Secretário de drogas do Brasil desmente tentativa de 'frear' lei uruguaia
“O Brasil respeita a posição uruguaia e obviamente não interferirá nos rumos da política do Uruguai, cujas decisões cabem exclusivamente aos uruguaios.” Dessa maneira, o secretário nacional de Políticas sobre Drogas brasileiro, Vitore Maximiano, desmentiu ao Terra a notícia veiculada pelo jornal uruguaio El País no último sábado de que chegaria a Montevidéu na próxima terça-feira uma “delegação de alto nível” do Brasil com o objetivo de “frear” o projeto uruguaio que determina a regulação estatal da maconha.
O projeto, que já foi aprovado na Câmara dos Deputados, mas que ainda falta passar por votação no Senado, autoriza a criação de clubes de cultivo da cannabis e coloca nas mãos do Estado a produção, o armazenamento e a distribuição da droga.
Segundo o jornal uruguaio, parte da comitiva seria integrada por Maximiano, além do deputado federal Osmar Terra (PMDB-RS). “Achei muito estranha a notícia, pois simplesmente desconheço o assunto”, disse o secretário ao Terra. “Nunca fui convidado nem consultado sobre isso”, afirmou, em relação à sua suposta participação em uma ação para desestimular a votação do projeto uruguaio.
Na noite de domingo, o secretário-geral da Junta Nacional de Drogas do Uruguai, Julio Calzada, também desmentiu a existência de uma comitiva brasileira interessada em desestimular a proposta uruguaia.
Ainda no sábado à noite, e com a repercussão da notícia, que passou a ser reproduzida por vários meios de comunicação uruguaios, incluindo canais de televisão, o deputado Osmar Terra declarou, por meio da sua conta no Twitter, que não viria ao Uruguai em representação “nem do governo nem da Câmara” do Brasil.
Na manhã de domingo, o parlamentar conversou com o Terra e afirmou que sua visita tem por objetivo “debater um tema prioritário para mim como deputado e gestor de saúde pública que fui até três anos atrás”. Terra foi secretário estadual de Saúde do Rio Grande do Sul de 2003 a 2010 e é autor de um projeto de lei sobre drogas aprovado na Câmara dos Deputados. Ele define sua viagem como motivada por uma “preocupação pessoal” e sem representação institucional de nenhuma ordem. “Não represento nem o governo brasileiro, que apoiou meu projeto de lei, nem o Parlamento, embora possa expressar o sentimento da imensa maioria dos 513 deputados brasileiros que votaram na minha proposta.”
Com Osmar Terra, chegam ao Uruguai na terça-feira o presidente do Instituto Crack Nem Pensar e subprocurador do Estado do Rio Grande do Sul, Marcelo Dornelles, e o psiquiatra e pesquisador especialista em dependência química, Sérgio de Paula Ramos.
Terra pediu para ser recebido pela Comissão de Saúde do Senado do Uruguai e teve seu pedido “prontamente atendido” pelo presidente do grupo, o senador colorado Alfredo Solari, segundo conta o parlamentar brasileiro. O partido Colorado faz oposição à coalizão governista Frente Ampla, principal impulsionadora do projeto de estatização da maconha.
“Quero conhecer melhor o que o Parlamento uruguaio está pensando sobre o assunto e compartilhar com ele as informações que possuo. Minha preocupação pessoal, como parlamentar e como agente de saúde pública, é: o que acontecer no Uruguai terá também consequências no Brasil, seja pela nossa proximidade, seja pelas afinidades econômicas e culturais que temos.” O deputado também disse querer “deixar bem claro que nessa visita não há nenhum ineditismo e intenção outra que a de aprofundar o debate sobre o tema das drogas”.
Em reportagem publicada no domingo pelo jornal uruguaio La República, o vice-presidente da Comissão de Saúde do Senado do Uruguai, Luis Gallo, disse que Osmar Terra se apresentou como “uma pessoa preocupada com a questão das drogas e que queria opinar sobre o projeto uruguaio, algo que não me parece cabível, que venha opinar sobre uma lei que não é a do seu país. Pensamos inclusive em recebê-lo informalmente, e não na Comissão de Saúde”. Acrescentou ainda que o deputado brasileiro, depois de enviar uma nota pedindo para ser recebido pelo Senado, mandou outra comunicação, “dois dias depois”, pedindo “que pagassem a passagem de um secretário dele”.
Terra disse que recebeu convite para audiência. "Formalmente recebi um convite para uma audiência pública no Senado uruguaio, aprovada na Comissão de Saúde. O convite foi extensivo ao Sérgio Paula Ramos, com larga experiência na área de dependência química, e ao Marcelo Dornelles, procurador do Estado. Na Câmara de Deputados do Brasil os convites sempre são com as despesas de viagem pagas. Por isso consultei se o Sérgio Paula Ramos, que não é meu assessor, e sim um renomado pesquisador, teria essa possibilidade. Pois tanto eu quanto o Marcelo teríamos como institucionalmente fazê-lo, mas o doutor Sérgio não está vinculado a uma instituição pública", conta Terra. "Foi uma consulta, nada mais, e me foi dito que, devido ao pouco tempo de tramitação do convite, isso não seria possível. O Senado não teria como fazê-lo. E foi encerrado o assunto." Terra se reúne com a comissão de senadores na quarta-feira.