MPF nega existência de denúncias de torturas relatadas por Damares Alves
Promotoria no Pará rebateu fala de ex-ministra, que afirmou ter conhecimento de casos de abuso sexual e tortura contra crianças no Pará
O Ministério Público Federal (MPF) rebateu, nesta quinta-feira, 13, as declarações da ex-ministra e senadora eleita Damares Alves (Republicanos-DF) sobre denúncias de tortura e tráfico de crianças. Segundo o órgão, nos últimos 30 anos não houve qualquer registro que fizesse menção aos casos citados por Damares.
Durante um culto em Goiás, no último sábado, 8, a ex-ministra relatou supostos casos de violência sexual contra crianças na Ilha de Marajó. Na ocasião, ela afirmou que crianças da ilha paraense são traficadas para o exterior e submetidas a mutilações corporais e a regimes alimentares que facilitam abusos sexuais. Já durante uma entrevista nesta quinta, Damares afirmou que as denúncias foram baseadas em conversas de rua.
Por meio de nota, a Promotoria Pública Federal no Pará aponta que o órgão atuou, de 2006 a 2015, em três inquéritos civis e um inquérito policial instaurados a partir de denúncias sobre supostos casos de tráfico internacional de crianças, ocorridos desde 1992 no arquipélago de Marajó. Nenhuma das denúncias, no entanto, faz qualquer menção aos casos de tortura listados pela ex-ministra, segundo o MPF.
O Ministério Público Estadual do Pará (MP-PA) aponta que, até agora, não recebeu denúncia formal ou prova a respeito do que Damares afirmou. O MPF diz que segue no aguardo de informações do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, pasta que era comandada pela ex-ministra durante o governo de Jair Bolsonaro, sobre os supostos casos citados por Damares. Até a tarde desta quinta-feira, no entanto, a pasta ainda não havia mandado resposta.
STF pede investigação
Após a fala de Damares, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), mandou para a Justiça Federal do Pará um pedido de investigação de falas da ex-ministra. A Corte foi acionada por um grupo de advogados para que Damares seja investigada por prevaricação, que é quando um servidor público toma conhecimento de irregularidades, mas não leva o caso às autoridades competentes.
Lewandowski entendeu que o caso não pode ser apurado no STF, porque a ex-ministra não tem foro privilegiado. Damares ainda não assumiu o mandato de senadora.
"Diante desse contexto, forçoso concluir pela incompetência do STF. Sem prejuízo, em razão da natureza dos fatos noticiados, caberá ao juízo federal competente, após a oitiva dos órgãos de investigação, examinar os supostos eventos noticiados e os pedidos formulados na presente representação", diz o ministro na decisão.
Conversas de rua
Durante uma entrevista à Rádio Bandeirantes, Damares foi questionada sobre a veracidade das denúncias que fez no culto do final de semana. A ex-ministra afirmou que os casos já são conhecidos pelo Ministério Público do Pará e pela população do Estado.
"Eu não estou denunciando, eu estou trazendo à luz o que já estava denunciado", disse ela. "Isso tudo é falado nas ruas do Marajó", acrescentou. "Em áreas de fronteiras, escutamos coisas absurdas sobre o tráfico de mulheres e de crianças".
A senadora ainda citou uma série de documentos e três CPIs que, supostamente, atestam a veracidade de suas falas. Segundo a ex-ministra, ela não pode revelar outras informações para não expor as vítimas.
Quando perguntada se encaminharia tais documentos ao Ministério Público do Pará, ela disse que não tinha acesso ao que chegava na Ouvidoria da pasta que coordenou.
"A Ouvidoria encaminha diretamente para o Ministério Público, porque são dados sigilosos. O que eu falo no meu vídeo são as conversas que eu tenho com o povo na rua. Eu não tenho acesso aos dados, eles são sigilosos, mas nenhuma denúncia que chegou na Ouvidoria deixou de ser encaminhada", afirmou.