Reverendo diz à CPI ter sido 'usado' em oferta de vacina
Amilton de Paula foi apontado por representantes da Davati Medical Supply como intermediário de negociação com o governo federal
Em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid nesta terça-feira, 3, o reverendo Amilton Gomes de Paula afirmou que foi usado e enganado na negociação de vacinas contra a covid-19. Ele foi convocado a depor após ser citado como intermediário entre o governo federal e empresa que ofereceu imunizantes sem comprovar a real capacidade de entrega das doses. O reverendo, no entanto, negou que tenha de fato negociado vacinas e se apresentou apenas como um facilitador.
No início de sua fala, o reverendo se apresentou em terceira pessoa, o que confundiu senadores e levou a questionamentos sobre a quem de fato se referia. Fundador da Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah), uma organização não governamental, Gomes de Paula havia sido apontado por representantes da Davati Medical Supply como um "intermediador" entre o governo federal e a empresa, que ofertava 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca.
"Entendemos que fomos usados de forma odiosa para fins espúrios e que desconhecemos", disse o reverendo. Ele relatou que a oferta de vacinas chegou à Senah por meio do policial militar Luiz Paulo Dominghetti Pereira, que teria se apresentado ao religioso como representante da Davati.
Na CPI, Dominghetti citou Amilton de Paula e afirmou que recebeu um pedido de propina para vender as vacinas do ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Dias.
Dominghetti afirmou ter agendado reuniões no Ministério da Saúde com auxílio do reverendo. Já Dias reconheceu ter recebido Amilton para falar sobre uma oferta de doses de vacina, mas negou ter feito qualquer pedido de propina.
O PM teria apresentado ao reverendo, no dia 16 de fevereiro, uma oferta de 400 milhões de vacinas da AstraZeneca para entrega em oito dias. No dia 24, a Senah encaminhou ao Ministério da Saúde um pedido de agenda para intermediar a negociação, de acordo com Gomes de Paula. Durante as conversas, o preço das vacinas passou de US$ 3,50 para US$ 17,50 a unidade, afirmou o reverendo.
Representantes da Davati teriam procurado o reverendo para tentar fechar a negociação com o ministério porque o contrato ainda precisaria de aceno positivo do governo federal. Gomes de Paula relatou que se reuniu com o ex-secretário-executivo da pasta Elcio Franco no dia 12 de março. Na ocasião, de acordo com o depoente, o secretário afirmou que não existia documentação necessária para avançar na negociação. O reverendo disse ter enviado um e-mail em dia 24 de março com uma nova proposta, com valor de US$ 11 a dose do imunizante, mas não houve resposta.
A justificativa de Gomes de Paula para buscar facilitar a compra de vacinas pelo Ministério da Saúde foi a tentativa de proporcionar mais vacinas para o Brasil, uma "iniciativa humanitária"; "O trabalho de mais de 20 anos de uma ONG, uma entidade séria, voltada para ações comunitárias e educacionais, foi jogada na lama, trazendo prejuízo na sua credibilidade".
'Nazismo, não'
Omar Aziz, presidente da comissão, criticou fortemente o encontro do presidente Jair Bolsonaro com a deputada alemã Beatrix von Storch, no Palácio do Planalto. Ela é neta de um ministro de Adolf Hitler e integra o partido Alternativa para a Alemanha, sigla acusada de difundir ideias neonazistas.
O encontro não estava previsto na agenda presidencial e foi registrado em foto. A deputada é investigada pelo serviço de Inteligência alemão por propagar ideias neonazistas, xenofóbicas e extremistas. Na foto, além da parlamentar e de Bolsonaro, também está o marido de Beatrix, Sven von Storch. Aziz disse que, "às escondidas, o presidente recebe uma deputada nazista, afrontando a Constituição brasileira".
"Ninguém abre a boca aqui para falar", disse o presidente da CPI. "Às escondidas, ele apunhala. Quando é para pedir ajuda, ele liga para o primeiro-ministro de Israel."
Aziz disse que o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL) e o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) não podem "permitir isso": "Nazismo, não".