Conselho do Ministério Público pune Deltan com advertência
Sanção é a mais leve na escala de punições do órgão, mas a primeira na carreira do coordenador da força-tarefa da Lava Jato
O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) decidiu nesta terça-feira (26/12) aplicar uma pena de advertência ao procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato no Paraná.
O processo administrativo disciplinar (PAD) contra Deltan envolveu suspeita de "manifestação pública indevida". O caso foi aberto em 2018, após o procurador conceder uma entrevista de rádio na qual acusou ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) de "leniência" com a corrupção. O encaminhamento foi feito pelo próprio presidente do tribunal, Dias Toffoli.
A decisão pela advertência foi definida por oito votos a três. Mesmo antes do julgamento, a expectativa entre os conselheiros do CNMP de que Deltan só seria punido com uma simples advertência, e não com uma censura, suspensão do cargo ou afastamento definitivo.
Na prática, a advertência se resume a uma crítica pública ao procurador, a punição mais leve prevista entre as sanções que podem ser impostas pelo CNMP. Ainda assim, trata-se da primeira punição disciplinar da carreira de Deltan.
O relator do caso no conselho, Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho, foi o primeiro a votar pela advertência. Em seu voto, ele disse que Deltan atacou a honra dos membros do STF com um discurso "contundente e hostil" e que a fala foi marcada pela "ausência de zelo pelo prestígio de suas funções, falta de decoro e urbanidade".
Já o advogado de Deltan Dallagnol, Francisco Rezek, tentou minimizar a fala do coordenador da força-tarefa como uma "infelicidade", mas que se enquadrava dentro dos limites do direito à liberdade de expressão. "Não se vê aí mais que um excesso de zelo, levando a uma linguagem imprópria", disse Rezek.
O mesmo caso também chegou a provocar a abertura de uma investigação pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF), mas o procedimento acabou sendo arquivado, sob o entendimento que a fala do procurador não havia extrapolado o direito de liberdade de expressão.
Durante a entrevista, em 2018, Deltan não mencionou especificamente nenhum ministro do STF, mas disse que um grupo deles havia formado uma "panelinha" que mandava "uma mensagem muito forte de leniência a favor da corrupção" ao determinar a soltura de presos da Lava Jato e a redistribuição de processos.
"Eu não estou dizendo que estão mal-intencionados nem nada, estou dizendo que objetivamente a mensagem que as decisões mandam é de leniência. E esses três de novo olham e querem mandar para a Justiça Eleitoral como se não tivesse indicativo de crime? Isso para mim é descabido", disse Deltan, na mesma entrevista.
Após o anúncio da sanção imposta pelo CNMP, Deltan publicou uma mensagem em suas redes sociais.
"A advertência aplicada a mim pelo CNMP hoje por ter criticado decisões de ministros do Supremo, exercendo o direito à liberdade de expressão e crítica, não reflete o apreço que tenho pelas Instituições. Minha manifestação decorre de um sistema de justiça que não funciona, em regra, contra poderosos, e é na omissão e no silêncio que a injustiça se fortalece. O debate dos problemas de nosso sistema é essencial. Continuarei trabalhando para fazer a minha parte em reduzir a corrupção e a impunidade. Agradeço por todas as mensagens de apoio que estou recebendo. Significam muito pra mim."
Ainda no CNPM, Deltan é alvo de três outros pedidos de procedimentos disciplinares. Um deles envolve uma representação movida pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), com base em mensagens publicadas pelo procurador contra a eleição do político alagoano para a Presidência do Senado. Outro envolve uma representação movida pela senadora Kátia Abreu (PDT-TO), pedindo a remoção de Deltan da força-tarefa "por interesse público". O terceiro caso envolve um pedido do ex-presidente Lula por causa da notória apresentação da denúncia contra o petista que envolveu Powerpoint.
Já a análise do caso envolvendo as críticas ao STF foi marcada por um vai e vem de decisões judiciais para adiar o procedimento. Em agosto, um juiz federal do Paraná que já atuou na Lava Jato determinou o adiamento da análise do processo administrativo, após atender a um pedido da defesa de Deltan.
Em 11 de novembro, foi a vez de o ministro Luiz Fux, do STF, determinar que o CNMP não deveria julgar o procedimento. No entanto, uma semana depois, Fux reverteu a decisão e liberou o julgamento. Depois foi a vez de a juíza substituta Giovanna Mayer, da 5ª Vara Federal de Curitiba, determinar mais uma suspensão. Fux acabou derrubando a decisão da juíza em 22/11, permitindo que o julgamento no CNMP marcado para esta terça-feira finalmente pudesse ocorrer.