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Política

Miliciano foi infiltrado no PSOL e monitorava passos de Marielle, aponta PF

Segundo PF, quem mandou matar Marielle foram os irmãos Brazão; eles teriam infiltrado um miliciano no partido da vereadora

24 mar 2024 - 18h44
(atualizado em 26/3/2024 às 08h54)
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Foto: Reprodução

O miliciano Laerte Silva de Lima teria sido infiltrado no PSOL, partido de Marielle Franco, e passou a monitorar os passos da vereadora, segundo aponta a Polícia Federal no inquérito que investigou o assassinato dela e de Anderson Gomes

Segundo as investigações, cujo inquérito foi divulgado neste domingo, 24, os mandantes do crime foram os irmãos Brazão: o deputado federal Chiquinho Brazão, e o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro Domingos Brazão. O que motivou o crime foi a atuação política de Marielle, que atrapalhava o interesse dos irmãos. 

Em sua delação premiada, o ex-policial militar Ronnie Lessa afirmou que durante a primeira reunião com os irmãos Brazão, em setembro de 2017, ocasião em que foi acertada a execução de Marielle, Domingos indicou que havia alocado um infiltrado chamado Laerte nas fileiras do PSOL para levantar informações internas do partido e monitorar os passos da vereadora. 

Segundo Lessa, Domingos relatou a ele que Laerte o alertou que Marielle, em algumas reuniões comunitárias, pediu para a população não aderir a novos loteamentos situados em áreas de milícia. 

No inquérito, a PF ainda apontou que Laerte e sua esposa teriam se filiado ao PSOL vinte dias depois do segundo turno das eleições de 2016, ano em que Marielle foi eleita. As suspeitas, à época, foram de que a intenção era espionar os políticos do partido.

Laerte foi preso no âmbito da Operação Intocáveis com outros suspeitos de integrarem um grupo militar responsável pela exploração de serviços na região de Rio das Pedras, no Rio. Eles foram condenados por participarem de uma organização criminosa considerada entre as mais poderosas da região da Zona Oeste do Rio de Janeiro.

No inquérito, a Polícia Federal aponta que o miliciano teria sido infiltrado antes do interesse na morte de Marielle.  

“Traçou-se um paralelo sobre levantamentos de outros políticos do PSOL solicitados por Macalé [ sargento reformado da PM que teria intermediado a contratação do ex-PM Ronnie Lessa] antes do segundo semestre de 2017, atribuindo o interesse por tais consultas ao desdobramento de conversas que este mantinha com os Brazão, possivelmente acerca de represálias. Contudo, à época, nada seguiu ou evoluiu para além das pesquisas”, afirmou a PF.

Lessa também afirmou que após a infiltração, Domingos começou a ser mais específico sobre os obstáculos que a vereadora poderia representar, fazendo referências a reuniões em que ela teria mantido com lideranças comunitárias da região das Vargens, na Zona Oeste, sobre questões relativas a loteamentos de milícia.

“Então, mencionou-se que, por conta de alguma animosidade, haveria um interesse especial da vereadora em efetuar este combate nas áreas de influência dos Brazão, dado que seria oriundo das ações de infiltração de Laerte. Nesse momento, ponderou- se a possibilidade de que este poderia ter sobrevalorizado ou, até mesmo, inventado informações para prestar contas de sua atuação como infiltrado”, destacaram os investigadores no documento.  

Na delação de Lessa, o ex-PM afirmou que acreditava que Laerte poderia “ter enfeitado o pavão”, levando os irmãos a uma ideia equivocada das ações políticas de Marielle no assunto.

“Deste modo, os elementos apresentados pelo discurso do colaborador podem ser sintetizados em duas questões primordiais: a suposta animosidade dos Brazão com integrantes do PSOL, apontada por conta de levantamentos de políticos da legenda que teriam sido solicitados por Macalé, no interesse dos Irmãos, e a atuação de Marielle Franco junto a moradores de comunidades dominadas por milícias, notadamente no tocante à exploração da terra e aos loteamentos ilegais”, disse a PF.

Prisão de irmãos Brazão e de ex-chefe da PC-RJ

Os irmãos Brazão foram presos preventivamente na manhã deste domingo -- junto a Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, acusado de ter desviado o foco das investigações dos verdadeiros mandantes do assassinato. Ele assumiu o posto de chefia um dia antes do crime, que aconteceu há seis anos, no dia 14 de março de 2018.

