Seis momentos-chave do bloqueio de caminhões que ameaça parar o país
Bloqueio de caminhoneiros começou em resposta a discursos de Bolsonaro no 7 de setembro - e corre o risco de tomar proporção maior, mesmo contra a vontade do presidente.
Passadas as manifestações convocadas pelo presidente Jair Bolsonaro para 7 de setembro, outra série de atos ocupa agora a agenda política do país: um possível bloqueio nacional de estradas liderado por caminhoneiros que dizem apoiar as pautas defendidas por Bolsonaro.
O bloqueio de caminhoneiros começou em resposta aos discursos de Bolsonaro no 7 de setembro - mas corre o risco de tomar proporção maior, mesmo contra a vontade do presidente, que pediu a desmobilização do movimento.
Em menos de 24 horas após os atos, caminhoneiros não ligados a entidades de classe ou a organização de paralisações recentes se mobilizaram para bloquear ou se concentrar em rodovias federais em pelo menos 15 Estados.
Em alguns vídeos compartilhados nas redes sociais, eles dizem estar lutando por pautas defendidas por Bolsonaro em seus discursos no 7 de setembro, que incluem ameaças ao Supremo Tribunal Federal (STF) e à democracia.
Na noite de quarta-feira (09/09), o governo Bolsonaro reagiu aos protestos dos caminhoneiros pedindo que eles se desmobilizassem — já que, segundo o presidente, o bloqueio prejudicaria a economia e o próprio governo.
A fala de Bolsonaro pedindo a desmobilização foi distribuída em áudio por WhatsApp e não foi publicada em nenhum canal do governo ou ligado ao presidente — o que suscitou dúvidas dos caminhoneiros sobre a veracidade da declaração.
O áudio precisou ser confirmado pelo ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, em um vídeo publicado no Twitter.
Uma das vozes mais atuantes foi a do caminhoneiro Marcos Antônio Pereira Gomes, conhecido como Zé Trovão. Gomes é considerado foragido da Justiça, acusado de promover incitação de atos de caráter golpista contra o Congresso e o STF. Ele teria descumprido ordens cautelares do ministro do STF Alexandre de Moraes.
Os vídeos de Zé Trovão — convocando o bloqueio, cobrando um vídeo pessoal de Bolsonaro e pedindo a manutenção das paralisações mesmo após o apelo feito pelo presidente — têm sido os mais compartilhados pelos caminhoneiros.
Há relatos de que caminhoneiros seguem mobilizados e Bolsonaro prometeu agir nesta quinta-feira.
Confira abaixo cinco momentos-chave da mobilização de caminhoneiros por um bloqueio.
1. Atos de 7 setembro
O Brasil passou os últimos dias acompanhando a escalada de tensões com a convocação de Bolsonaro para protestos no dia 7 de setembro. Os atos aconteceram em diversas cidades do Brasil — com discursos de Bolsonaro para apoiadores em Brasília e São Paulo.
O presidente atacou ministros do STF e o sistema eleitoral brasileiro, dizendo que só sai "preso, morto ou com vitória" de Brasília.
O governo esperava mais de um milhão de manifestantes em Brasília e São Paulo, mas a secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo afirma que o ato na Avenida Paulista, considerado o maior do dia, reuniu 125 mil pessoas.
As manifestações transcorreram pacificamente — com exceção de um incidente no dia anterior, quando manifestantes — muitos deles caminhoneiros — invadiram uma área da Esplanada dos Ministérios próximo ao STF que estava sendo isolada por policiais. Os policiais cederam e liberaram o acesso ao local.
2. Caminhoneiros na Esplanada e bloqueios pelo país
Os protestos e as duras falas de Bolsonaro repercutiram fortemente no dia seguinte — quarta-feira (08/09) — dentro e fora do Brasil. Em Brasília, políticos e autoridades passaram o dia discutindo respostas ao presidente.
O presidente do STF, ministro Luiz Fux, alertou Jair Bolsonaro que sua ameaça de descumprir decisões da mais alta corte do Judiciário configuraria crime de responsabilidade e que poderia levar a um processo de impeachment. O presidente da Câmara, o deputado Arthur Lira (PP-AL), que é aliado do Palácio do Planalto, pediu um fim à escalada de tensão entre os poderes e das bravatas.
Enquanto Brasília vivia um dia cheio de reuniões e declarações, caminhoneiros simpatizantes do presidente em todo o país se mobilizavam por aplicativos de celular.
Os caminhoneiros que haviam invadido a Esplanada dos Ministérios no dia anterior ao ato de 7 de setembro se recusaram a sair do local, bloqueando o acesso aos prédios do Congresso Nacional e do STF.
