No comando da Câmara, Cunha foi a pior pedra no sapato de Dilma; entenda
A partir de 2013, o governo Dilma Rousseff sofreu uma série de reveses que levaram a presidente, antes com a popularidade nas alturas, a obter uma vitória apertada na disputa pela reeleição e, neste ano à pior crise no Planalto desde o governo Fernando Collor.
Embora sejam vários os fatores que colocaram a petista em um processo de impeachment – a crise econômica e a falta de apoio parlamentar, segundo analistas, são os principais deles –, a oposição ferrenha feita pelo deputado Eduardo Cunha, parlamentar de um partido até então aliado ao governo (PMDB), teve imenso peso.
Antes mesmo de assumir a presidência da Câmara, em fevereiro de 2015, ele já era visto como um aliado, digamos, não tão aliado assim. O histórico, amplamente divulgado pela imprensa, não mente: o deputado foi o pivô das piores insurgências da base aliada.
Alçado à liderança, Cunha se tornou um dos políticos mais poderosos do País em seu terceiro mandato como deputado federal. E, diante de seu notório conhecimento do regulamento interno da Câmara, imprimiu um ritmo poucas vezes visto de votação, ao mesmo tempo em que fez uso de todo o seu poder de escolher o que colocar na pauta.
Embora tenha colhido algumas derrotas que o levaram a lançar mão de manobras polêmicas – como as que recolocaram em discussão, após serem rejeitadas, propostas como a redução da maioridade penal e o financiamento empresarial de campanhas, uma de suas principais bandeiras –, o peemedebista inflingiu uma série de duros golpes contra o governo Dilma em seu momento mais frágil.
Enquanto isso, porém, avançavam as investigações da Operação Lava Jato, que culminaram agora com adecisão do Supremo Tribunal Federal de suspendê-lo do comando da Casa e do mandato de deputado federal em uma única tacada.
Antes, porém, os procedimentos precipitaram seu rompimento oficial com a gestão federal, acusada desde sempre pelo deputado de agir contra ele no caso. E justificaram a expectativa de que Cunha colocaria em tramitação um pedido de impeachment de Dilma, prerrogativa dele como presidente da Câmara.
Essa crise, porém, não nasceu em 2015. Seu início, ao menos público, remonta, não coincidentemente, a 2013, ano em que tudo começou a dar errado para Dilma. E indica que, mesmo fora do comando da Câmara, Cunha ainda pode dar muita dor de cabeça à presidente.
Relembre os principais momentos:
Insurgência e concessões
Líder do PMDB na Câmara, Cunha foi o principal opositor, em 2013, à medida provisória que redefiniu as regras para o setor portuário. Acusado de atender a interesses empresariais, ele queria mudanças no texto, como permitir a renovação de concessões em portos públicos assinadas após 1993.
O tema consumiu longas e tensas sessões no Congresso. Para aprovar a MP, o governo teve, em parte, de ceder às reivindicações da rebelião na base aliada liderada pelo deputado.
O caso, porém, não parou aí: Dilma vetou alguns dos pontos incluídos na Câmara, provocando a fúria de Cunha. Ele saiu do episódio criticando duramente a articulação do governo na casa.
Motim na base
Após a barulhenta experiência ocorrida na MP dos Portos, Cunha organizou em pleno 2014, ano de disputa presidencial, um bloco com parlamentares de partidos aliados e da oposição que passou a atuar contra propostas defendidas pelo Planalto.
Para aprovar algumas delas, o governo teve de fazer concessões tanto nos textos em si como ao liberar verbas para emendas dos congressistas no Orçamento.
Não foram poucos os bate-bocas, pela imprensa, entre Cunha e petistas. O deputado chegou a defender publicamente que o PMDB rompesse com o partido da presidente.
A corrida pela Câmara
Devido ao protagonismo alcançado nos anos anteriores, era claro entre os deputados o favoritismo de Cunha para assumir a presidência da Câmara em 2015 – também contou o fato de ele ser visto como um defensor de iniciativas pró-parlamentares.
Sentindo as dores de cabeça que vinham por aí, o governo partiu para uma arriscada tentativa de evitar sua vitória. Surgiram relatos de que ministros usaram a negociação de cargos para pressionar deputados aliados a votarem no petista Arlindo Chinaglia (PT-SP) para mesma cadeira.
Além de piorar ainda mais a relação entre governo e Cunha, a estratégia não deu certo: o peemedebista foi escolhido com folga.
Com o poder nas mãos
Não foram poucas as derrotas sofridas pelo governo na Câmara sob o comando de Cunha. O peemedebista levou ao plenário, por exemplo, a PEC da Bengala, na gaveta desde 2005, que permite à cúpula do Judiciário se aposentar aos 75 anos, e não aos 70.
Aprovado, o texto retirou de Dilma a certeza de que indicaria ao menos mais cinco ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) durante seu segundo mandato.
E vieram mais derrotas. Contra o governo, Cunha conseguiu a aprovação, por exemplo, de uma proposta de redução da maioridade penal, por exemplo.
Enquanto as investigações da Operação Lava Jato o implicavam cada vez mais, ele rompeu oficialmente com o governo, em julho. No início do mês, autoridades da Suíça afirmaram ter bloqueado US$ 5 milhões em contas do deputado e seus familiares no país, alimentando mais pedidos por sua saída.
Porém, Cunha manteve até o fim seu controle sobre a Câmara, além de manter o suspense ao analisar, um a um, os pedidos de impeachment contra a presidente.