Oposição usa piora na economia para tentar inflar atos contra Bolsonaro
Fora do foco de manifestações anteriores, temas como a disparada da inflação, os índices de desemprego e o aumento da fome no País estarão entre os principais motes dos atos organizados por partidos de oposição ao governo de Jair Bolsonaro previstas para este sábado, 2. A mudança de tática, segundo dirigentes dessas siglas, é uma tentativa de ampliar a mobilização pelo impeachment e de se diferenciar de grupos mais ligados à direita que foram às ruas no dia 12, quando não houve a participação das principais legendas de esquerda.
No fim de maio, a vacinação em massa contra a covid-19 e a ampliação do auxílio emergencial eram as principais bandeiras dos atos. Com a imunização avançando no País e a prorrogação do benefício defendida até mesmo pelo governo, opositores agora destacam a acentuada piora nos índices econômicos como elemento para levar as pessoas a saírem de suas casas para protestar contra Bolsonaro.
"As manifestações de amanhã (sábado) têm uma centralidade que é, além do impeachment, o combate aos problemas do País: desemprego, fome. Esses temas, que não estavam na manifestação do (Movimento Brasil Livre) MBL (no dia 12 de setembro), terão muito peso", afirmou o deputado José Guimarães (PT-CE).
Os atos deste sábado ocorrerão no momento em que o índice oficial de inflação chega ao patamar de 10% no acumulado de 12 meses até setembro, na maior alta para o mês desde o início do Plano Real. Dados divulgados nesta semana pelo IBGE também mostram que o País ainda tem 14 milhões de pessoas na fila do desemprego. Além disso, cerca de um a cada três brasileiros apresentava algum grau de insegurança alimentar no fim do ano passado, segundo pesquisa da Universidade Livre de Berlim, na Alemanha, em parceria com universidades brasileiras.
Nas últimas semanas, protestos de grupos como o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) já usaram a inflação alta e o aumento da fome como mote. Foi o que ocorreu em um ato em frente à casa do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) em Brasília, na quinta-feira, 1º, e na ocupação da Bolsa de Valores de São Paulo: nos dois casos, ativistas levaram ossos bovinos para lembrar das imagens em que moradores de rua disputam restos de comida em capitais brasileiras.
"O grande problema hoje no Brasil, com a vacinação avançando apesar do Bolsonaro, é a crise econômica e social. O brasileiro está comendo osso, literalmente", afirmou Washington Quaquá, vice-presidente do PT.
Ainda sem conseguir unir os partidos que fazem oposição ao governo, os organizadores das manifestações deste sábado esperam superar o número de pessoas que participaram dos atos organizados pelo MBL e pelo Vem Pra Rua em setembro. Na ocasião, siglas de esquerda não compareceram, colocando em xeque a tentativa de se formar uma ampla frente anti-Bolsonaro.
A falta de engajamento de alas do PT na defesa do impeachment é motivo de crítica de grupos de oposição, à esquerda e à direita. Líderes do Novo, do MBL e do Vem Pra Rua - rivais dos petistas - acusam o partido de não estar interessado na deposição de Bolsonaro há um ano das eleições, pois aposta que será mais fácil derrotar um presidente fraco em 2022.
Sem ter a presença de alguns principais nomes da chamada terceira via, os partidos de esquerda e centro-esquerda devem protagonizar os atos deste sábado. Com a participação majoritária de lideranças do PT, PDT, PSOL, PSB, Solidariedade e Rede, entre outros, os protestos serão reforçados pela forte participação das centrais sindicais e de movimentos sociais.
Maior partido da oposição, o PT mobilizou seus caciques - com a exceção do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que seguirá fora das ruas - para os atos de sábado. Em São Paulo, o ex-prefeito Fernando Haddad e a presidente petista, Gleisi Hoffmann, estão entre os nomes que farão discursos.
Os atos acontecem em pelo menos 260 cidades do País e tentam minar a blindagem política do presidente dentro do Congresso. Respaldado pelo apoio do Centrão, Bolsonaro hoje dificilmente teria um pedido de impeachment aprovado. Mas, na avaliação dos organizadores dos atos, se os protestos forem expressivos, essa blindagem pode começar a se romper ou, pelo menos, reduzir suas chances políticas de reeleição. Existe também o interesse em "responder" aos atos feitos por Bolsonaro no 7 de Setembro e colocar mais gente na rua do que conseguiu o presidente.
Por conta disso, houve uma mobilização entre os organizadores dos atos para buscar a presença de representantes de forças políticas fora da esquerda para ampliar o alcance dos protestos. Mas alguns dos principais nomes da chamada terceira via estarão ausentes.
O governador de São Paulo, João Doria, estará em Minas Gerais buscando atrair votos dos tucanos locais para vencer as prévias do PSDB. Seu principal oponente na disputa interna, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, iniciará neste sábado uma viagem oficial para a Espanha. Outros nomes citados como possíveis candidatos da terceira via, como o ex-juiz Sérgio Moro e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM), nem sequer admitem ainda a possibilidade de concorrer ao Planalto e não estarão nos atos. Dois outros pré-candidatos presidenciais, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) e o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), também deverão se ausentar por causa de questões pessoais.
Candidato do PDT, Ciro Gomes será o principal nome presente aos atos de fora da polarização entre Lula e Bolsonaro. Será a primeira vez que se reencontrará no mesmo palanque que as lideranças petistas, com quem vive às turras desde a campanha presidencial de 2018. Ciro entende que o movimento de defesa da democracia e contra o governo de Bolsonaro precisa unir todas as forças possíveis que tenham esse mesmo objetivo.
Os sindicatos também querem que a força dos protestos coloque pressão sobre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), aliado de Bolsonaro, para que coloque em pauta algum dos pedidos de impeachment. "Dia 2 de Outubro é a união do Brasil contra esse desgoverno do Bolsonaro. Vamos para as ruas, mostrar que o povo brasileiro defende a democracia e não aguenta mais viver em um país com a gasolina a R$ 7 e gás de cozinha a R$ 120", defendeu o deputado Paulinho Pereira (SP), principal líder da Força Sindical.