Quais são as principais medidas do governo brasileiro contra o Coronavírus até agora?
Dinheiro extra para a saúde será de R$ 5 a R$ 10 bilhões. Governo também vai capacitar laboratórios para fazer testes do novo coronavírus e aumentará número de profissionais do 'Mais Médicos'.
O governo federal prepara uma série de medidas para combater o alastramento do vírus SARS-CoV-2, popularmente conhecido como "novo coronavírus".
Por enquanto, a principal preocupação do governo é preparar o sistema de saúde do país para um provável aumento no número de casos — inclusive com a liberação de dinheiro extra.
Dirigentes do Ministério da Saúde, no entanto, não descartam a adoção de medidas mais duras de isolamento social, cujo objetivo é tentar frear a propagação da doença.
Até o momento, a única decisão a nível federal deste tipo é uma portaria publicada na última quarta-feira (11), que determina o isolamento, de preferência em domicílio, das pessoas que tenham suspeitas do vírus.
Alguns Estados, no entanto, já tomaram atitudes mais agressivas — como a suspensão gradual das aulas em São Paulo.
As ações do Ministério da Saúde estão descritas em um Plano de Contingência a ser seguido pelo governo federal. Cada Estado também publicou um planejamento parecido.
O número de casos confirmados está sendo atualizado uma vez por dia pelo Ministério, e pode ser checado aqui. No começo deste sábado (14), o número de casos confirmados em todo o país era de 98.
Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Clovis Arns da Cunha, as precauções necessárias variam conforme a cidade onde cada pessoa vive — em São Paulo (SP), faz sentido evitar aglomerações eventos, o que não acontece ainda em Brasília (DF). Por isso, é importante estar atento à evolução do número de casos na sua cidade ou região.
"É como se a epidemia fosse um paciente de UTI. Hoje, ele está bem, mas você me pergunte amanhã", diz. "No Paraná, por exemplo, fechar escolas e universidades ainda não é uma coisa adequada. Mas em São Paulo, sim", diz ele à BBC News Brasil. A suspensão gradativa das aulas foi anunciada pelo governo paulista na última sexta (13).
Arns — que participou da elaboração do planejamento do Ministério da Saúde — diz que a resposta do país até o momento tem sido adequada. A exceção, segundo ele, foi a decisão do governo do Distrito Federal de suspender aulas na capital já na semana passada, quando ainda não ocorria a chamada "transmissão comunitária" da doença.
Todos os casos em Brasília naquele momento eram importados, diz Arns, e o fechamento de escolas só deve ser adotado quando o vírus já está circulando numa certa região.
Segundo Arns, a resposta ao coronavírus pode até ter um lado positivo para o Brasil -- o saldo de educação da população e de preparação do sistema de saúde pode ser benéfico para reduzir os casos de gripe comum, que infectam pessoas e fazem vítimas todos os anos.
Mas afinal, quais são as principais medidas para combater o coronavírus até agora? A lista abaixo traz iniciativas que o próprio Ministério da Saúde inclui entre as mais relevantes no combate à doença.
1. Cancelamento de eventos, manifestações e cruzeiros turísticos
No jargão da Saúde, atitudes como estas são chamadas de "medidas não-farmacológicas": são ações que buscam diminuir a velocidade com a qual o vírus se propaga em um determinado local, ao reduzir o contato social.
O objetivo é evitar a sobrecarga dos serviços de saúde e, segundo o Ministério, estas atitudes podem reduzir em até um terço o número de casos.
As precauções são divididas em três momentos, de acordo com o grau de disseminação da doença.
Vão desde medidas gerais, que já são recomendadas pelo Ministério da Saúde a todo o país desde a última sexta (13); até atitudes que devem ser tomadas quando houver a transmissão comunitária do vírus, recomendadas hoje para São Paulo e Rio.
Neste momento, a principal recomendação do Ministério da Saúde para todo o país é que sejam cancelados ou adiados quaisquer eventos que reúnam grande número de pessoas: jogos de futebol, shows, manifestações.
Cruzeiros turísticos (nacionais e internacionais) também deverão ser cancelados -- além do risco de transmissão entre os viajantes, o atendimento a pacientes no mar é mais difícil. "São ambientes onde as pessoas ficam confinadas, e muitos são turistas internacionais (...)", disse o secretário de Vigilância em Saúde do Ministério, Wanderson Kleber de Oliveira.
Também há recomendações para locais que recebem grande número de pessoas: é preciso disponibilizar locais onde as pessoas possam lavar as mãos; oferecer álcool em gel; e aumentar a frequência na limpeza do chão, do corrimão, de maçanetas, etc.
A segunda etapa é a chamada "transmissão local", quando pessoas passam a contrair o vírus na cidade, sem trazê-lo de fora -- mas a cadeia de quem transmitiu para quem ainda pode ser rastreada.
Nessa situação, recomenda-se a idosos e doentes crônicos que evitem locais como cinemas; shoppings, shows, missas, etc. Eventos em lugares fechados com mais de 100 pessoas também deverão ser cancelados.
2. Em SP e no Rio, home office e suspensão de aulas
Em locais onde já acontece a chamada transmissão comunitária do vírus, como as cidades do Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP), as recomendações passam a ser mais severas. Ao contrário da transmissão local, na transmissão comunitária não é mais possível saber quem transmitiu para quem a doença.
