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Política

Joias árabes: advogado de Bolsonaro entrega segundo pacote de presentes à Caixa e armas à PF

Estojo dado pelo regime saudita e que vale, no mínimo, R$ 400 mil, foi entregue ao banco estatal, seguindo determinação do TCU. Fuzil e pistola recebidos dos Emirados Árabes foram levados à sede da PF

24 mar 2023 - 09h45
(atualizado às 13h17)
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BRASÍLIA - O advogado Paulo Amador da Cunha Bueno entregou nesta sexta-feira, 24, o segundo conjunto de joias que foi recebido ilegalmente pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. O estojo é composto por relógio com pulseira em couro, par de abotoaduras, caneta rosa gold, anel e um masbaha (uma espécie de rosário islâmico) rose gold, todos da marca suíça Chopard. O site da loja vende peças similares que somam, no mínimo, R$ 400 mil.

Bueno levou o conjunto para uma agência da Caixa, localizado na Asa Sul, região central de Brasília, seguindo determinação do Tribunal de Contas da União (TCU). A caixa de joias entrou no país com a comitiva do governo Bolsonaro em outubro de 2021, sem ser declarada à Receita Federal.

A defesa de Bolsonaro também entregou um fuzil e uma pistola presenteados pelos Emirados Árabes. Os itens foram dados ao presidente em 2019, quando Bolsonaro voltou do Oriente Médio, em um avião da Força Aérea Brasileira. As armas chegaram à PF nas mãos do segundo-tenente Osmar Crivelatti, que foi assessor de Bolsonaro durante seu governo. O advogado Paulo Amador da Cunha Bueno também estava presente no ato da entrega.

Como revelou o Estadão, o presidente Jair Bolsonaro recebeu pessoalmente o segundo pacote de joias da Arábia Saudita que chegou ao Brasil pelas mãos da comitiva do então ministro de Minas e Energia (MME), Bento Albuquerque.

Ao Estadão, o tenente-coronel do Exército Mauro Cid, ajudante de ordens e "faz-tudo" do ex-presidente, disse que o estojo estava com Bolsonaro, no "acervo privado" dele. A entrada das peças no Brasil sem declarar à Receita e a apropriação pelo presidente estão irregulares. O entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU) é que os ex-presidentes só podem ficar com lembranças de "caráter personalíssimo", como roupas e perfumes.

O Estadão teve acesso a documentos oficiais que comprovam que o pacote foi entregue no Palácio da Alvorada, residência oficial dos presidentes da República. O recibo indicando que Bolsonaro recebeu as joias de diamantes foi assinado pelo funcionário Rodrigo Carlos do Santos às 15 horas e 50 minutos do dia 29 de novembro de 2022. O papel da Documentação Histórica do Palácio do Planalto traz um item no qual questiona se o item foi visualizado por Bolsonaro. A resposta: "sim".

Bolsonaro requisitou as joias apreendidas faltando apenas um mês para encerrar seu mandato e deixar o Brasil rumo aos Estados Unidos, onde se refugiou desde 30 de dezembro, quando perdeu a eleição para o seu rival Luiz Inácio Lula da Silva.

Antes, as joias ficaram por mais de um ano nos cofres do Ministério de Minas e Energia. Elas chegaram ao Brasil trazidas pelo então ministro Bento Albuquerque, em outubro de 2021. Mesmo tendo um dos presentes apreendidos pela Receita naquela ocasião, quando Albuquerque afirmou que se tratava de um presente para Michelle Bolsonaro, ele não avisou que já havia passado pela alfândega com o segundo pacote, o que, pela legislação, é crime.

O estojo apreendido, contendo um colar, um par de brincos, relógio e anel foi estimado em cerca de 3 milhões de euros (R$ 16,5 milhões). Os itens seriam leiloados pela Receita, mas o processo foi interrompido após a revelação do caso pelo Estadão.

Depois de deixar as armas na sede da PF, o advogado Paulo Amador da Cunha Bueno falou com a imprensa e procurou culpar a lei que trata de presentes presidenciais pelo fato de Bolsonaro ter ficado com uma das caixas e com as armas.

"O presidente não cometeu nenhum fato ilícito. Isso aí, ao longo do inquérito que está em curso e o processo no TCU, isso aí vai ficar bem explicado. É uma legislação confusa, tanto que, historicamente, dá problemas para vários presidentes, mas a situação é de total licitude para o presidente Bolsonaro", comentou.

Questionado se os itens poderiam ser classificados como bens pessoais, como defendeu oficialmente o advogado de Bolsonaro, Frederick Wassef, além de seu filho Flávio Bolsonaro, Bueno disse que, agora, está é uma "discussão confusa e complexa". "Essa definição veio de uma decisão do TCU, mas a lei não usa. Vamos esclarecer isso", disse.

As alegações do advogado não encontram respaldo no que foi decidido pelo TCU em 2016. Naquele ano, a corte de contas fez determinações claras sobre o que pode ou não ser incorporado como bem pessoal de um presidente, justamente para evitar posses indevidas. Ex-presidentes como Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva chegaram devolveram diversos presentes que receberam em anos anteriores, justamente por causa dessas regras.

O ministro do TCU Walton Alencar, que foi o relator do processo que definiu as regras sobre o assunto, ainda em 2016, foi claro em suas colocações ao se referir às joias da Arábia Saudita enviadas a Bolsonaro e à primeira dama Michelle Bolsonaro.

"Não há dúvida de que se trata de presente oficial, protocolar, destinado ao governo brasileiro, ou seja, por de trás da primeira-dama ou do presidente da República, está o Estado brasileiro, o governo brasileiro", comentou o ministro. "Essas joias, a exemplo de todos os demais presentes, têm de ser entregues à Presidência da República, lá catalogadas e essas joias devem integrar o patrimônio público brasileiro, sob a guarda da Presidência da República."

O presidente do TCU, Bruno Dantas, destacou o entendimento básico sobre o que é um presente de caráter pessoal. Trata-se de atender a dois requisitos: ser um item considerado personalíssimo e de baixo valor monetário, como uma camisa de clube, uma garrafa de bebida típica, um perfume ou um lenço. "Estes são itens que preenchem esses requisitos para o acervo particular de um presidente. Se não preenche esses dois itens, devem ir para o acervo da presidência e isso está definido no acordão de 2016?, disse.

Estadão
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