'Vou tomar, não falsifica', diz filha a investigado por fraude em cartões de vacina da covid-19
Mensagens entre ex-secretário de Duque de Caxias (RJ) e sua filha fazem parte do inquérito que resultou no indiciamento de Bolsonaro
O relatório da Polícia Federal (PF) apontou que João Carlos de Sousa Brecha, ex-secretário de governo de Duque de Caxias (RJ), teria inserido dados falsos nos cartões de vacinação contra o coronavírus. A troca de mensagens entre Brecha e sua filha, destacada pela investigação, corroboram esse envolvimento.
O relatório da Polícia Federal (PF) sobre o esquema de inserção de dados falsos em cartões de vacinação da covid-19, que envolve tanto o ex-presidente Jair Bolsonaro quanto seus aliados, destaca uma troca de mensagens peculiar entre João Carlos de Sousa Brecha, ex-secretário de governo de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, e sua filha. As informações foram divulgadas pela TV Globo e confirmadas pelo Terra.
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Conforme apontado pela PF, Brecha estava encarregado da inserção de dados fraudulentos nos cartões de vacinação. Em uma troca de mensagens datada de 19 de outubro de 2022, a filha do ex-secretário solicitou ao pai que não falsificasse informações em seu cartão de vacinação.
"Papai, eu vou tomar a vacina do Covid segunda dose segunda, não falsifica, por favor", pediu a filha a João Carlos Brecha.
A conversa consta do relatório da PF divulgado nesta terça-feira, 19, após o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), retirar o sigilo do material.
De acordo com a investigação, a filha de João Carlos Brecha se referia à segunda dose da vacina, uma vez que já havia recebido a primeira dose do imunizante contra o coronavírus em junho de 2022, conforme comunicado por ela em um grupo de conversas no aplicativo de mensagens WhatsApp.
Na avaliação da PF, as conversas entre João Carlos Brecha e sua filha são mais uma evidência que corroboram o papel do ex-secretário de Duque de Caxias na execução da inserção de dados fraudulentos de vacinação de várias pessoas sob investigação.
Entenda a investigação
A PF indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no caso que investiga a falsificação do cartão de vacina. Além de Bolsonaro, o ex-ajudante de ordens e tenente-coronel Mauro Cid e o deputado federal Gutemberg Reis (MDB-RJ) foram indiciados. Essa é a primeira das investigações da PF contra Bolsonaro que avança para a fase de indiciamento. Outras 14 pessoas foram indiciadas, entre servidores, médicos e militares, somando o total de 17 pessoas.
O indiciamento aponta os crimes de associação criminosa e inserção de dados falsos em sistema público. O indiciamento é quando o órgão policial conclui que há elementos suficientes de autoria de crimes e encaminha o caso ao Ministério Público, que decidirá se apresenta a denúncia à Justiça ou arquivará o caso.
O colunista do Terra Guilherme Mazieiro procurou a assessoria de Jair Bolsonaro, mas ainda não teve retorno. Pelo Twitter, o ex-secretário de comunicação e advogado de Bolsonaro, Fábio Wajngarten, considerou "lamentável" o vazamento de informações à imprensa.
Durante as investigações da PF, Bolsonaro foi alvo de busca e apreensão e teve celular e equipamentos apreendidos, além de ex-assessores terem sido presos presos, entre eles Mauro Cid.
A operação, batizada de Venire, investigava a inserção de dados fraudulentos de vacinação contra a covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde, que teriam sido usados para garantir a entrada nos Estados Unidos de Bolsonaro e membros do círculo familiar e pessoal do ex-presidente, burlando a exigência de imunização.
Segundo a PF, o nome da operação é uma referência ao princípio Venire contra factum proprium, que em latim significa "ninguém pode comportar-se contra seus próprios atos".
Além da PF, a CGU também investigou o caso de falsificação nos registros de vacina. Em janeiro deste ano, o órgão concluiu que são falsos os registros de imunização contra covid-19 no cartão de Bolsonaro. Segundo a pasta, foram registradas três doses fraudulentas. A primeira delas foi inserida em julho de 2021, por meio da UBS Parque Peruche, em São Paulo. Nesse caso, a CGU, apesar de ter confirmado a fraude, não conseguiu identificar o autor da falsificação, em razão de limitações do Sistema VaciVida, o portal estadual de vacinação de São Paulo.
As demais doses foram registradas nos dias 13 de agosto e 14 de outubro de 2022, em Duque de Caxias (RJ). Os investigadores chegaram a auxiliares do ex-presidente Bolsonaro e servidores do município fluminense que estariam envolvidos em uma esquema de falsificação.