Justiça nega trancar ação contra Alckmin por repasses da Odebrecht
A defesa de Alckmin afirmou que os fundamentos da ação civil pública "já foram objeto de várias decisões judiciais, e nunca prosperaram"
Documentos de uma transportadora, o livro de hóspedes de um hotel em Moema, na zona sul da capital paulista, e o depoimento de três ex-funcionários da Odebrecht deram sobrevida a uma ação de improbidade administrativa que atinge o vice-presidente da República e ministro Geraldo Alckmin (PSB). A Justiça de São Paulo citou esse material ao negar trancar um processo sobre supostos repasses - não declarados à Justiça Eleitoral - para Alckmin à época em que ele era governador, em 2014.
A defesa de Alckmin afirmou que os fundamentos da ação civil pública "já foram objeto de várias decisões judiciais, incluindo do Supremo Tribunal Federal, e nunca prosperaram". Para os advogados do vice-presidente e atual ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, todas as supostas provas do processo "foram obtidas de forma ilícita e já declaradas imprestáveis pelo Supremo Tribunal Federal" (mais informações nesta página).
O pedido para interromper a ação de improbidade - ajuizada em 2018 pelo Ministério Público de São Paulo - teve como suporte a decisão do ministro Dias Toffoli, do STF, que, em setembro do ano passado, determinou a anulação de todas as provas que embasaram o acordo de leniência da Odebrecht (atual Novonor) - alvo da Lava Jato - assinado em 2016.
Toffoli classificou como imprestáveis as provas obtidas a partir do acesso aos sistemas Drousys e My Web Day B, que eram utilizados pelo Setor de Operações Estruturadas - o "departamento de propinas" da companhia. Conforme delações de ex-executivos da empreiteira, o setor armazenava recursos desviados de obras com o poder público, que eram distribuídos a políticos.
Ex-secretário
A decisão que mantém a ação de improbidade foi publicada no último dia 25, após análise de um pedido do ex-secretário Marcos Antonio Monteiro, que comandou a pasta de Desenvolvimento Econômico no governo Alckmin em São Paulo. Monteiro requereu que a 13.ª Vara da Fazenda Pública da Capital decidisse sobre a viabilidade da continuidade da ação, considerando a decisão de Toffoli.
"Entendo que não estão presentes, desde logo, circunstâncias que permitam afastar a suposta prática de atos de improbidade administrativa, devendo-se dar prosseguimento ao processo, sob pena de se negar acesso à Justiça. Vale ressaltar que, em se tratando de ação civil pública, basta a existência, em tese, de ato danoso e, assim, como na área criminal, aplica-se o princípio in dúbio pro societate", registrou o despacho judicial. Cabe recurso da decisão.
'Independentes'
A avaliação da Justiça foi a de que, mesmo com a anulação das provas coletadas da contabilidade paralela da Odebrecht, "subsistem outras provas independentes que amparam a continuidade da marcha processual".
Na ação de improbidade, o Ministério Público de São Paulo destacou planilhas em que constam supostos repasses a Monteiro e a Alckmin. Os delatores da Odebrecht apresentaram registros que apontavam pagamentos de R$ 8,3 milhões para o codinome "M&M" - uma referência de Marcos Monteiro, que teria sido o interlocutor de Alckmin para os repasses não declarados à campanha eleitoral de 2014.
Doleiro
O juízo da 13.ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo menciona documentos apresentados ao Ministério Público por Rogério Martins, apontado como a pessoa contratada para entregar propinas pelo doleiro Álvaro José Galliez Novis. Para a Justiça, os documentos indicam que Martins se hospedava em hotel de São Paulo, onde recebia dinheiro em espécie para pagar propinas, conforme senhas recebidas da Odebrecht. A retirada dos valores ocorria, segundo os autos, no quarto do hotel.
"As provas obtidas pelo inquérito civil demonstram que as quantias recebidas nas datas de 7 de agosto de 2014 e 11 de setembro de 2014 foram efetivamente pagas por Rogério Martins a portador indicado pelo requerido Marcos Antonio Monteiro, em benefício do corréu Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho, nas dependências do hotel Mercure Privilege, em Moema, conforme se depreende da análise da relação de hóspedes que se registraram nos respectivos dias", diz o despacho que nega trancar a ação de improbidade.
"O réu Marcos Antonio Monteiro, no exercício de função pública e em benefício de Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho, auferiu vantagem indevida, recebendo dinheiro da Construtora Norberto Odebrecht S/A", afirma o despacho, destacando que delatores "reconheceram que (os repasses) tinham relação com obras mantidas com o governo de São Paulo, o que, ao menos em tese, caracteriza ato de improbidade administrativa". No entendimento da Justiça, as provas do inquérito civil "são imunes de contaminação, uma vez que não têm relação com o acordo de delação premiada".
'As supostas provas foram obtidas de forma ilícita', afirma defesa
"A defesa do vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB), representada pelos advogados José Eduardo Alckmin, Fábio de Oliveira Machado e Marcelo Martins de Oliveira, afirmou que "os fundamentos da ação civil pública já foram objeto de várias decisões judiciais, incluindo do Supremo Tribunal Federal (STF), e nunca prosperaram".
"A defesa entende que todos os supostos elementos probatórios contidos nesta ação judicial foram obtidos de forma ilícita e já declarados imprestáveis pelo Supremo Tribunal Federal", disseram os defensores do ex-governador de São Paulo. "Quanto ao vice-presidente Geraldo Alckmin, não há nenhum fato que subsista, e confiamos que, em breve, esse processo judicial será extinto", declarou a defesa.
Ainda cabe recurso da decisão da 13.ª Vara da Fazenda Pública da Capital.
A defesa do ex-secretário Marcos Monteiro já afirmou que "os fatos narrados não correspondem à realidade e serão esclarecidos no momento oportuno" e ressaltou a "confiança nas decisões do Poder Judiciário".
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.