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Política

Ex-tesoureiro do PT faz dossiê para municiar partido contra Moro e Deltan

Dossiê inclui trocas de mensagens entre procuradores e o ex-juiz obtidas por hackers; parte do conteúdo está sob sigilo da Justiça

26 out 2022 - 17h14
(atualizado às 17h35)
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João Vaccari Neto foi condenado e preso no âmbito da Operação Lava Jato.
João Vaccari Neto foi condenado e preso no âmbito da Operação Lava Jato.
Foto: André Dusek/Estadão / Estadão

O ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto trabalha desde novembro do ano passado na produção de um dossiê sobre a Lava Jato para municiar parlamentares petistas contra o ex-juiz Sérgio Moro e o ex-procurador Deltan Dallagnol, que assumem cargos no Congresso em 2023. Vaccari, que foi condenado na operação e cumpriu pena de prisão, também reuniu outras informações para subsidiar a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva contra acusações de corrupção disparadas pelo rival Jair Bolsonaro (PL).

Em fase final de produção, o dossiê inclui trocas de mensagens entre procuradores e o ex-juiz obtidas por hackers, além de relatos de delatores e dados financeiros dos acordos firmados por réus com o Ministério Público. Parte do conteúdo, que foi alvo da Operação Spoofing da Polícia Federal, está sob sigilo da Justiça.

Na quarta-feira passada Vaccari apresentou uma versão preliminar do dossiê a Rui Falcão, um dos coordenadores de comunicação da campanha de Lula e deputado federal reeleito. O Estadão/Broadcast teve acesso ao diálogo.

Em cerca de 40 minutos, o ex-tesoureiro mostrou a Falcão o conteúdo que havia amealhado com a ajuda de cinco advogados. Vaccari não diz, nem Falcão questiona, como o material foi obtido. "Na hora que o Deltan aparecer (no Congresso), vocês já caem de cacete em cima dele. Do Moro, a mesma coisa. Nós queremos também fazer chegar que eles esculhambam ministros do STF, esculhambam ministros do STJ. Ninguém fez esse tipo de trabalho", disse Vaccari a Falcão nesse encontro.

Vaccari foi tesoureiro da campanha de Dilma Rousseff à Presidência em 2014 e também ocupou cargos importantes no PT, como o de secretário de finanças. Em 2015, ele foi condenado pela Lava Jato e ficou preso por dois anos e três meses. Nunca aceitou fazer delação premiada.

O ex-tesoureiro não participa da atual campanha de Lula, tanto que o encontro não ocorreu no comitê da candidatura do PT, mas em outro endereço de Falcão na capital paulista.

Além de minar a reputação dos líderes da operação em que Lula foi condenado à prisão, o objetivo de Vaccari é emplacar a versão segundo a qual os atos de corrupção identificados na Petrobras pela força-tarefa foram praticados por executivos da estatal e de empresas privadas, livrando políticos petistas.

O ex-tesoureiro, assim como Rui Falcão, acredita que Lula deveria explorar esse viés ao ser confrontado por Bolsonaro sobre corrupção. A tese de Vaccari se baseia em um personagem: Pedro Barusco, o executivo da Petrobras que devolveu sozinho R$ 157 milhões em 2015, ao admitir que participou de um esquema de corrupção na empresa.

Para Vaccari, Barusco enriqueceu recebendo propina em contratos superfaturados na Sete Brasil, que não chegaram a ele nem ao PT. A versão que prevaleceu nos julgamentos conduzidos por Sérgio Moro contam outra história: a de que todos os desvios tinham como finalidade bancar, além de vantagens aos executivos, campanhas e propinas a políticos do PT e de partidos aliados.

PEN DRIVES

Vaccari foi acusado de receber recursos em nome do partido. Só a Sete Brasil, segundo a denúncia do Ministério Público, destinava 0,9% do valor de contratação de sondas pela Petrobras para o pagamento de propinas. Na conversa entre os dois petistas, o ex-tesoureiro prometeu a Falcão entregar a parlamentares do PT pen drives com todo o conteúdo que coletou: um dossiê composto por 100 mil chats, 15 mil documentos do Ministério Público e 500 mil arquivos sobre os quais ele ainda se debruça para identificar os mais relevantes.

São delações, colaborações, acordos de leniência. Tudo que, de uma forma ou de outra, tenha passado pela Lava Jato de Curitiba. Coisas que, segundo o ex-tesoureiro prometeu a Falcão, "você nunca ouviu falar".

O dossiê é organizado em capítulos, como "Colaboração internacional", "Moro e o governo Bolsonaro", "Interferência nas eleições de 2016", "Relações com Ministro Fachin" e "A vida luxuosa de Pedro Barusco". Em pelo menos um deles, foram reunidas ofensas captadas nas conversas de Moro com os procuradores da Lava Jato direcionadas a membros do Judiciário, como ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

Falcão afirmou que deseja utilizar as informações para enfrentar Moro e Dallagnol no Congresso. "Isso aí, a gente tem que fazer uma coisa organizada, porque esses caras vão estar em Brasília. A gente tem que fazer guerra contra esses caras."

Segundo Vaccari, o material produzido por ele tem como fonte os arquivos obtidos por hackers que ficaram conhecidos por participar do que foi batizado de Vaza Jato pelo The Intercept, site que divulgou as conversas privadas de Moro com procuradores da Lava Jato e de grupos que eles mantinham no Telegram. Nem o ex-juiz nem Dallagnol, que chefiava a Lava Jato, reconheceram a autenticidade das conversas.

O material dos hackers está sob sigilo, assim como a perícia feita para comprovar se as conversas são autênticas. Em 2021, o Estadão/Broadcast revelou que os peritos não conseguiram chegar a uma conclusão sobre a autenticidade.

A defesa de Lula teve acesso ao material na íntegra em janeiro de 2021, por uma decisão do ministro Ricardo Lewandowski. O ex-presidente tentava provar no STF que Moro o julgou de forma enviesada, o que acabou prevalecendo em decisão da Corte de junho do ano passado.

Na decisão, Lewandowski condicionou a autorização à obrigação de manter sigilo. Outros réus da operação também tiveram a permissão da Corte. Vaccari, por sua vez, tentou e não conseguiu acesso ao conteúdo.

Procurado, Falcão negou que tenha havido o encontro. Vaccari não respondeu. A reportagem tentou contato na noite desta terça-feira, 25, com Moro e Deltan, mas eles não haviam respondido até a publicação desta matéria.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Estadão
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