TSE nega pedido de registro do partido de Marina Silva
Justificativa dos ministros foi de que Rede Sustentabilidade não conseguiu assinaturas suficientes
Dona de quase 20 milhões de votos na última eleição para o cargo de presidente da República, em 2010, a ex-senadora Marina Silva viu naufragar nesta quinta-feira o sonho de criar um partido próprio para disputar o pleito do ano que vem. Por 6 votos a 1, os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) rejeitaram o pedido de registro da Rede Sustentabilidade. O principal argumento foi o número de assinaturas abaixo do mínimo exigido por lei.
Ao rejeitar o pedido de criação do partido de Marina Silva, a relatora do processo, ministra Laurita Vaz, afirmou que é “inconciliável” o pedido para que fossem validadas 95 mil assinaturas rejeitadas, pleito de Marina e seus correligionários. Ela explicou que a ex-senadora deveria ter questionado as anulações diretamente nos cartórios.
“É inconciliável o requerimento da requerente de que se procedesse o reconhecimento das assinaturas por presunção”, afirmou a ministra.
Ainda segundo Laurita Vaz, cabia ao partido comprovar a validade das assinaturas e não aos cartórios. “Não há como admitir que a falta de uma oportuna verificação pelo próprio partido das 95 mil assinaturas perante cada cartório esteja suprido nos presentes autos. Isso porque incumbe ao responsável pelos partidos a verificação dos motivos do acolhimento parcial das assinaturas”, completou.
Em uma espécie de afago, a ministra Luciana Lóssio ressaltou o filtro ético diferenciado e a busca da lisura mostrados pela Rede, postura já exaltada no parecer do Ministério Público Eleitoral (MPE). Segundo Lóssio, são esses princípios que devem sempre nortear um partido político. Ainda assim, a ministra votou contra o pedido de registro justificando que a lei exige um requisito objetivo, que é o número mínimo de assinaturas.
“É importante aqui ressaltar o estado de direito. Nós juízes somos obrigados a obedecer a ordem posta. Não há como ir de encontro ao voto da relatora”, disse Luciana Lóssio.
Os ministros João Otávio de Noronha, Henrique Neves, Marco Aurélio Mello e a presidente do TSE, Cármen Lúcia, também rejeitaram o pedido de registro.
“Vergonhoso casuísmo”
O único voto a favor da criação da Rede partiu do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e que foi convocado de última hora para substituir o ministro Dias Toffoli. Mendes relembrou o caso da liminar concedida por ele mesmo e que suspendeu a tramitação de um projeto que inibia a criação de novos partidos.
O texto tentava impedir que parlamentares que mudassem de partido no meio do mandato transferissem para a nova legenda parte do Fundo Partidário e do tempo de propaganda no rádio e na TV da sigla de origem. O projeto, que acabou sendo derrubado após a liminar, foi apelidado de anti Marina Silva.
“Essa votação só não ocorreu, o que seria uma vergonha para esse País, por uma liminar por mim concedida. Vergonhoso casuísmo. O tribunal indeferiu o mandado de segurança. O próprio debate que se travou no tribunal inibiu, envergonhou a desfaçatez dos que queriam aprovar. É preciso contextualizar a discussão que estamos fazendo”, disse o ministro elevando o tom de voz.
Gilmar Mendes também criticou a estrutura da justiça eleitoral, em especial a forma com os cartórios verificam as assinaturas. “Essa contagem de assinaturas e verificação de firma é de um Brasil do passado. Nos obriga a dizer: vamos atualizar essa Justiça e informatizar esses cartórios”, afirmou, destacando ainda que assinaturas de apoio à Rede de pessoas públicas foram rejeitadas.
“A própria mídia já mostrou, casos notórios de fundadores do partido e pessoas nacionalmente conhecidas que tiveram assinaturas invalidadas, o que mostra a precariedade do serviço prestado pelo cartório”, acrescentou.
Questão aritmética
O advogado da Rede e ex-ministro do TSE, Torquato Jardim, rebateu os argumentos ventilados por ministros da Corte de que a rejeição do registro à legenda seria uma questão aritmética. Segundo Jardim, a Rede conseguiu estabelecer diretórios regionais em 16 Estados e coletou mais de 900 mil assinaturas. Para dirimir possíveis dúvidas, a sigla rejeitou, por iniciativa própria, mais de 200 mil que não contavam com dados completos, e disse ter entregado aos cartórios eleitorais mais de 660 mil assinaturas.
Segundo o TSE, apenas 442 mil assinaturas foram consideradas válidas, abaixo portanto das 492 mil exigidas por lei. Porém, de acordo com a Rede, 95 mil assinaturas foram checadas e teriam sido rejeitadas pelos cartórios eleitorais sem qualquer justificativa.
Segundo servidores do TSE, um dos motivos para essa rejeição é o fato de que eleitores que não votaram e não justificaram a ausência na última eleição não constam dos registros eleitorais. Por isso, suas assinaturas não seriam computadas. O advogado da Rede rebateu essa justificativa. “O que a lei exige é eleitor, não eleitor em dia com suas obrigações eleitorais”, afirmou Torquato Jardim.
Morosidade dos cartórios
O advogado também criticou a morosidade da Justiça Eleitoral. Segundo Jardim, 56% dos cartórios não cumpriram o prazo legal de 15 dias para conferir e liberar as assinaturas. “Nesse ambiente, não pode um órgão subverter a estrutura constitucional. É inadmissível que num ambiente de exercício pleno da democracia, possa um Estado restringir um direito em razão de sua má gestão”, disse.
Para o vice-procurador-geral eleitoral, Eugênio Aragão, a acusação de morosidade não tem fundamento. Segundo Aragão, a questão fundamental é que a Rede não conseguiu o número exigido de assinaturas e criticou até a forma como é feita essa coleta, geralmente em lugares públicos onde as pessoas estão distraídas e sequer assinam a ficha de apoiamento da mesma forma que no título de eleitor.
“Não seria razoável exigir que cada assinatura rejeitada fosse motivada. Se já se está a reclamar da morosidade dos cartórios, imagina se cada rejeição tivesse que ser motivada. É questão extremamente complexa. O fato é que todos os partidos que pediram registro aqui no TSE passaram por isso. Aqui se trata com absoluta isonomia a todos os partidos políticos. Não é um demérito à Rede Sustentabilidade”, acrescentou.
Da mesma forma que já havia feito em seu parecer, Eugênio Aragão voltou a instar Marina Silva que não desista de se candidatar nas próximas eleições por causa da rejeição à sua legenda. “Partido não é criado para concorrer a um pleito apenas. Partidos se destinam à formação da vontade política. O Ministério Público faz votos para que isso seja conquistado, fortalecendo a democracia”, disse o procurador.