Os três foram levados à Superintendência da Polícia Federal no Rio, onde passaram por audiência de custódia. A previsão é de que, ainda hoje, eles sejam transferidos para o presídio federal do Distrito Federal.

Foto: Montagem com imagens de reprodução/X/Agência Brasil

Por que Mariele foi morta?

De acordo com decisão do ministro Alexandre de Moraes em torno da operação deflagrada pela PF, à qual o Terra teve acesso e não está mais sob sigilo, o planejamento da execução teria começado no segundo semestre de 2017, após uma "descontrolada reação" de Chiquinho Brazão devido à participação de Marielle na votação do Projeto de Lei Complementar 174/2016. A proposta, de autoria de Chiquinho quando ainda era vereador, dispunha sobre a regulamentação fundiária de loteamentos e grupamentos existentes nos bairros de Vargem Grande, Vargem Pequena e Itanhangá, assim como nos bairros da XVI RA – Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. 

"No mesmo sentido, apontam diversos indícios do envolvimento dos BRAZÃO, em especial de DOMINGOS, com atividades criminosas, incluindo-se nesse diapasão as relacionadas com milícias e ‘grilagem’ de terras, e, por fim, ficou delineada a divergência no campo político sobre questões de regularização fundiária e defesa do direito à moradia", complementa Alexandre de Moraes

No relatório final do inquérito, que possui 479 páginas, é descrito que a presença de Marielle junto a comunidades em Jacarepaguá era o que mais atrapalhava os interesses dos irmãos. Isso porque na região, que em sua maioria é dominada por milícias, se concentrava relevante parcela da base eleitoral da família Brazão.

O inquérito da Polícia Federal foi instaurado em 21 de julho de 2023, cinco anos após o crime que tirou a vida de Marielle Franco e de Anderson Gomes, motorista que foi executado junto com a vereadora. 

Em coletiva de imprensa ao lado do diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, citou terem se passados "cinco anos de investigações infrutíferas" pela Polícia Civil do Rio de Janeiro. Mas que os resultados da operação da Polícia Federal em torno do caso, iniciadas após o presidente Lula tomar posse, são o "triunfo do povo brasileiro contra a criminalidade avançada".

Para Lewandowski, as investigações também revelam o modus operandi das milícias do Rio de Janeiro, "que é bastante sofisticado". A partir disso, com os documentos e informações que serão obtidos por meio dos 12 mandados de busca e apreensão domiciliar e pessoas que também foram expedidos, a expectativa é que outros casos também sejam desvendados. 

Qual o papel de Rivaldo Barbosa?

Ao passo que os irmãos Brazão idealizaram o crime, a execução foi "mericulosamente planejada" por Rivaldo, como escreve Alexandre de Moraes em sua decisão. 

"E aqui se justifica a qualificação de RIVALDO como autor do delito, uma vez que, apesar de não ter o idealizado, ele foi o responsável por ter o controle do domínio final do fato , ao ter total ingerência sobre as mazelas inerentes à marcha da execução, sobretudo, com a imposição de condições e exigências" -- Alexandre de Moraes, ministro do STF.

Rivaldo Barbosa era chefe da Delegacia de Homicídios até que, uma semana antes do crime, foi promovido para ocupar a chefia da Polícia Civil do Rio. Ele assumiu o posto um dia antes do assassinato de Marielle. 

De acordo com a Polícia Federal, 12 horas após a consumação dos homicídios, Rivaldo nomeou o delegado Giniton Lages, pessoa de sua confiança, para o cargo de Delegado Titular da Delegacia de Homicídios da Capital -- o reponsável pela apuração do crime. Isso operacionalizou a "garantia da impunidade dos autores do delito", segundo concluiu a PF.

Seu envolvimento na trama do do assassinato chocou familiares de Marielle e outras pessoas próximas da vereadora. Isso porque, como publicou o político Marcelo Freixo em seu perfil do X, antigo Twitter, foi o policial que acolheu os familiares das vítimas após o crime.

"Foi para Rivaldo Barbosa que liguei quando soube do assassinato da Marielle e do Anderson e me dirigia ao local do crime. Ele era chefe da Polícia Civil e recebeu as famílias no dia seguinte junto comigo. Agora Rivaldo está preso por ter atuado para proteger os mandantes do crime, impedindo que as investigações avançassem. Isso diz muito sobre o Rio de Janeiro", desabafou Freixo. 

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*Com colaboração de Guilherme Mazieiro

Fonte: Redação Terra
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