Revisão de critérios do Fundo Amazônia incomoda Noruega e Alemanha, dizem fontes
O governo do presidente Jair Bolsonaro se deparou com a resistência de Noruega e Alemanha, os dois principais doadores do Fundo Amazônia, em relação aos planos de mudar a gestão do fundo bilionário destinado a reduzir o desmatamento, disseram pessoas familiarizadas com o assunto.
Caso o governo modifique unilateralmente o modelo de gestão do fundo de desenvolvimento sustentável, a medida poderia levar as duas nações europeias a interromper as doações ou até mesmo a resgatar fundos que não foram utilizados, segundo as fontes, que pediram anonimato devido à sensibilidade do assunto.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que é cético quanto às mudanças climáticas, criticou há duas semanas a administração do fundo devido a supostas irregularidades no uso e na liberação dos recursos para ONGs, solicitando a revisão dos critérios de contratação de entidades a serem beneficiadas pelo Fundo Amazônia. Salles suspendeu todas as operações do fundo.
A Noruega e a Alemanha reagiram, alegando que estão satisfeitas com a administração feita pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) do fundo de 1,28 bilhão de dólares, e pediram ao ministro que entregasse suas propostas de alterações por escrito.
"Até a tarde de quinta-feira, não havíamos recebido nenhuma proposta escrita ou relatório de inspeção por parte do BNDES", disse uma porta-voz da embaixada alemã em Brasília à Reuters.
O Ministério do Meio Ambiente não respondeu de imediato a pedidos por comentários.
A Noruega doou 1,2 bilhão de dólares e a Alemanha contribuiu com 68 milhões de dólares, além de um investimento previsto de 100 milhões para o fundo, o qual recebe doações anuais de acordo com o desempenho do Brasil em reduzir o desmatamento.
O desacordo sobre a governança suspendeu dois projetos selecionados no ano passado, um para recuperar a cobertura vegetal na Amazônia e outro para melhorar o acesso ao mercado de produtos florestais das comunidades locais.
Para os doadores, o aspecto mais preocupante é um plano de Salles para mudar a composição do comitê orientador do fundo, composto por 24 integrantes, que seleciona quais projetos serão financiados.
Salles deseja reduzir o papel da sociedade civil e remover a representatividade indígena, o que seria inaceitável para os doadores, segundo uma das fontes.
Ambientalistas brasileiros disseram que as mudanças fazem parte do projeto político do governo no que diz respeito a direcionar recursos para fazendeiros e abrandar as proteções do meio ambiente.
Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima, uma rede de ONGs que discutem as mudanças climáticas, disse que o fundo foi cuidadosamente estruturado sob a gestão do BNDES, quando criado em 2018 para prevenir manipulação política.
"A tentativa de passar a influenciar as decisões do fundo e ter controle sobre as instâncias de governança, em especial o comitê orientador do fundo, visa excluir a sociedade civil para que seja muito mais difícil ter acesso aos recursos", disse Rittl.
"Faz parte de uma agenda, que é maior e que se traduz em um ataque constante ao meio ambiente e um ataque frequente a aqueles que cuidam do meio ambiente", acrescentou.