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Política

PSL x Bolsonaro: entenda a origem da crise que virou guerra

Desentendimentos entre o presidente e alas de seu partido, que culminaram na destituição de lideranças, foram frequentes ao longo do ano

18 out 2019 - 05h11
(atualizado às 09h51)
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A crise que opõe o presidente Jair Bolsonaro e a cúpula do seu próprio partido, o PSL, se tornou nesta quinta-feira, 17, uma guerra declarada com a divulgação de áudios, ameaças e retaliações. Após se movimentar para isolar o grupo do presidente do partido, deputado Luciano Bivar (PE), Bolsonaro sofreu derrotas de peso.

O presidente não conseguiu derrubar o líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir (GO), que depois o chamou de "vagabundo" e disse que vai "implodi-lo". A direção do partido, controlada por Bivar, indicou que vai destituir o deputado Eduardo Bolsonaro e o senador Flávio Bolsonaro do comando dos diretórios regionais em São Paulo e no Rio, respectivamente.

O líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir (PSL-GO), concede entrevista coletiva na Câmara dos Deputados, em Brasília
O líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir (PSL-GO), concede entrevista coletiva na Câmara dos Deputados, em Brasília
Foto: Gabriela Biló / Estadão Conteúdo

Ouça - Delegado Waldir fala em 'implodir o presidente' aos 2:40 no áudio abaixo:

Apesar de ter tomado proporções inéditas, a disputa interna no PSL se agrava desde o início do ano. Abaixo, uma cronologia dos episódios mais marcantes de desentendimento entre o presidente e seu partido.

A demissão de Bebianno

Após ser alvo de uma longa campanha de difamação, Gustavo Bebianno foi exonerado do cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência em fevereiro. Coordenador da campanha de Bolsonaro em 2018, ele presidiu a legenda durante as eleições e era o responsável legal por repasses para candidaturas pouco competitivas em Pernambuco, que ficaram conhecidas como candidaturas laranjas. O presidente Bolsonaro pediu investigação do caso.

A crise no governo cresceu quando o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente, chamou Bebianno de mentiroso, declaração que foi reafirmada pelo próprio Bolsonaro. O presidente ficou irritado e decidido a demití-lo ao saber que o então chefe da Secretaria-Geral teria mostrado a amigos arquivos de áudio com a voz do presidente ordenando que Bebianno suspendesse uma viagem, além de outras conversas.

Bebianno ocupou a presidência do PSL provisoriamente durante a campanha eleitoral, e devolveu o cargo a Bivar após a vitória. Em uma entrevista concedida ao Estado em agosto, o ex-ministro disse que Bolsonaro "atira nos seus soldados" e previa que expurgos no governo, como o seu caso, não iriam cessar.

PF e MP investigam Bivar em Pernambuco

Em fevereiro, Luciano Bivar (PSL-PE) já era alvo de investigação que apurava se ele havia praticado caixa dois durante sua campanha em Pernambuco. O inquérito foi aberto pela Procuradoria Regional Eleitoral em Pernambuco, com foco no uso de recurso do fundo partidário para contratar a empresa de um de seus filhos . A Procuradoria também investigava o recebimento de doação de R$ 8 mil de uma pessoa desempregada há mais de quatro meses. O caso foi revelado pelo Estado.

No mês seguinte, a Justiça Eleitoral autorizou a Polícia Federal a investigar a suspeita de que uma candidata do PSL pernambucano, Maria de Lourdes Paixão, teria atuado como "laranja" para receber R$ 400 mil de verba pública eleitoral. Secretária do PSL em Pernambuco, ele teve apenas 247 votos na briga por uma vaga da Câmara dos Deputados em 2018, mas recebeu a terceira maior cota do fundo eleitoral do partido.

O Estado apurou que denúncias contra Bivar acabaram irritando Bolsonaro.

PSL contraria governo em votações

A bancada do PSL na Câmara teve problemas de coesão desde o começo da legislatura. Sem controle sobre a pauta da Câmara dos Deputados, o governo abriu mão de orientar o voto de seus aliados em 31% das votações realizadas nos primeiros cinco meses de mandato. A alta "taxa de omissão" indica que, praticamente, uma em cada três propostas em tramitação não era de interesse do Palácio do Planalto - ou que o líder do governo preferiu não se manifestar por haver risco de derrota.

Análise do Basômetro, ferramenta do Estado que mede o governismo de deputados e partidos, mostrou que nesse período o presidente do PSL, Luciano Bivar, só apareceu em 11% das votações nas quais o governo orientou sua base a aprovar algum projeto na Câmara.

Houve momentos em que o PSL chegou a contribuir para a derrota do governo, como na aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que engessou parte maior do Orçamento e tornou obrigatório o pagamento de despesas que podiam ser adiadas, como emendas de bancadas estaduais e investimentos em obras. A proposta, encarada como exemplo da falta de controle do governo na Câmara, teve votos favoráveis do PSL.

