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Política

Palavrões e ameaças: os bastidores da reunião de Bolsonaro

Em encontro, o presidente Jair Bolsonaro pediu alinhamento, segundo presentes

7 mai 2020 - 21h41
(atualizado às 22h15)
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Sergio Moro e o presidente Jair Bolsonaro durante feriado de 7 de setembro de 2019
Sergio Moro e o presidente Jair Bolsonaro durante feriado de 7 de setembro de 2019
Foto: EPA / Ansa

BRASÍLIA - Palavrões, briga de ministros, anúncio de distribuição de cargos para o Centrão e ameaça do presidente Jair Bolsonaro de demissão "generalizada" a quem não adotasse a defesa das pautas do governo. De acordo com participantes na reunião citada por Sérgio Moro, ex-titular da pasta da Justiça e Segurança Pública, é este o conteúdo do vídeo requisitado pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, e que o Palácio do Planalto quer evitar divulgar na íntegra.

Na tarde desta quinta-feira (7), a Advocacia-Geral da União pediu ao decano pra enviar somente trechos da reunião de 22 de abril, que sejam ligadas ao Moro e Bolsonaro. Segundo o ex-ministro, na ocasião o presidente o pressionou na frente dos colegas a trocar o comando da Polícia Federal.

Na noite de quarta-feira, 6, o governo pediu que Celso de Mello reconsiderasse o pedido do vídeo por se tratar de "assuntos sensíveis de Estado." Conforme o Estadão informou, o Planalto também cogitou alegar não ter o conteúdo na íntegra mas apenas trechos da reunião, pois as gravações são "pontuais e curtas".

O encontro de cerca de duas horas, cujos bastidores hoje mobilizam Brasília, ocorreu no terceiro andar do Palácio do Planalto, dois dias antes da demissão de Moro, e é considerado o mais tenso do governo até aqui. A agenda com o presidente foi convocada inicialmente para apresentação do programa Pró-Brasil, de recuperação econômica, e teve a participação de 26 autoridades, incluindo o vice Hamilton Mourão, todos os ministros e presidentes dos bancos. Outros auxiliares diretos de Bolsonaro também acompanharam.

Em relatos reservados, dois ministros disseram ao Estadão que a ameaça de demissão não foi direcionada ao ex-juiz da Lava Jato, mas foi um recado a todos os integrantes do primeiro escalão. Segundo participantes do encontro, o presidente cobrou alinhamento às pautas dele e cumprimento irrestrito de suas ordens.

Foi neste contexto, sempre de acordo com os relatos feitos ao Estadão, que Bolsonaro pediu acesso às informações de inteligência. À reportagem, presentes na reunião evitaram confirmar se o presidente exigiu a troca do comando da PF. Dois deles alegaram não "se lembrar."

No entanto, de acordo com um dos participantes, o presidente disse que quem não estivesse satisfeito poderia ir embora. Outro auxiliar disse que Bolsonaro falou poderia demitir quem quisesse.

A cobrança de Bolsonaro a seu primeiro escalão foi feita com muitos palavrões. Apesar disso, auxiliares observam que é comum o presidente, às portas fechadas e à vontade, usar termos que não atendem aos bons modos. Nestas ocasiões, para evitar vazamentos, todos os participantes são obrigados a deixar o celular do lado de fora da sala. O único que costuma ser exceção é o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno. Já o telefone do presidente costuma ficar nas mãos de um ajudante de ordens.

Fotos feitas pela Secretaria Especial de Comunicação (SECOM) da reunião do dia 22 de abril mostram os participantes com as feições cerradas. Em várias delas, Moro está com os braços cruzados e o semblante tenso. Pelos registros, é possível verificar que há uma câmera de vídeo no local.

Até agora a Secom não respondeu os questionamentos sobre a existência do vídeo. Nos bastidores, auxiliares do Planalto passaram a alegar que só havia trechos pontuais da gravação. O argumento confronta uma declaração do próprio presidente que, no dia 28 de abril, admitiu que os encontros do primeiro escalão são filmados, e os vídeos guardados em um cofre. Bolsonaro chegou a prometer que divulgaria o vídeo da reunião com Moro para mostrar como ele trata os ministros, mas dois depois recuou alegando que recebeu o conselho para "não divulgar para não criar turbulência."

Outro "assunto sensível" tratado pelo presidente, que também poderia ser motivo de "turbulência", foi aproximação do governo com líderes dos partidos do centro. Bolsonaro comunicou que entregaria cargos às legendas e provocou reações. Moro, segundo o Estado apurou, teria demonstrando discordância.

O encontro foi convocado para a apresentação do Pró-Brasil, programa de recuperação econômica anunciado pelo ministro-chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto, com o incentivo do ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, e sem o aval do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Diante dos colegas de Esplanada, Guedes e Marinho se desentenderam sobre gastos públicos para incentivar a retomada da economia após o fim da pandemia da coronavírus. Marinho disse Guedes era apegado a dogmas. O ministro da Economia, por usa vez, respondeu dizendo que tinha estudado o que ninguém estudou. E acrescentou que que o plano Pró-Brasil era "completamente maluco". Na mesma oportunidade, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, teria feito duras críticas ao ministro do STF.

O pedido do vídeo foi deferido por Celso de Mello, na terça-feira, dia 5, no inquérito que apura as acusações do ex-ministro Sérgio Moro de tentativa de 'interferência política' de Bolsonaro no comando da Polícia Federal.

Foram citados o chefe da Secom, Fabio Wanjgarten, o chefe da assessoria especial da Presidência, Célio Faria Junior, e o ministro-chefe da Secretaria-Geral, Jorge Oliveira, que obriga a apresentar as gravações. Os três receberam a notificação na quarta-feira (6). Faria e Jorge Oliveira alegam que não cabe a eles gravar ou manter registros de audiovisual das reuniões. A Secom não respondeu.

Estadão
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