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Política

"Queda da prisão na 2ª instância favorece pacote anticrime"

Para relator Marcos do Val, decisão do STF deixa sociedade 'indignada' e aumenta pressão pela aprovação do projeto de Moro

18 nov 2019 - 05h12
(atualizado às 09h16)
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BRASÍLIA - Relator do pacote anticrime, o senador Marcos do Val (Podemos-ES) deve endossar o texto original da proposta enviada ao Congresso pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. Ele vai entregar seu parecer na próxima quarta-feira à Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Em seu gabinete, sobre a mesa, o senador de 48 anos exibe duas garrafas d'água em formato de balas.

Ex-instrutor de tiros e de técnicas de segurança, ele reclama do ritmo "lento" e das pressões no Congresso. "A pancada aqui é forte. A gente sofre muita pressão para ficar quietinho, entrar no jogo, jogar como sempre foi jogado", diz. "Quando a gente confronta o sistema a pressão é grande."

Fachada do Congresso Nacional
Fachada do Congresso Nacional
Foto: Wilson Dias/Agência Brasil / Estadão Conteúdo

O senhor foi um dos 41 senadores que assinaram carta pedindo ao STF a manutenção da possibilidade da prisão em segunda instância. Como avalia a decisão da Corte tomada no sentido contrário?

Eu disse até para minha equipe que a queda da segunda instância no STF ia ajudar muito a fortalecer a aprovação do pacote anticrime. A sociedade ficou indignada. Eu fiquei indignado. Está todo mundo se mexendo para o pacote ser aprovado, então agora a pressão está sendo maior, e eu previ isso lá. Não estou falando que vai ser fácil.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), disse ao Estado que a 2.ª instância não é a única prioridade. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM), não deu garantia de que pautará.

Nós vamos continuar pressionando, porque é inadmissível a gente ver a demanda da sociedade e não atender a essa demanda. É algo que não entendi até agora como é que conseguem se convencer a não atender o desejo da sociedade. Têm outras pautas, importantes, têm, mas a sociedade está demandando essa e, como representantes da sociedade, temos de atender. Não consigo entender essa forma tradicional de fazer política. Nós estamos no grupo Muda Senado, vamos pressionar Alcolumbre e Rodrigo Maia para que deem importância e velocidade.

Como avalia a postura do Congresso na questão do combate ao crime?

O Congresso tem questionado muito as decisões do STF. Está dizendo que ele está passando a fazer o que nós fomos colocados aqui pra fazer. Mas eu percebo que nós temos uma morosidade aqui e uma vontade de que as coisas não tenham a velocidade que precisa ter.

O senhor vê "corpo mole"?

Corpo mole. E outros porque querem ser oposição por oposição. Se fosse oposição por ter um questionamento, uma visão diferente, que agregasse, tudo bem. Mas oposição por oposição é algo que eu não consigo entender. É torcer para a aeronave cair com você dentro.

Nesta semana, o STF decidirá regras sobre o compartilhamento de dados fiscais e bancários entre órgãos de investigação. Uma liminar do ministro Dias

Toffoli paralisou o andamento de inquéritos. O senhor apresentou uma PEC com novas regras sobre o tema. O que o senhor pretende introduzir na legislação?

Que dê essa autonomia para esses órgãos fazerem suas investigações, sem precisar ficar pedindo autorização para a Justiça. Precisa ter velocidade, precisa ter independência. Eu penso o seguinte: quem não deve não teme. Tem de ficar à vontade para investigar. E eles precisam ter essa liberdade e velocidade. Se a gente começa a engessar, pronto. A gente está, de certa forma, sufocando o trabalho de combate à corrupção.

Um dos casos emblemáticos afetados pela liminar do ministro Dias Toffoli é o da "rachadinha" de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). Como o senhor avalia a paralisação desse caso na Justiça?

Eu enxergo de forma muito negativa para o governo. A bandeira era o combate à corrupção. E isso mostrou que ele (presidente Jair Bolsonaro) freou essa caminhada, que foi uma das principais bandeiras durante a candidatura dele. E isso preocupa. Isso enfraqueceu. Hoje eu sinto que o combate à corrupção está enfraquecendo.

