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Política

Prisão de Queiroz ativa "bomba-relógio" no governo Bolsonaro

Nova crise fragiliza ainda mais governo, que acrescenta à sua lista uma nova pendência na justiça, apontam especialistas

19 jun 2020 - 05h12
(atualizado às 07h23)
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A prisão de Fabrício Queiroz ativa uma nova 'bomba-relógio' no governo de Jair Bolsonaro com potencial de ser ainda mais perigosa do que as outras investigações envolvendo o presidente e sua família, avaliam cientistas políticos ouvidos pelo Estadão. Segundo eles, com a nova crise, o governo fica ainda mais fragilizado e acrescenta em sua lista uma nova pendência na justiça, ao lado de ações como o Inquérito das Fake News, a cassação da chapa e a investigação sobre a interferência na Polícia Federal.

Presidente Jair Bolsonaro no Palácio da Alvorada
09/06/2020 REUTERS/Adriano Machado
Presidente Jair Bolsonaro no Palácio da Alvorada 09/06/2020 REUTERS/Adriano Machado
Foto: Reuters

"Tudo vai depender dos próximos dias, do que o Queiroz vai depor. E se ele decide falar de maneira sincera? Do ponto de vista da periculosidade, ele é muito mais perigoso, por exemplo, do que o inquérito das Fake News", avalia Marco Aurélio Nogueira, cientista político e professor da Unesp. Para ele, a prisão do Queiroz mostra que as acusações contra a família de Bolsonaro estão vindo de "vários lados", fechando o cerco do presidente. "Não é só o Supremo. É a PGR (Procuradoria-Geral da República), o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o Ministério Público. Essa prisão leva a crise para dentro do Planalto. É como se a gente estivesse assistindo a uma subida repentina das águas, que agora estão batendo no queixo do presidente."

Ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), Queiroz é investigado em um suposto esquema de rachadinha na Assembleia Legislativa do Rio e por lavagem de dinheiro. Ex-policial militar, ele trabalhou como motorista da família Bolsonaro, mas acabou virando um "faz tudo" do clã quando Flávio era deputado estadual pelo Rio de Janeiro.

Apesar da investigação parecer mais nociva para Flávio do que para o presidente, ela certamente trará consequências ao governo, diz o cientista político e professor da FGV-SP Marco Antônio Carvalho Teixeira. "Obviamente, o cerco inicial se dará em cima do filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro, mas com certeza não ficará restrito a isso e deverá chegar ao núcleo central do governo, num momento em que o mandatário está acuado por todos os lados e sua gestão vive um dos momentos de maior fragilidade."

A imprevisibilidade sobre a reação de Queiroz diante de sua prisão, e possivelmente de sua filha e esposa, instala uma "bomba-relógio" que pode estourar a qualquer momento no governo. "Não sabemos a reação dele diante da prisão. Fala-se em delação premiada. E Queiroz acompanha a família Bolsonaro há anos, não é de hoje que ele conhece o presidente. É um grupo político e militar muito complicado, que você não sabe as reações", diz a cientista política e professora da PUC-SP, Vera Chaia.

Vanessa Elias de Oliveira, doutora em ciência política e professora associada da Universidade Federal do ABC, diz que a prisão de Queiroz deixa o governo ainda mais frágil e dá margem para mais negociações com o Centrão, bloco informal do Congresso com o qual Bolsonaro tem se aproximado. "O Centrão apoia em troca de cargos e outras benesses. Quando o governo se fragiliza, precisa ainda mais do apoio do Centrão, que certamente cobrará mais caro por isso. A imagem do governo se fragiliza e o custo político do apoio aumenta, e isso é especialmente importante para a tentativa de bloquear um possível processo de impeachment no Congresso."

Nas últimas semanas, o presidente tem entregado cargos políticos ao grupo informal em troca de apoio no Congresso. Um dos mais recentes foi a recriação do Ministério das Comunicações, que saiu da pasta do ministro-astronauta Marcos Pontes para o deputado Fábio Faria (PSD-RN), genro do apresentador e empresário Silvio Santos, do SBT.

O apoio do Centrão, porém, não deve ser capaz de barrar os estragos que a prisão de Queiroz poderá trazer, diz Marco Antônio Carvalho. "Nem o Centrão segura os reflexos de uma crise dessas porque eles também estão preocupados com as eleições (pleito municipal deste ano), o que vai restar ao presidente, no meu entender, é ver em quem ele vai se fiar, se na ala militar ou na olavista de sua gestão, mas os estragos estão a caminho."

Para o cientista político e professor do Mackenzie Rodrigo Prando, a prisão de Queiroz fragiliza o governo pois acrescenta à lista de Bolsonaro mais uma pendência na justiça. "O governo está sempre em compasso de espera pelo o que está na justiça. Ele está hoje em compasso de espera no TSE, no STF, na intervenção da PF, no inquérito das Fakes News."

A nova crise, segundo o professor, expõe uma prática cultural no Brasil e que tem sido realidade no governo desde o início. "Desde o princípio, Bolsonaro mistura família e política, amizade e política, interesses privados e públicos. Tudo isso está agora explicitado. Hoje temos no governo um conjunto de fios desencapados e eletrificados. A hora que encosta um no outro, dá curto-circuito. E Queiroz é um deles. A grande questão é: o que ele sabe e o que pode falar."

Estadão
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