Erika Hilton pede investigação de prefeito de SP por uso de imagem de crianças; Nunes contesta
Ricardo Nunes e o secretário de Assistência Social, Carlos Bezerra Junior, dizem que deputada do Psol tem 'atitute oportunista' com interesse eleitoral
A deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) protocolou nesta quarta-feira, 19, uma representação pedindo ao Ministério Público que investigue o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), e o secretário de Assistência Social, Carlos Bezerra Junior, pelo suposto uso de imagens, sem autorização, de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social para mostrar feitos da gestão. A Prefeitura reagiu, dizendo que a deputada age movida por oportunismo com mero interesse eleitoral.
O documento é endereçado à Promotoria da Infância e Juventude do MP de São Paulo e aponta para oito publicações feitas nas redes sociais do prefeito e do secretário com imagens de crianças e adolescentes. O Ministério Público confirmou ao Estadão que recebeu o documento. Ele será analisado internamente.
Uma das ocasiões que foi apresentada no pedido de investigação é do dia 7 de junho deste ano. Nunes e Bezerra Junior visitaram juntos dois projetos da Assistência Social em Capela do Socorro, subprefeitura que abrange os distritos de Grajaú, Cidade Dutra e Socorro, na zona sul de São Paulo. Nas imagens, os dois aparecem rodeados de crianças que são contempladas pelos projetos.
"Muito feliz com o que vi nas visitas que realizei a dois importantes serviços da Secretaria de Assistência Social, na Capela do Socorro: o Centro de Desenvolvimento Social e Produtivo (CEDESP) 'Rosa Mística' e o Centro para Crianças e Adolescentes (CCA) 'Sete de Setembro'. O trabalho realizado nesses lugares me faz ter a certeza de que estamos no caminho certo no que se refere ao apoio e fortalecimento de vínculos para pessoas em vulnerabilidade social", escreveu Nunes nas redes sociais.
Outro episódio que fundamenta a representação é um vídeo que Bezerra Junior publicou no dia 19 de abril. De acordo com as imagens, ele aborda uma família em situação de rua e ajuda a equipe da pasta a conduzir uma mãe com dois filhos a uma instituição de acolhimento. A legenda do vídeo diz: "Ficar nas ruas é estar sujeito a uma série de violações e violências, ainda mais quando se está com crianças. Por isso, a gente insiste mesmo para que as pessoas sejam acolhidas. E a gente vem trabalhando para melhorar os serviços".
Outras situações
Além dos oito episódios enumerados na representação, a reportagem encontrou outras publicações nas redes sociais do prefeito e do secretário nas quais crianças e adolescentes aparecem. Não há indicação de autorização dos responsáveis. No dia 5 de julho, Nunes visitou a comunidade da Favela do Haiti, na Vila Prudente, zona oeste de São Paulo, prestigiando ações do Favela 3D, projeto que busca melhorar as condições de vida dos moradores da região.
"A mudança que estamos realizando na Favela do Haiti é um exemplo de que precisamos unir forças para interromper o ciclo de pobreza das favelas", escreveu Nunes. Ele aparece em fotografias cumprimentando crianças.
No dia 4 de julho, Bezerra Junior publicou um vídeo mostrando o acolhimento de uma família em situação de rua na praça Marechal Deodoro, no centro de São Paulo. No vídeo, ele conversa com os pais da menina, mostra eles recolhendo os pertences para irem ao hotel da Assistência Social e abraça a criança.
Na legenda do vídeo, o secretário mencionou o nome da menina. "Hoje, graças a Deus, a pequena [...] e seus pais dormirão seguros, protegidos do frio, acolhidos em um hotel social", escreveu Bezerra Junior, marcando o perfil do prefeito.
Violação ao ECA e à LGPD
A representação protocolada nesta quarta alega que as publicações feitas pelo prefeito e pelo secretário nas redes sociais violam o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
"No caso em análise, não há qualquer informação disponível sobre como foi coletado o consentimento das crianças, adolescentes ou seus responsáveis para figurarem nas postagens das contas de Instagram analisadas, tampouco sobre sua ciência dos termos de processamento de dados da plataforma digital em questão e como essa comunicação foi feita, se é que foi feita", diz o documento.
Nele, Erika pede ao MP de São Paulo que Nunes e Bezerra Junior sejam intimados a mostrar se eles têm autorização e dados das pessoas que aparecem nas imagens. A parlamentar também diz que outro ponto da investigação deve ser a "legitimidade do propósito na exposição dessas crianças e adolescentes".
"Há indícios de que os gestores públicos indicados exploram de modo indevido a imagem de crianças e adolescentes para fins de promover ações da Prefeitura com contornos publicitários, ainda que não mercadológicos", diz a representação. "Ao fazer isso, estão violando a intimidade, privacidade e dignidade das crianças e adolescentes envolvidas, especialmente aquelas que são retratadas em condição de extrema vulnerabilidade."
A abertura de uma investigação depende da avaliação do promotor de Justiça que receberá o pedido.
O que o prefeito e o secretário têm a dizer
O Estadão entrou em contato com as assessorias de comunicação do prefeito Ricardo Nunes e da Secretaria de Assistência Social, pasta chefiada por Carlos Bezerra Junior. Eles responderam através de uma nota enviada pela Prefeitura de São Paulo. Veja a íntegra:
"A referida representação ao Ministério Público de SP é uma atitude oportunista e desprovida de fundamentação, com claro objetivo eleitoral, assinada por adversários políticos que reiteradamente votam contra projetos ou políticas públicas que visam o benefício da população em situação de vulnerabilidade, como o Programa Reencontro, ou o acolhimento em abrigos municipais, bloqueados por decisão liminar, posteriormente cassadas pela justiça. As mencionadas postagens em redes sociais respeitam rigorosamente a legislação em vigor, em especial o Estatuto da Criança e do Adolescente ECA."