Sem chances de Previdência, Planalto mira reforma tributária
Sem condições políticas de tocar a reforma da Previdência na Câmara antes de resolver a crise causada pela denúncia contra o presidente Michel Temer, o Palácio do Planalto decidiu investir na reforma tributária, que não exige mudanças constitucionais e tem potencial para criar boas notícias para o governo mais rapidamente.
Nos últimos dias, o próprio presidente voltou a falar nas mudanças tributárias. Conversas sobre o tema com os ministros do Planalto, a equipe econômica e diversos parlamentares vêm ocorrendo, ao mesmo tempo que, na segunda-feira, em mais um vídeo distribuído nas redes sociais, Temer afirmou que a reforma tributária será enviada em "brevíssimo tempo" ao Congresso.
"Só vai ter ambiente político para ir para a votação da Previdência com margem depois de passar essa questão da denúncia", disse à Reuters uma fonte palaciana.
Sem ter que passar por mudanças constitucionais, que exigem o voto de 308 dos 513 deputados e 49 dos 81 senadores, as mudanças tributárias são mais fáceis de serem aprovadas pelo Congresso do que voltar a se falar de uma reforma da Previdência que não tinha votos para ser aprovada mesmo antes das denúncias contra o presidente.
O governo insiste que não desistiu da Previdência, mas admite que precisa esperar. É uma forte mudança diante do discurso do Planalto, de que a reforma previdenciária era urgente e absolutamente necessária.
Agora, sem chances com a Previdência, mas entusiasmado com a aprovação da reforma trabalhista, Temer teria decidido tocar a chamada "simplificação tributária" como uma forma de tentar melhorar as condições para a economia engrenar uma retomada do crescimento de forma consistente.
"A gente sabe que é difícil a Previdência agora. Uma reforma desse nível tem que estar tudo muito acertado. É uma avaliação lógica que não tem clima agora", disse o vice-líder do PMDB na Câmara Lúcio Vieira Lima (BA). "Mas as reformas não têm uma ordem, tem reformas. Se o governo avaliar que não tem brecha para a Previdência agora, põe outra, não tem problema."
Uma outra fonte palaciana confirmou que, aproveitando o recesso do Congresso, o governo vai acelerar uma proposta para apresentar na volta ao trabalho dos parlamentares.
Alcance restrito
A reforma, no entanto, deve ter alcance bastante restrito, limitando-se a mudanças nas alíquotas do PIS e da Cofins. Empresas com faturamento acima de um determinado limite teriam uma alíquota maior.
O governo não pretende mexer no ICMS e no ISS, dois dos principais nós do regime tributário brasileiro, com alíquotas que variam nos Estados e municípios, justamente para não criar problemas com governadores e prefeitos em um momento em que a maioria passa por dificuldades financeiras.
"ICMS e ISS ficam mais para frente para não comprar briga com os Estados", confirmou uma fonte palaciana.
Outras mudanças serão menores, de desburocratização de procedimentos.
Líder da maioria na Câmara, o deputado Lelo Coimbra (PMDB-ES), diz que a negociação de mudanças tributárias é uma maneira do governo "buscar um caminho" para melhorar o ambiente econômico, enquanto a crise política não se desfaz.
"Isso fortalece o norte do governo", disse. "A Previdência vamos ver o que se pode fazer, mas é mais adiante. Se conseguirmos aprovar pelo menos três itens é um passo à frente."
Um dos vice-líderes do PSB da Câmara e da ala do partido ligada ao governo, Danilo Forte (CE), afirmou que o presidente pediu sugestões em audiência na segunda-feira no Palácio do Planalto para buscar uma simplificação da legislação tributária.
Questionado a respeito da tramitação da reforma da Previdência, que está no plenário da Câmara parada desde a eclosão da crise que implica Temer, Danilo Forte destacou que o Planalto avançou nas negociações até onde pôde.
O deputado Mauro Pereira (PMDB-RS), que também se reuniu no Planalto com Temer na segunda-feira, confirmou que o governo quer retomar a discussão da reforma tributária.
Existe a possibilidade de que os deputados possam discutir uma proposta que está sendo elaborada pelo deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), que preside uma comissão temática da Câmara que trata do assunto. No entanto, o governo até agora não encampou ainda a proposta de Hauly, considerada mais ampla do que Temer quer ir neste momento.