. Na hora de sair, estava concluindo uma entrevista e um grupo de 10 ou 12 pessoas começou a gritar, de maneira bastante ofensiva, “Suplicy, vergonha do Brasil”.

Eu me aproximei deles, quis dialogar. Eles só gritavam. Então eu disse a uma das moças que tanto gritava: “Golpista”. Desisti e sai. Mas se você me acompanhar a qualquer lugar, restaurante, cinema, teatro ou casa de espetáculo vai ver que sempre sou recebido com respeito e carinho. Ontem fiz uma palestra na Subprefeitura de Vila Maria e fiquei 30 minutos dando autógrafos.

BBC Brasil – Passou a evitar alguns lugares depois do episódio?

Suplicy – Não. Vou a todas as partes. Ainda no domingo fui almoçar num restaurante no Jardim Paulistano (área nobre de São Paulo), onde costumo ir com meus filhos. Ao longo do almoço pelo menos sete pessoas vieram me cumprimentar, pedir foto. Sobre o episódio do mês passado, muitas pessoas, em apoio a mim, até disseram que não iriam mais frequentar a livraria, mas a Livraria Cultura não tem nenhuma responsabilidade sobre o que aconteceu.

BBC Brasil - Como o sr. avalia a prisão de Delcídio Amaral, líder do PT no Senado? Em que medida isso agrava a crise do partido?

Suplicy - Todos ficamos muito tristes, feridos com o episódio. Claro que é necessário se assegurar o direito de defesa do senador, ele terá chance de se explicar. Mas nas explicações que deu ontem à Polícia Federal (ele) confirma o diálogo gravado. Ele disse que teve uma "atitude humanitária" com relação ao (ex-diretor da Petrobras, Nestor) Cerveró. Pelo que se sabe até o momento, houve um procedimento indevido no qual teria oferecido um valor para a família (do diretor), condicionado a ele (Cerveró) não fazer uma denúncia.

Isso é inadmissível, um procedimento indevido que, se comprovado, exige sanções. E é mais um fato grave que a tinge o PT nesse contexto sobre o qual conversamos. Os membros do PT que avaliam que a ética e a retidão são essenciais no trato da coisa pública não podemos aceitar esse tipo de procedimento. Mas antes de tudo é preciso ter o conhecimento completo dos fatos.

BBC Brasil - Já faz alguns anos que o PT perdeu protagonismo na questão dos direitos humanos. Um marco foi quando o deputado Marcos Feliciano (PSC) assumiu a comissão de DH da Câmara. Como o sr. vê isso?

Suplicy - Olha é interessante observar que para essa tendência conservadora de alguns parlamentares tem havido, por outro lado, uma reação muito positiva e crescente na defesa dos direitos humanos por movimentos populares. O próprio Eduardo Cunha parece estar preocupado, dizendo que não é tão conservador assim. Ele escreveu um artigo na Folha (de S.Paulo) com esse propósito. Acho que a maior parte dessas iniciativas (da “agenda conservadora”) vai ser barrada pelo Senado.

BBC Brasil - O senhor é a favor da volta de Lula em 2018?

Suplicy - Acho natural que, com sua trajetória, o presidente Lula se candidate novamente.

Em 2002, fui pré-candidato a Presidência. Pela primeira vez na história do Brasil um partido convidou seus filiados a votarem (para decidir seu candidato). Fiz uma visita a Lula e disse: “Alguns amigos dizem que devo ser candidato e estou considerando a possibilidade, mas se você achar que isso vai prejudicar o partido ou a você, desisto.” Ele disse: “Eduardo, por tudo que você fez na vida e pelo partido, tem todo direito de se inscrever”.

Também acredito que, se o Lula for pré-candidato, é possível que surjam outros - e é importante que haja um processo democrático.

BBC Brasil - Quais seriam as alternativas ao ex-presidente?

Suplicy - Felizmente, o PT tem muitos políticos que poderão ser pré-candidatos, como aqueles que foram governadores e têm sido ministros. Jaques Wagner, Tarso Genro, Jorge Vianna. Pessoas que foram prefeitos e prefeitas de grandes capitais (também). Se a Marta estivesse no PT, poderia até ser pré-candidata. Mencionei três possíveis nomes, mas poderia ter mencionado dez.

BBC Brasil - Lula também tem enfrentado uma queda de popularidade. Suas relações com construtoras tem sido alvo de questionamentos. Isso faz o PT pensar em alternativas?

Suplicy - A população reconhece os extraordinários méritos de Lula pelo que ele realizou ao longo da sua vida. Com respeito a esses episódios, ao mensalão, ao que aconteceu na Petrobras, é claro que isso tem um certo peso e algumas pessoas tentaram imputar ao Lula alguma responsabilidade.

Mas ele terá condições de dar explicações para cada um desses episódios, como já está fazendo, com entrevistas e pronunciamentos. É importante que ele responda (aos questionamentos). Estamos felizmente em uma democracia e tudo pode ser perguntado e esclarecido.

BBC Brasil - O senhor “põe a mão no fogo” por Lula?

Suplicy - Em toda minha convivência com Lula, muitas vezes ele ressaltou a importância da ética para o PT. Confirmo que ele tem um procedimento ético muito positivo. Se algum dia ocorreu alguma falha, ele precisa responder por isso e terá toda condição de fazê-lo.

BBC Brasil - Como salvar o PT do que alguns veem como uma crise moral... e do tsunami, como o sr diz?

Suplicy - Com esforço, determinação e consciência desses graves problemas por parte de cada um dos membros do PT, em cada lugar onde atuamos. Eu tenho minha responsabilidade na secretaria, para que aqui não se cometam erros e ações inadequadas. Isso dá muito trabalho. É preciso estar muito atento. Montar equipes sérias e competentes ao administrar recursos e assinar convênios com diversas entidades.

O PT tem algumas administrações estaduais e diversas municipais. Precisamos dar o exemplo em todos os lugares.

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