Como relator do projeto anticrime, o senhor manteve quase a íntegra do texto.

Só acrescentei algumas partes que estavam polêmicas. Na excludente de ilicitude, a bancada feminina estava muito preocupada, achando que isso daria mais chance ao feminicídio, então a gente colocou uma cláusula para excluir violência envolvendo mulheres ou parceiras do lar. Nas situações de feminicídio isso não entra. Mantivemos a prisão em segunda instância.

Mesmo depois da decisão do Supremo vetando a execução antecipada da pena.

Antes da votação do STF, o ministro (Moro) falou para mim: "Se o senhor quiser retirar da sua relatoria, para mim está tudo bem". Mas aí eu falei: "Não, ministro, eu quero que permaneça na minha relatoria, porque é uma demanda da sociedade, eu acredito que, sem ela, o pacote anticrime não vai ter o mesmo efeito, e se alguém quiser tirar, que tire na CCJ, e se responsabilize perante a sociedade".

Como o senhor recebe a crítica de que a excludente é uma licença para matar?

A gente tem uma visão muito errada da ação policial. As pessoas estão achando que é uma polícia que mata, mas não é. Se você for ver as operações pelo Brasil afora, é uma porcentagem muito pequena daquele policial que acabou exercendo a função de uma forma que não deveria. Se eu entender que na polícia só existe mal profissional, aí eu teria receio, mas eu, lidando com a polícia e vendo que a proporção é quase zero de incidentes, não posso achar que a exceção é a regra. É isso que a sociedade tem de entender. É isso que vou mostrar com cálculos e números, que o número de abordagens em situações como essas são muito maiores que os incidentes.

O senhor entende que tem mais chances de passar no Senado do que na Câmara?

Não é uma crítica que faço (à Câmara), é uma estrutura diferente, são muitas pessoas, muitas sugestões. Eu fico até preocupado com o nosso pacote e como será recebido lá quando nossa relatoria for feita. A gente quer dar velocidade no Senado, que seja aprovado, que ele seja mais fidedigno ao desejo do ministro Moro, porque o que está tramitando lá (na Câmara) já foi todo esquartejado.

A direita no Congresso rachou entre aliados de Sérgio Moro e do presidente Bolsonaro. O senhor se considera "morista"?

Não gosto de ser colocado num quadrado. Hoje ele (Moro) é o ministro da Justiça. Há uma afinidade com a área de atuação. Se fosse outro ministro da Justiça, provavelmente, eu também apoiaria, como senador. Agora, eu, como pessoa, o admiro. Ele teve coragem de entrar em uma seara complicada. Mas já discordei dele em alguns temas. Da mesma forma, discordei do governo. Todos os projetos em que eu vinha favorável ao governo, todo mundo achava que eu era mais um bolsominion. Mas quando eu me posicionei contra a candidatura de Eduardo Bolsonaro à Embaixada do Brasil nos Estados Unidos, as pessoas se assustaram.

O que levou o senhor a se posicionar contra a indicação do deputado à embaixada?

Não é contra o governo, é contra a indicação. Eu, como vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, recebo toda semana embaixadores que vêm se apresentar, vêm dizer o trabalho que é feito e que vão fazer. A carreira diplomática é muito difícil. Eu não me sentiria bem em colocá-lo em uma posição para a qual muitos estão, há anos, se sacrificando, se dedicando, estudando. Eu não achava justo. Para mim, seria o equivalente a dar um diploma de médico para alguém que não fez medicina.

O senhor se sente à vontade no Senado?

Quando você vem sem fundo partidário, e eu não aceitei fundo partidário, você vem com recursos próprios ou com ajuda direta da sociedade (a campanha custou R$ 90 mil), e você vem leve, sem ficar refém de partido ou de governo. Aí, você tem autonomia total de dizer e fazer o que quer. Ninguém me controla aqui, seja governo, seja partido.

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