Alexandre Frota é expulso

O deputado federal Alexandre Frota (SP) foi expulso em agosto dos quadros do PSL. Frota vinha fazendo críticas à legenda e ao governo de Jair Bolsonaro, e chegou a dizer que o presidente era sua "maior decepção" e que a indicação de Eduardo Bolsonaro. O deputado foi criticado, sobretudo, por se abster na votação do 2º turno da Previdência, o que foi considerado uma "traição" à legenda.

No pano de fundo da expulsão, havia uma disputa pelo controle de diretórios municipais do PSL em São Paulo, entre o grupo político do senador Major Olímpio e parte dos parlamentares não ligados à bancada militar, no qual Frota estava incluído. A saída abriu precedente para que outros parlamentares entrassem na mira do partido.

Frota não era o único que criticava a linha de Bolsonaro no partido. O próprio líder do PSL na Câmara, deputado Delegado Waldir (GO), já havia criticado a influência que o escritor Olavo de Carvalho tinha sobre o governo. "O presidente não pode ficar à mercê dessas pessoas e pegar a opinião do 'louco do dia'", disse.

Flávio pressiona contra CPI da Lava Toga

A senadora Juíza Selma alegou 'pressão partidária' para deixar o PSL
A senadora Juíza Selma alegou 'pressão partidária' para deixar o PSL
Foto: Edison Rodrigues/Agência Senado / Estadão Conteúdo

Em setembro, um movimento da cúpula do PSL, articulado pelo senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), para abafar a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado que tenha como foco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) provocou um racha no partido. Diante da pressão partidária pela chamada CPI da Lava Toga, a senadora Juíza Selma (PSL-MT) deixou a sigla e se filiou ao Podemos.

A CPI era encarada no Congresso e no Palácio do Planalto como perigosa, com potencial para afetar a relação entre os Poderes. Oo objetivo da comissão é apurar o que parlamentares chamam de "ativismo judicial" de magistrados, incluindo ministros do Supremo. A crítica de senadores favoráveis à CPI, na qual se incluem Selma e Major Olímpio, é de que a Corte muitas vezes toma decisões sobre assuntos ainda em discussão no Congresso, sobrepondo a atribuição dos parlamentares de legislar.

'Esquece o PSL'

Em cerca de uma semana, a relação entre Bolsonaro e o PSL piorou exponencialmente. Sem saber que era gravado, o presidente disse a um apoiador na porta do Palácio da Alvorada para "esquecer o PSL", e acrescentou que o presidente do partido, Luciano Bivar, estava "queimado para caramba". No dia seguinte, Bivar respondeu que o vídeo demonstrava que Bolsonaro já havia decidido deixar a sigla e que o presidente "não tem mais nenhuma relação com o PSL".

Estimulados pelo presidente Jair Bolsonaro, um grupo de deputados do PSL pediu ao partido que promova uma auditoria de suas contas para avaliar como foram utilizados os recursos públicos recebidos por meio do Fundo Partidário. A iniciativa tinha como intenção pressionar Luciano Bivar.

Uma semana depois da declaração de Bolsonaro circular na imprensa, a Polícia Federal deflagrou uma operação de busca e apreensão contra Luciano Bivar. Batizada de "Guinhol", em alusão a marionete, a operação tem relação com suspeitas da montagem de um esquema de candidaturas laranjas - o que Bivar nega. A ação inflamou ainda mais a ala "bivarista" do PSL, que já pedia o afastamento de parlamentares pró-Bolsonaro das funções no partido.

Guerra declarada: grampos, destituições e ameaças

O mais ruidoso capítulo da briga começou na quarta-feira, 15, quando Bolsonaro tentou substituir Delegado Waldir por seu filho Eduardo na liderança do PSL na Câmara. Para tanto, chamou um grupo de parlamentares do seu grupo para uma conversa a portas fechadas, no Palácio do Planalto, e exerceu seu poder de pressão. Bolsonaro estava irritado com Waldir, que no dia anterior orientara a bancada a votar contra uma Medida Provisória de interesse do governo, e cobrou apoio à troca de comando na liderança. Fez o apelo pessoalmente e em telefonemas.

Ao saber dessas articulações, Waldir não se conteve. "Eu vou implodir o presidente", afirmou o deputado, em reunião com colegas do partido. "Andei no sol 246 cidades, no sol gritando o nome desse vagabundo."

O protocolo da Câmara recebeu listas assinadas por deputados do PSL - duas delas pediam a substituição da liderança e outra, a sua manutenção. A Secretaria-Geral da Mesa Diretora da Câmara conferiu as assinaturas e invalidou quatro delas. Com isso, Delegado Waldir foi mantido como líder.

Bolsonaro também substituiu a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), líder do governo no Congresso, pelo senador Eduardo Gomes (MDB-TO). Da ala pró-Bivar e desafeta de Eduardo, Joice foi signatária de uma lista pedindo a manutenção de Waldir no posto, o que enfureceu o presidente.

Nesta sexta, 18, o PSL deve fazer uma convenção extraordinária, em Brasília, para referendar mudanças no estatuto que desidratam a ala bolsonarista no partido. Eduardo e Flávio devem ser destituídos do comando dos diretórios regionais em São Paulo e no Rio, respectivamente.

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