Ministros de Lula usam agendas oficiais para se autoelogiar: de parabéns à 'trend do piloto'
Chefes dos ministérios colocam o foco nas suas qualidades pessoais nas redes sociais e deixam de lado ações governamentais; especialistas afirmam que estratégia é para construção das próprias imagens com o eleitorado
BRASÍLIA - Ministros do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) têm utilizado agendas oficiais para postar autoelogios em redes sociais. As publicações, realizadas a partir de compromissos relacionados às pastas, ressaltam as habilidades atléticas do ministro do Esporte, André Fufuca, o aniversário do ministro das Comunicações, Juscelino Filho, e as qualidades pessoais do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, enquanto os temas governamentais ficam em segundo plano.
De acordo com especialistas ouvidos pelo Estadão, as publicações buscam construir a imagem dos políticos por meio de vídeos virais, com foco no entretenimento, em detrimento de informações sobre feitos do Executivo.
Juscelino diz que é 'privilégio' ter agenda ministerial no seu aniversário
No último dia 6, quando completou 39 anos, Juscelino Filho postou um vídeo no seu perfil no Instagram informando que estava a caminho do lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), no Maranhão. O ministro destacou a importância pessoal da data e afirmou que participar da agenda no seu aniversário era um "privilégio".
"Pessoal, um dia especial. No dia do meu aniversário, estou tendo um privilégio, uma agenda intensa de trabalho lançando o novo PAC, investimentos do governo federal, do presidente Lula, no meu querido Estado do Maranhão", afirmou.
O Estadão entrou em contato com os ministérios do Esporte, de Minas e Energia e de Comunicações, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
Ministros usam rede social para construir imagem pessoal
Especialistas ouvidos pelo Estadão observam que as publicações têm o intuito de construir uma imagem de "pessoa comum" para os ministros de Estado com o foco no próprio legado, e não nas realizações das pastas. De olho no potencial das redes sociais, os políticos tentam se aproximar dos eleitores com conteúdos de entretenimento, mas, muitas vezes, pecam na estratégia.
Para Patrícia Rossini, professora em Comunicação, Mídia e Democracia na Universidade de Glasgow, a rede social escolhida para essa finalidade é o Instagram, ambiente no qual os usuários não têm tanto o hábito de consultar notícias e informações sobre resultados governamentais.
"São oportunidades que costumamos chamar de 'personalização da política'. A pessoa tenta se tornar mais próxima, mais palatável, mais identificável pelo eleitor, em vez de ser vista apenas como aquela pessoa distante e que não é 'gente como a gente'. Ou seja, aquilo que a gente sempre teve nas campanhas eleitorais do político ir à feira e comer um pastel ou um pão de queijo, agora ocorre 24 horas por dia e sete dias por semana", explicou.
De acordo com Maria Carolina Lopes, cientista política, especialista em Democracia e Comunicação Digital, ao utilizar tendências das redes sociais os ministros buscam ter mais visibilidade, com publicações que "surfam" nos assuntos consumidos pelos internautas.
"Na Grécia antiga, política era retórica e mídia era teatro. Em algum momento, os políticos tiveram que adaptar seus discursos enormes para se encaixar no tempo da televisão, aprender a soltar frases feitas, chamar a atenção dos repórteres de redação e ensaiar aspas voltadas para as manchetes dos jornais. Quando o smartphone se popularizou e, junto, as redes sociais, eles entenderam que precisavam gerar cliques para os portais. Em seguida, likes, comentários e compartilhamentos", disse.
Apesar das adaptações registradas, o consultor de marketing político Marcelo Victorino aponta que ainda há o problema de os políticos entenderem como se usa a comunicação nas redes sociais de forma profissional. "O que acaba fazendo com que não invistam em profissionais com conhecimento aprofundado no uso da comunicação."
"Muitos desperdiçam o potencial das redes sociais, de gerar conexões emocionais, e acabam, muitas vezes, até virando motivo de chacota nos grupos de eleitores", afirmou o consultor.