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Política

Falta Legislativo, sobra convicção no caso Daniel Silveira

Respostas para atenuarmos o conflito entre o parlamentar verborrágico e o STF hiperativo está no Parlamento

18 fev 2021 - 01h06
(atualizado às 07h26)
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Daniel Silveira pode sonhar em virar mártir na vida de quem é radical e se deixa levar por discursos de enfrentamento ao poder instituído. Coitado. A realidade é que ele é apenas mais um caso comum de ausência de Legislativo e abundância de convicção em nossa realidade política. Nada além disso.

Daniel Silveira no IML do Rio de Janeiro para fazer exame de corpo de delito
Daniel Silveira no IML do Rio de Janeiro para fazer exame de corpo de delito
Foto: Betinho Casas Novas / Futura Press

As respostas para atenuarmos o conflito entre o parlamentar verborrágico e o STF hiperativo está no Legislativo. Se legisladores não fossem tão cúmplices de suas próprias aberrações e entendessem que toda liberdade tem um limite regulado pela lei, os processos por quebra de decoro teriam menos o caráter inoperante do clientelismo e do corporativismo, e mais o aroma do universalismo de procedimentos. Não é bem assim, e já mostramos isso em texto do blog Legis-Ativo. Essa ação entre pares protetores escamoteados por uma Constituição que fala em proteção quase absoluta à incontinência verbal dos parlamentares garantiu, por exemplo, a Bolsonaro décadas como deputado, até chegar ao Planalto sem nunca ter seu mandato retirado pelos pares.

O problema não acaba aqui. A convicção não caracteriza apenas os parlamentares, mas o brasileiro em geral. É de Buarque de Holanda a percepção de que somos ibéricos, onde cada um é filho de si. No STF não é diferente, e estamos cansados de ouvir que ali não existe um órgão colegiado, mas 11 ilhas de excelência num mar sem fim de crenças e interpretações pessoais e contestáveis da lei - por melhor que a peça de Moraes para justificar a prisão de Silveira possa ser.

Lembremos: ministros do STF são contratados pelo Senado, a partir de indicação do Executivo, assim como em tese só podem ser demitidos por este mesmo Senado de acordo com o artigo 52 da Constituição Federal. Conhece algum pedido formal de demissão de ministro do STF que prosperou? Esse fenômeno é mais raro que punição de deputado por quebra de decoro.

E aqui está a resposta ao caso Daniel Silveira x Alexandre de Moraes: falta Legislativo. Para barrar as convicções. E se falta Legislativo, falta percepção ampla e cultural de Democracia - aos moldes de como a concebemos. A democracia é um cálculo subjetivo, coletivo e, portanto, sofisticado demais para fazer parte do rol de responsabilidades individuais de parlamentares e membros da justiça desse país. E em sendo assim, essa conta nunca vai fechar. A ausência de valor coletivo coloca em xeque uma sociedade pretensamente democrática. Silveira e Moraes são meros agentes dessa história. Apenas mais uma crônica em ampla coletânea de casos.

*DOUTOR EM CIÊNCIA POLÍTICA PELA USP E COORDENADOR DO BLOG LEGIS-ATIVO

Estadão
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