Nestas cidades, o Ministério da Saúde já recomenda desde a última sexta-feira que empresas adotem o teletrabalho (home office); que aulas sejam interrompidas; e que os gestores locais monitorem o ingresso e a saída de pacientes com Covid-19 nas UTIs.
Os moradores destas cidades também são incentivados a cancelar viagens e reuniões que não sejam essenciais.
No momento, ainda não há recomendação de quarentena: esta só será indicada quando a taxa de ocupação dos leitos de UTI destinados ao tratamento da Covid-19 chegar a 80%.
Diferentemente do isolamento, a quarentena é mandatória, e envolve o uso de forças de segurança para evitar a circulação de pessoas.
O Ministério também descarta fazer o controle dos passageiros que viajam dentro do Brasil, inclusive nestas duas cidades.
3. Medida Provisória com pelo menos R$ 5 bilhões adicionais
O governo federal deve enviar nos próximos dias ao Congresso uma medida provisória (MP) liberando cerca de R$ 5 bilhões adicionais a serem usados no combate ao novo coronavírus. A MP entra em vigor no instante em que for publicada no Diário Oficial, mas precisa depois ser aprovada pelo Congresso em até 120 dias -- ou perde a validade.
Segundo o secretário executivo do Ministério da Saúde, João Gabbardo dos Reis, os recursos já faziam parte do orçamento da pasta -- mas eram parte das emendas individuais de deputados e senadores. Agora, este dinheiro será direcionado a ações de combate ao novo coronavírus.
"Nós já temos garantidos R$ 5 (bilhões). O que o ministro Paulo Guedes (Economia) falou, é que pode chegar a R$ 10 (bilhões)", disse Gabardo. "Ele disse que por ele, Paulo Guedes, seria R$ 10 bilhões. Mas até agora, o que foi acordado com o Congresso foi a liberação de R$ 5 bilhões", frisou Gabbardo.
Parte do dinheiro deve ser repassado a cerca de 40 mil unidades básicas de saúde em todo o país. O dinheiro também será usado em ações de vigilância sanitária; para a locação de leitos hospitalares e para a compra de medicamentos e outros materiais.
Uma parcela dos recursos também será empregada pelos hospitais universitários, ligados ao Ministério da Educação (MEC).
4. Reforço no Mais Médicos
Na quinta-feira (12), o Ministério da Saúde publicou um edital para contratar mais 5,8 mil médicos, com a finalidade de reforçar as equipes de saúde.
Serão admitidos médicos formados no Brasil e no exterior, desde que seus diplomas tenham sido revalidados no país -- inclusive médicos cubanos que ainda estejam no país. A remuneração destes profissionais será de cerca de R$ 12 mil mensais, e o contrato durará um ano.
O custo total da medida é estimado em R$ 1,2 bilhão -- que devem sair dos R$ 5 bilhões da medida provisória.
Os profissionais serão distribuídos por 1.864 municípios brasileiros, e a maioria das vagas (44,5%) é para as capitais dos Estados -- onde supõe-se que as dificuldades serão maiores.
5. Capacitação dos laboratórios para testes de SARS-CoV-2
Desde o começo da semana passada, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Ministério da Saúde estão treinando técnicos de laboratórios públicos dos Estados brasileiros para que eles estejam aptos a testar pacientes com suspeitas de infecção pelo novo coronavírus.
Na semana passada, técnicos de oito Estados receberam o treinamento da Fiocruz, no Rio de Janeiro (RJ). O curso inclui recomendações sobre biossegurança e procedimentos para transporte das amostras, entre outros pontos.
O objetivo da Fiocruz é ter treinado técnicos dos 26 Estados brasileiros (e do Distrito Federal) até o fim desta semana.
A Fiocruz também desenvolveu está produzindo os kits que serão usados para fazer a testagem. No fim da semana passada, 20 mil destes kits já estavam prontos.
Algumas redes de laboratórios privados também desenvolveram seus próprios kits para testagem do novo coronavírus -- e já estão aptas a realizar o teste. O objetivo do Ministério da Saúde agora é que os testes feitos na rede privada sejam notificados de forma mais célere -- hoje, esta integração depende das secretarias de saúde de cada município.
6. Mais leitos de UTI e horário estendido em postos de saúde
Também na quinta-feira (12), o governo anunciou a locação de até 2 mil vagas extras em unidades de terapia intensiva (UTIs) -- mil leitos já estavam previstos desde o começo da crise, mas um novo edital foi anunciado no fim da semana passada.
A expectativa do Ministério da Saúde é que estes leitos adicionais sejam pagos com os R$ 5 bilhões a serem liberados pela medida provisória.
Na outra ponta, o ministério tentará ampliar o número de postos de saúde que funcionam durante horário estendido, através de um programa chamado Saúde na Hora. Dos 42 mil postos de saúde do país, apenas 1,5 mil fazem parte do programa hoje, que estende o horário de funcionamento das unidades até as 22h.
Agora, a ideia é que pelo menos mais 5,2 mil postos funcionem em horário estendido. A pasta reservou cerca de R$ 900 milhões para esta iniciativa.
Segundo a pasta, até 90% dos casos de coronavírus poderão ser tratados nestes postos de saúde -- a pessoa pode buscar o serviço quando tiver sintomas iniciais do vírus, como febre baixa, tosse, dor de garganta e coriza.