STF forma maioria para permitir símbolos religiosos em prédios públicos; entenda
Acompanharam o relator do caso, Cristiano Zanin, os ministros Flávio Dino, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, André Mendonça e Edson Fachin
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria no julgamento que avalia a constitucionalidade da presença de símbolos religiosos em prédios públicos pelo País. Sob relatoria do ministro Cristiano Zanin, que votou contra a retirada dos objetos, os ministros Flávio Dino, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, André Mendonça e Edson Fachin também seguiram o relator - o último com ressalvas.
O julgamento, que ocorre em plenário virtual desde o dia 15, vai até esta terça-feira, 26, prazo em que os outros magistrados têm para registrarem seus votos. Os ministros sustentam que, desde que os símbolos religiosos sejam compreendidos como uma manifestação da tradição cultural brasileira, não há violação na Constituição.
Para Zanin, o relator do caso, desde que o objetivo seja "manifestar a tradição cultural da sociedade brasileira", os símbolos - como crucifixos, entre outros - não impõem concepções filosóficas aos cidadãos, não constrangem os crentes a renunciar à sua fé, nem ferem a liberdade de ter ou não ter uma religião.
Portanto, o ministro propõe a seguinte tese geral: "A presença de símbolos religiosos em prédios públicos, pertencentes a qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, desde que tenha o objetivo de manifestar a tradição cultural da sociedade brasileira, não viola os princípios da não discriminação, da laicidade estatal e da impessoalidade."
Único a apresentar divergências do relator, embora tenha acompanhado o voto dele, foi Fachin. "O esforço argumentativo aqui realizado visa não apenas afastar práticas inconstitucionais de exclusão que, não raro, são autorizadas sob a justificativa da laicidade, mas também permitir a afirmação de direitos das minorias religiosas", escreveu o ministro. Ele também citou o voto de Dino, que menciona outras manifestações religiosas como exemplo de tradições culturais - como o Círio de Nazaré e a Festa de Iemanjá - e menciona que as religiões dos povos originários e africanos também estavam presentes na formação do Brasil enquanto nação - mesmo que "oprimidos, perseguidos e silenciados".
Apesar de se concentrar principalmente na influência do cristianismo, especialmente do catolicismo, na formação da sociedade brasileira, Zanin também chegou a citar a jurisprudência da Corte sobre outras crenças. O ministro mencionou que, a fim de resguardar a liberdade religiosa, a lei de proteção animal "permite o sacrifício ritual de animais em cultos de religiões de matriz africana"; e que o País reconhece do direito de Testemunhas de Jeová não se submeterem à transfusão de sangue.
Também acompanhando o relator, Gilmar Mendes questionou em seu voto se será necessário "chegar ao ponto de discutir" a retirada do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, já que a estátua simboliza a cultura cristã no Brasil, ou a mudança nas cédulas de Real, que carregam a expressão "Deus seja louvado".
"Aqui me ocorre uma dúvida interessante: será que precisaremos, em algum momento, chegar ao ponto de discutir a retirada da estátua do Cristo Redentor do Morro do Corcovado por simbolizar a influência cristã em nosso País? Ou a extinção do feriado nacional de nossa padroeira, Nossa Senhora Aparecida? A alteração do nome de Estados e de cidades, porque recebem o nome de santos, como São Paulo e Santa Catarina?", comparou o ministro.
Mendonça, o ministro "terrivelmente evangélico" indicado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL), também sustentou que a laicidade não deve ser confundida com laicismo, ou seja, o Estado deve ser neutro em relação às religiões, mas não hostil a elas.
Entenda o caso
O julgamento avalia um recurso extraordinário movido pelo Ministério Público Federal (MPF), que entrou com uma ação em 2009 para retirar símbolos religiosos visíveis ao público em repartições federais em São Paulo. O argumento do MPF é que a presença desses objetos viola a laicidade do Estado e o princípio da impessoalidade.
O órgão recorreu da decisão de 2013, quando a Justiça Federal julgou o pedido improcedente, decisão mantida em 2018 pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), na capital paulista. Após o esgotamento dos recursos em segunda instância, o MPF apresentou um recurso extraordinário ao STF em abril de 2019. Agora, a decisão da Corte terá peso de repercussão geral, ou seja, será aplicada a ações semelhantes que tramitem em instâncias inferiores da Justiça.