Grupo ligado a Pizzolato prepara dossiê que promete inocentá-lo
Condenado a 12 anos e sete meses de prisão, ex-diretor do Banco do Brasil fugiu para a Itália
Desde que recebeu a notícia de que estava entre os réus do processo do mensalão, o ex-diretor do marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato trocou a rotina de compromissos do banco em que trabalhava desde a década de 1980 pela análise do processo que o levou a ser condenado a 12 anos e sete meses de prisão por desvio de recursos públicos para o pagamento de propinas.
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No último ano, conta Alexandre Teixeira, parte do grupo de amigos que se empenha em criar um dossiê resumindo o que veem como erros do processo e do posterior julgamento, tudo o que Pizzolato fazia era ir à missa e compartilhar o material que o grupo postava no site www.megacidadania.com.br, criado em setembro de 2012 especialmente para divulgar o material.
Teixeira diz que se empenha com outros amigos de Pizzolato para sistematizar e deixar em um tamanho razoável as cerca de 2 mil páginas que selecionaram do processo original, capazes, segundo ele, de provar a inocência do ex-diretor e mesmo desmontar o processo do mensalão. “Descobrimos verdadeiras aberrações no processo, erros no julgamento. O dossiê tem capacidade de quebrar o supremo”, afirma Teixeira.
Ex-funcionário do BB e ex-dirigente sindical , ele trabalha no dossiê ao lado do jornalista e blogueiro Miguel do Rosário e de outros amigos de Pizzolato, que se reuniam com frequência em sua casa, em Copacabana. Foi de lá que organizaram o Ato pela Anulação do Mensalão, que levou cerca de 1 mil pessoas a sede da Associação Brasileira de Imprensa em janeiro. A partida para a Itália, diz Teixeira, foi uma decisão pessoal de Pizzolato, confirmada apenas a amigos próximos e tomada quando viu que não haveria mais como provar sua inocência no Brasil. “Ninguém falava em fuga. Quando caíram os embargos que caiu a ficha dele”, conta.
Mais do que o próprio Pizzolato, quem mais lutou para que a sentença fosse revertida foi a sua mulher, a arquiteta Andréa Eunice Haas. Teixeira diz que ela era a que mais tinha esperança de que a Justiça funcionasse. “Se tem uma pessoa que conhece vírgula por vírgula do processo é a Andrea. Sabe o que cada ministro falou do julgamento de cada réu. Ela dizia, “no recurso vão rever, é impossível que não revejam."
Ele confirma que Pizzolato foi de carro até o Paraguai, percorrendo a pé os cerca de 10 quilômetros que o separavam da fronteira para evitar prejudicar os amigos que o ajudaram, e, acrescenta, não foi usada documentação falsa. “Ele é cidadão italiano, como cidadão italiano tem direito a uma identidade italiana. O tribunal pediu apenas o passaporte, ele entrou com a identidade.”
A estratégia de Pizzolato, que já está na lista de foragidos da Interpol e viajou com uma versão macro do dossiê para a Itália, é esperar a movimentação da Justiça Brasileira para pedir que o processo seja julgado novamente na Europa. “Todo o mensalão está alicerçado na figura do Pizzolato. Na medida que se afirma que ele não desviou R$ 70 milhões de próprio punho, que não foi ele que assinou, que não houve desvio, como fica a lógica do mensalão?”, indigna-se Teixeira.
Segundo ele, que espera que a versão completa do dossiê esteja pronta para divulgação em duas semanas, o amigo guarda um ressentimento do Brasil e das instituições, entre elas o PT, que espera que o defendessem. “Ninguém se posicionou para dar uma opinião definitiva sobre os documentos, os documentos provam que ele não desviou nada. Nós só queremos que a Justiça seja feita.”
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio responderam ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado doPP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles responderam por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro. A então presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) respondeu processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia incluía ainda parlamentares do PP, PR(ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson. Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e o irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.
No dia 17 de dezembro de 2012, após mais de quatro meses de trabalho, os ministros do STF encerraram o julgamento do mensalão. Dos 37 réus, 25 foram condenados, entre eles Marcos Valério (40 anos e 2 meses), José Dirceu (10 anos e 10 meses), José Genoino (6 anos e 11 meses) e Delúbio Soares (8 anos e 11 meses).
Após a Suprema Corte publicar o acórdão do processo, em 2013, os advogados entraram com os recursos. Os primeiros a serem analisados foram os embargos de declaração, que têm como função questionar contradições e obscuridades no acórdão, sem entrar no mérito das condenações. Em seguida, o STF decidiu, por seis votos a cinco, que as defesas também poderiam apresentar os embargos infringentes, que possibilitariam um novo julgamento para réus que foram condenados por um placar dividido – esses recursos devem ser julgados em 2014.
Em 15 de novembro de 2013, o ministro Joaquim Barbosa decretou as primeiras 12 prisões de condenados, após decisão dos ministros de executar apenas as sentenças dos crimes que não foram objeto de embargos infringentes. Os réus nesta situação eram: José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares, Marcos Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz, Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Henrique Pizzolato, Simone Vasconcelos, Romeu Queiroz e Jacinto Lamas. Todos eles se apresentaram à Polícia Federal, menos Pizzolato, que fugiu para a Itália.