Religioso, Toffoli dá lição ao liberar Jesus gay da Netflix
Derrubada da censura contra sátira do Porta dos Fundos fortalece liberdade dos humoristas em geral
Em fevereiro de 2019, na estreia do programa Em Foco da jornalista Andréia Sadi, na GloboNews, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, admitiu se pautar pela fé e até mostrou uma miniatura de terço católico que sempre carrega no bolso. Essa revelação diante das câmeras, evidenciou a religiosidade do homem que ocupa a cadeira mais poderosa do Judiciário brasileiro.
Foi esse mesmo devoto de Nossa Senhora de Fátima que suspendeu a censura ao especial de Natal 'A Primeira Tentação de Cristo', da produtora Porta dos Fundos. A retirada do vídeo havia sido determinada por um juiz do Rio de Janeiro, atendendo ao pedido de uma associação católica — ou seja, de praticantes da mesma religião de Toffoli.
"Não se descuida da relevância do respeito à fé cristã (assim como de todas as demais crenças religiosas ou a ausência dela). Não é de se supor, contudo, que uma sátira humorística tenha o condão de abalar valores da fé cristã, cuja existência retrocede há mais de 2 (dois) mil anos, estando insculpida na crença da maioria dos cidadãos brasileiros", escreveu o ministro em seu despacho.
Por conta do respeito e culto que tem pela imagem de Cristo, Dias Toffoli provavelmente seja contra a insinuação de que o filho de Deus teria tido uma experiência homossexual, como sugere a produção do Porta dos Fundos, disponível na plataforma de streaming Netflix desde 3 de dezembro. Mas, como guardião máximo da lei, ele passou por cima da fé pessoal para garantir a liberdade de expressão, um valor constitucional inegociável assim como a liberdade de crença religiosa.
No saldo final, esse episódio fez bem aos humoristas. A todos, não apenas aos do Porta dos Fundos. A corte máxima do País, na figura de seu presidente, deu um recado importante a quem acha que a censura é opção no combate ao politicamente incorreto.
Toda pessoa ou grupo tem o direito de protestar contra eventuais excessos e supostos desrespeitos, desde que não recorra ao autoritarismo ao tentar impor a sua razão. Se essa moda pegasse, não sobraria quase nada da programação da TV, dos serviços de streaming e canais de YouTube. Há sempre alguém se sentindo ofendido por algum conteúdo. Bem-vindos à pluralidade do mundo.