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Política

Moro e magistrados pedem veto a juiz de garantias

Ministro e entidades dizem que medida resultaria em custo extra para contratar magistrados

14 dez 2019 - 05h15
(atualizado às 09h49)
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O ministro da Justiça, Sérgio Moro, afirmou nesta sexta-feira, 13, que vai propor ao presidente Jair Bolsonaro o veto à criação do juiz de garantias, medida aprovada no Senado esta semana como parte do pacote anticrime. Entidades que representam a magistratura também são contra a criação da regra, que, na prática, determina que cada processo penal seja acompanhado por dois juízes. O juiz de garantias ficaria responsável pela condução do processo e daria decisões como mandados de busca e de prisão preventiva, enquanto outro magistrado daria a sentença.

Quem se opõe à proposta argumenta que seria de difícil implementação e resultaria em custo extra para o Judiciário, pois seria necessário contratar ainda mais juízes. O Brasil tem 18,1 mil juízes e, só na primeira instância, há déficit de 4,4 mil magistrados em todas as áreas da Justiça. O argumento de Moro é de que a exigência de dois juízes para cada processo sobrecarregará o sistema judiciário.

Ministro Sergio Moro
04/12/2019
REUTERS/Adriano Machado
Ministro Sergio Moro 04/12/2019 REUTERS/Adriano Machado
Foto: Reuters

"O Ministério da Justiça proporá veto de toda a parte do juiz de garantias. Entre outros motivos, a Justiça brasileira, com um juiz na maioria das comarcas, não tem condições de ter dois juízes em cada uma, e o trabalho à distância não é factível", disse Moro à reportagem. Na quarta-feira, a Coluna do Estadão mostrou que o ministro recomendaria o veto a Bolsonaro.

Uma nota técnica enviada ao ministério pela Associação dos Juízes Federais (Ajufe) aponta que 40% das 2,7 mil comarcas da Justiça Estadual no Brasil têm apenas um magistrado. Isso equivale a mais de 1.080 juízes que atuam sozinhos em suas jurisdições. O documento tem como base dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e apresenta argumentos contra a criação do juiz de garantias.

Nos cálculos da Ajufe, seria necessário dobrar o número de juízes na primeira instância que atuam no direito penal. Cada magistrado na Justiça Estadual recebe, em média, R$ 47,4 mil por mês. O cálculo do CNJ inclui benefícios, encargos, transporte, diárias e contribuição previdenciária.

Teto de gastos

O aumento dos custos no Judiciário é considerado impraticável por entidades de classe, inclusive, por causa da emenda constitucional que instituiu o teto de gastos, em 2016. "A necessidade de dois juízes para tratar de um processo penal vai criar uma dificuldade operacional e do ponto de vista orçamentário", diz o presidente da Ajufe, Fernando Marcelo Mendes.

Ele diz que, caso não seja vetada, a regra teria de ser implementada sem disparidade entre regiões. "Não se pode implantar o juiz de garantia apenas nas capitais ou nos processos de colarinho branco."

O tema não é consenso na associação. Ex-presidente da Ajufe, o desembargador federal Nino Oliveira Toldo diz que o sistema judiciário já enfrenta problemas estruturais como a falta de magistrados, e que nem todas as comarcas precisariam do juiz. "Qualquer medida que se tome para que não haja nenhuma dúvida quanto à imparcialidade do magistrado deve ser adotada", diz. "Toda mudança gera incômodo. Mas a ideia central no juiz de garantias aprimora o processo judicial", disse.

A opinião é acompanhada por parte relevante da Defensoria Pública. O presidente do Colégio Nacional dos Defensores Públicos (Condege), Fabrício Lima, considera a criação do cargo um "grande avanço". "No sistema vigente há uma confusão sobre a exata e constitucionalmente correta função do juiz ao analisar diligências que antecedem a ação penal", diz a entidade, em nota.

A presidente da AMB, Renata Gil, afirmou, em nota, que a sanção da proposta implicaria, "em primeira análise" na contratação de aproximadamente 1.800 juízes. "Isso demandaria tempo, em razão da elaboração de concurso público, além de demandar recursos financeiros que a maior parte dos Estados não pode suportar", diz o texto. Procurado, o CNJ não se pronunciou.

A inclusão do juiz de garantias no pacote anticrime foi antecipada pelo Estado em agosto. A medida é vista como uma reação a Moro, que teve sua atuação como juiz na Lava Jato contestada após a divulgação de mensagens com procuradores da operação em Curitiba. O Senado enviou nesta sexta-feira o projeto aprovado à sanção de Bolsonaro, que tem até o dia 3 de janeiro para decidir.

Moro também quer vetar ao menos parte dos dispositivos que modificaram regras para a aplicação de prisão preventiva e o trecho que altera regras de acordos de colaboração premiada - pontos que não constavam no pacote anticrime original. "Talvez haja alguns vetos. Isso vai ser discutido com o presidente", disse o ministro.

Deputados negam custo extra

Deputados favoráveis à criação do juiz de garantias negam que a medida pode provocar a contratação de mais funcionários na magistratura e que seja um ataque à Lava Jato. Eles dizem que, caso Bolsonaro vete a proposta, eles podem trabalhar para derrubar a decisão na Câmara.

Autora da emenda que incluiu o juiz de garantias no pacote anticrime, a deputada Margarete Coelho (PP-PI) afirmou que a inclusão dessa nova figura não traria mais custos pois juízes de comarcas vizinhas poderiam se revezar. "Nas comarcas contíguas, um juiz pode funcionar como de julgamento e o da comarca vizinha como juiz de garantia e vice-versa", disse ela. "Percebi nas conversas que tive durante as negociações e na apresentação do pacote às bancadas que houve uma compreensão muita grande da importância desse instituto."

Autor do texto substitutivo do pacote anticrime aprovado na Câmara, o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) considera o juiz de garantias um avanço para o sistema judiciário. "Ele garante uma isenção do juiz que vai julgar, já que ele fica mais distante do caso. Então, de acordo com estudiosos, é um avanço, países avançados adotam isso", disse.

O deputado afirmou que, caso Bolsonaro barre a inclusão do dispositivo, o plenário pode derrubar o veto. "Isso é o conjunto dos deputados que vai definir. Voto para o dispositivo permanecer", disse.

Essa matéria também é tratada na comissão especial na Câmara para discute a reforma do Código de Processo Penal.

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