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Política

Moro critica Aras e "tentativa de revisionismo" da Lava Jato

4 jul 2020 - 07h22
(atualizado às 08h59)
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Augusto Aras ao lado de Sergio Moro na solenidade de posse do novo Procurador Geral da República (PGR)
Augusto Aras ao lado de Sergio Moro na solenidade de posse do novo Procurador Geral da República (PGR)
Foto: Fátima Meira / Futura Press

Ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro criticou ontem manifestações do procurador-geral da República, Augusto Aras, que questiona a necessidade de haver forças-tarefa dedicadas a investigações específicas. Moro, ex-juiz federal em Curitiba, defendeu a "autonomia funcional" das forças-tarefa e atacou o que classificou como tentativa de "revisionismo" da Operação Lava Jato.

"Elas (forças-tarefa) são uma criação brasileira absolutamente necessária para se ter uma equipe de procuradores e policiais dedicados a investigar esses crimes mais complexos", afirmou o ex-ministro em entrevista à colunista Eliane Cantanhêde e ao repórter Fausto Macedo no portal estadão.com.br. "Não entendo essa lógica do revisionismo, como se a Lava Jato não representou algo extremamente positivo, que foi uma grande vitória contra a impunidade da grande corrupção. Quem ataca a Lava Jato hoje eu sinceramente não entendo bem onde quer chegar."

Nos últimos dias, procuradores federais e a cúpula da PGR entraram em choque após Aras determinar diligência para o compartilhamento de dados da Lava Jato no Paraná, em São Paulo e no Rio. O procurador-geral da República propôs a criação da Unidade Nacional Anticorrupção (Unac) no Ministério Público Federal (MPF), o que centralizaria em Brasília o controle de operações e prevê que as bases de dados das forças-tarefa sejam administradas por uma secretaria ligada à PGR.

Caberá a Aras, em agosto, decidir se prorroga ou desfaz a força-tarefa da capital paranaense. A atual briga entre o comando da PGR e os grupos de trabalho resultou num pedido de investigação na corregedoria do órgão, depois que procuradores da Lava Jato no Paraná se rebelaram contra um pedido por acesso a dados sigilosos da operação, feito pela subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo.

Para Moro, falta apoio da cúpula da PGR ao trabalho dos procuradores. "Tenho respeito ao Augusto Aras, seria importante que ele refletisse um pouco mais, ele e também a cúpula da Procuradoria. Ele tem que se somar a esses esforços das forças-tarefa da Lava Jato e de demais forças que certamente terão que ser criadas", afirmou. O ex-ministro disse acreditar que o presidente Jair Bolsonaro errou ao escolher Aras para o comando do MPF, já que ele não integrava a lista tríplice elaborada pelos integrantes do Ministério Público no ano passado.

Leia os principais trechos da entrevista:

Lava Jato e Aras

Questionado sobre as críticas recentes à força-tarefa, o ex-juiz federal concordou que vê ataques às ideias e propostas essenciais ao funcionamento da Lava Jato e do que chamou de agenda anticorrupção. Para Moro, a operação foi um divisor de águas nas investigações contra a grande corrupção no País.

"Acho que a Operação Lava Jato não tem nada a esconder. Trabalhamos esses quatro anos, de 2014 a 2018, sob holofotes imensos da imprensa, da sociedade. Sofremos muitas críticas, críticas são normais, acho que muitas foram injustas. O mundo político não gostava muito da Operação Lava Jato em geral. Mas os procedimentos sempre foram normais. Não entendo essa lógica do revisionismo, como se a Lava Jato não representou algo extremamente positivo, que foi uma grande vitória contra a impunidade da grande corrupção. Quem ataca a Lava Jato hoje eu sinceramente não entendo bem onde quer chegar."

O ex-ministro também criticou a revisão da prisão em 2ª instância pelo Supremo Tribunal Federal e as alterações administrativas na lei anticrime, sua principal proposta à frente do Ministério da Justiça. Ambas, segundo ele, dificultam o combate à criminalidade no País e foram golpes para a operação. "E agora estamos vendo um discurso questionando até a própria existência de forças-tarefa no Ministério Público. Elas são uma criação brasileira absolutamente necessária para se ter uma equipe de procuradores e policiais dedicados a investigar esses crimes mais complexos, porque um investigador sozinho não tem condições de resolver. É surpreendente ver esses ataques", disse.

Moro afirmou ainda que há falta de apoio ao trabalho da força-tarefa por parte da Procuradoria-Geral da República e do chefe do Ministério Público Federal. "Essa falta de apoio (de Aras às equipes) é realmente preocupante", avaliou.

Eleições 2022

Moro voltou a negar que tenha pretensões de lançar candidatura para a disputa pela Presidência da República em 2022, classificando as especulações sobre um projeto eleitoral como uma "fantasia". Afirmou que vai se "inserir agora no mundo privado". "Eu estou fora desse jogo político", disse. Ele afirmou, porém, que, embora tenha deixado o serviço público, não saiu do debate público. "Eu não vou me abster de falar que nós devemos ser fiéis aos nossos princípios. E, entre os princípios essenciais para a nossa democracia estão o combate à corrupção e o Estado de Direito. Ambos são essencialmente importantes. Se eu sou um problema falando isso, paciência", afirmou.

Petistas e bolsonaristas

Com relação aos ataques de petistas - em razão da Lava Jato e da prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - e de bolsonaristas, que passaram a criticá-lo após sua saída do governo, o ex-ministro afirmou que não se vê como inimigo de nenhum grupo, à direita ou à esquerda. "Nunca senti satisfação pessoal em qualquer ato que imponha sofrimento a alguém, mesmo que a pessoa merecesse", afirmou, sobre sua atuação como juiz. Em seguida, emendou: "Da mesma maneira agora, com minha saída do governo. Eu só podia fazer aquilo. Eu vi uma interferência na polícia, fiquei na dúvida quanto ao que ia acontecer depois com a Polícia Federal e não me senti confortável para ficar".

Queiroz

Perguntado sobre a prisão do ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), Fabrício Queiroz, Moro preferiu não fazer comentários específicos sobre o caso. Moro também disse não ter tido, como membro do governo, nenhum papel nas investigações das 'rachadinhas'. "Eu, como ministro, não tinha como interferir diretamente ou utilizar a PF de alguma forma para obstaculizar aquelas investigações. Isso seria absolutamente impróprio, então eu posso assegurar que isso não aconteceu durante a minha gestão", afirmou.

Bolsonaro

Sobre as acusações que apresentou contra Bolsonaro, o ex-ministro voltou a dizer que "cumpriu o seu dever" e que agora o caso está nas mãos da Justiça. "Espero que o presidente diga a verdade quando for inquirido, como deveria ser natural. Eu sei que eu falei a verdade. Se ele vai falar ou não, é uma questão que nós deixamos em aberto", disse sobre o depoimento de Bolsonaro, que já foi solicitado pela Polícia Federal e deve ser agendado em breve. Aberto em abril no Supremo Tribunal Federal, o inquérito que apura essas acusações foi prorrogado, na última quarta-feira, por mais 30 dias, pelo decano da Corte, o ministro Celso de Mello.

Centrão

Sobre a aproximação de Bolsonaro com o Centrão, Moro afirmou que, embora o presidente tenha que dialogar com o Parlamento, essa articulação deveria acontecer com os parlamentares que têm "histórico de correição". "Dá para construir pontes e maiorias no Congresso com base naqueles melhores parlamentares", disse.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Estadão
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