RS: controvérsias ameaçam apoio político de governador
Há menos de 30 dias no cargo e no comando de um Estado endividado, o novo governador do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori (PMDB), vem protagonizando uma série de ações controversas. Desde a campanha, Sartori afirma que o Rio Grande do Sul está “quebrado” e que a recuperação exige cortes drásticos. O governador determinou redução de despesas, suspensão de pagamentos e disse que os servidores teriam suas “cotas de sacrifício”. Porém, na semana passada, sancionou o aumento de seu salário, do vice, de deputados estaduais e Judiciário estadual. O custo total do reajuste: R$ 130 milhões aos cofres públicos este ano.
Bombardeado pela reação da opinião pública, Sartori abriu mão de seu aumento de 45,9% e do vice nesta segunda-feira, argumentando ter ouvido “a voz dos gaúchos” e dizendo que era “uma decisão pessoal”.
Entre lideranças políticas aliadas, a decisão gerou desconforto. Os deputados (governistas e oposição) aprovaram por unanimidade os aumentos em dezembro. “Se era para fazer isso, então que tivesse negociado com a base lá atrás. Não dá para ficar o tempo todo mudando de ideia”, disse um integrante da bancada do PMDB. “Fica parecendo que os deputados, e só eles, têm altos salários. Mas nós não temos todas as despesas pagas (como o governador)”, criticou outro parlamentar da base.
Veja algumas das ações polêmicas dos primeiros 21 dias de José Ivo Sartori no governo
Reestruturação administrativa
Em dezembro, Sartori solicitou o envio ao Legislativo de um projeto de reestruturação administrativa formatado pelo PMDB. A reestruturação, segundo os peemedebistas, geraria até 30% de redução nos gastos de custeio (aqueles vinculados ao funcionamento da estrutura administrativa, e que, em 2014, somaram R$ 6,4 bilhões). Na prática, o projeto modificou nomes de algumas secretarias e fundiu ou extinguiu pastas com baixo orçamento e poucos cargos em comissão (CCs). Entre as secretarias extintas, estava a de Políticas para Mulheres, o que gerou desgaste com movimentos de direitos humanos e os que tratam de questões de gênero.
O governo admitiu não saber qual o impacto das mudanças nas contas do Estado. Até hoje, não divulgou oficialmente um número.
Decreto de corte de despesas
Em 2 de janeiro, Sartori baixou o decreto 52.230, que veda por 180 dias o pagamento de despesas anteriores, contratos de prestação de serviços terceirizados ainda não adjudicados e a celebração ou prorrogação de convênios que impliquem em despesas. O decreto também prevê a obrigatoriedade da readequação da prestação de serviços terceirizados caso não haja disponibilidade orçamentária.
O governador garantiu que áreas essenciais, como saúde, educação e segurança não seriam afetadas. Porém, as "excepcionalidades" precisam ser "plenamente justificadas” e encaminhadas para análise da Junta de Coordenação Orçamentária e Financeira.
Até agora, não há informações de quantas solicitações chegaram à Junta, formada por quatro secretários de Estado e um número não divulgado de técnicos. O secretário estadual da Fazenda, Giovani Feltes, estima que o decreto possa gerar uma economia de R$ 600 milhões em 2015 (o equivalente a 10% dos gastos de custeio), mas não detalha os números.
Em função do decreto, já ocorreram problemas nas áreas da saúde e segurança. Na saúde, o governo precisou rever a suspensão de pagamentos de médicos do IPE Saúde, o plano de saúde dos servidores estaduais. Na segurança, a questão da suspensão do pagamento de horas-extras de bombeiros, que ocasionou até o fechamento de um quartel na região Metropolitana de Porto Alegre.
Nesta terça-feira o subcomandante-geral da Brigada Militar (BM), Paulo Stocker, confirmou que haverá redução de 40% nas horas-extras da corporação, mas disse que o policiamento nas ruas não será afetado.
Aumento dos salários
Em dezembro, a Assembleia Legislativa aprovou diferentes projetos de reajustes nos subsídios das cúpulas do Judiciário, Legislativo e Executivo. Os do Judiciário foram encaminhados pelo próprio Judiciário. O do aumento do subsídio dos deputados, do governador, do vice e dos secretários de Estado foi apresentado pela Mesa Diretora da Assembleia.
Os valores dos aumentos:
Governador: de R$ 17,3 mil para R$ 25,3 mil - aumento de 45,9%
Vice-governador e secretários: de R$ 11,5 mil para R$ 18,9 mil - aumento de 64,2%
Deputados estaduais: de R$ 20 mil para R$ 25,3 mil - aumento de 26,34%
Cúpula do Judiciário: de R$ 25,9 mil para R$ 30,4 mil - aumento de 14,60%
O reajuste da cúpula do Judiciário manteve os salários no teto constitucional. Os deputados estaduais só podem ter reajustes a cada quatro anos. O governador, o vice e os secretários não tinham os subsídios reajustados há oito anos. Sartori sancionou todos os projetos. Ante a repercussão negativa, voltou atrás e abriu mão do próprio aumento. Ele e o vice deverão devolver a diferença todos os meses.
Crise nas finanças
Sartori declara que a situação das finanças é muito pior do que ele pensava, mas não apresenta oficialmente estudos ou levantamentos. Sob a justificativa da crise, secretários já falaram em corte de cargos em comissão, em extinção de estatais e em falta de dinheiro para pagar a folha a partir de março. O secretário da Fazenda, Giovani Feltes, estima que o déficit chegará a R$ 5,5 bilhões em 2015 (cinco vezes o déficit de 2014, que foi de R$ 1,2 bilhão) e promete detalhar até o final do mês como chegou ao dado.
Desde a transição, circula entre aliados um levantamento feito pela consultoria PricewaterhouseCoopers (PwC) para o Movimento Brasil Competitivo (MBC), que tem como presidente fundador o empresário Jorge Gerdau Johannpeter.
Na semana passada, integrantes do governo vazaram que o estudo apontaria déficit de R$ 7,1 bilhões, também sem apresentar as bases utilizadas. A vinculação a uma consultoria privada e os questionamentos sobre como o diagnóstico foi encaminhado desagradaram a outra parte do governo. Ninguém no Executivo quis se manifestar publicamente sobre o número, sob o argumento de que ele não foi encomendado pelo governo e não ‘bate’ com os dados da Fazenda.
No MBC a informação é de que, em função de um acordo com a atual administração estadual, a entidade não pode dar detalhes do levantamento. E, ainda, que o MBC realiza este tipo de diagnóstico previamente em Estados ou prefeituras onde pretende firmar parcerias para melhorar a gestão, que podem ser tanto por contratação direta como por parcerias público-privadas.
Em reação, o PT, que governava o Estado até o mês passado, lançou nota na qual afirma que a crise financeira é uma farsa com objetivo de justificar a venda de estatais lucrativas.