As principais entidades de caminhoneiros e lideranças de paralisações recente haviam se recusado a participar dos atos de 7 de setembro — mas caminhoneiros simpatizantes de Bolsonaro passaram a se organizar em grupos de WhatsApp e Telegram.
Alguns desses caminhoneiros começaram a bloquear estradas em 15 Estados brasileiros, segundo a Polícia Federal: Bahia, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Santa Catarina, Pará, Paraná, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, São Paulo e Tocantins.
Também começou a circular um vídeo do caminhoneiro Marcos Antônio Pereira Gomes, conhecido como Zé Trovão, convocando uma paralisação geral: "Fala povo brasileiro, Zé Trovão por cá. Dia 8 de setembro de 2021, ok? Presta muita atenção: a partir de seis horas da manhã, 9 de setembro de 2021, amanhã, todas as bases brasileiras... fechem tudo, não passa mais nada".
"Somente ambulância, oxigênio e remédio. Acabou. Não passa mais nada. Não passa carro pequeno não passa nada. Estão brincando com a democracia. Estão nos tirando para otário. E ninguém vai passar o resto da vida nas ruas parado não. Nós precisamos resolver o problema do Brasil agora, essa semana. Chegou a hora de mudarmos tudo de uma vez. (...) É pra trancar tudo. (...) Vamos salvar o nosso Brasil."
3. Bolsonaro pede em áudio a desmobilização
À noite, começou a circular um áudio de Bolsonaro pedindo a desmobilização dos caminhoneiros envolvidos em bloqueios.
"Fala para os caminhoneiros aí que são nossos aliados mas esses bloqueios aí atrapalham a nossa economia. Isso provoca desabastecimento, inflação. Prejudica todo mundo e em especial os mais pobres. Então dá um toque nos caras aí se for possível para liberar, para a gente seguir a normalidade", diz Bolsonaro no áudio de WhatsApp, em uma voz baixa com tom aparentemente cansado.
Não está claro para quem Bolsonaro estaria falando no áudio, mas ele parece estar pedindo a alguém que mande seu recado aos caminhoneiros.
"Deixa com a gente em Brasília aqui agora. Não é fácil negociar, conversar por aqui com outras autoridades agora. Não é fácil, mas a gente vai fazer a nossa parte aqui, vamos buscar uma solução para isso, tá okay? E aproveita aí no meu nome e dá um abraço aos caminhoneiros aqui."
Alguns caminhoneiros disseram que não tinham certeza se a voz nos áudios realmente era de Bolsonaro.
Além disso, nenhum vídeo ou áudio foi postado nas redes de Bolsonaro, do governo ou de pessoas ligadas a ele — com a manifestação do presidente se espalhando apenas por WhatsApp.
4. 22h38 de quarta-feira: Tarcísio confirma
Na noite de quarta-feira, começou a circular um vídeo do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, em que ele confirma a autenticidade da fala de Bolsonaro — e diz que o áudio "vazou".
"Olá, 8 de setembro, já passam das dez e trinta e oito da noite, e nos grupos de caminhoneiros muita gente está questionando se um áudio que vazou do presidente da República é real e se esse áudio é atual, é de hoje. Bom, esse áudio é real, é de hoje, e mostra a preocupação do presidente com a paralisação dos caminhoneiros."
Freitas repete o argumento de Bolsonaro de que uma paralisação provocaria inflação, desabastecimento e impactos negativos aos mais pobres.
Assim como o áudio de Bolsonaro, o vídeo de Tarcísio Freitas não foi publicado em canais do ministério.
5. 1h35 da manhã - caminhoneiro ainda questiona
Em seguida outro vídeo de um caminhoneiro conhecido como Zé Trovão — tido como um dos mobilizadores do movimento de bloqueios — também começou a circular.
O vídeo de Zé Trovão parece ter sido gravado depois do vídeo de Tarcísio Freitas confirmando a autenticidade do áudio de Bolsonaro. No entanto, o caminhoneiro não menciona o vídeo de Tarcísio Freitas e ainda questiona a veracidade da gravação de Bolsonaro. Não está claro se Zé Trovão viu o vídeo do ministro ou não.
"Hoje é dia nove de setembro de 2021, são exatamente 1h35 da manhã, tá? Vocês podem ver minha cara de cansado aqui, estamos o dia inteiro lutando", diz Zé Trovão.
"Agora tá rodando nas redes sociais que o presidente da República fez um áudio que vazou pedindo aos caminhoneiros que abrissem, liberassem as pistas e voltassem a trabalhar. Okay. Esse áudio pode ser falso, pode ser verdadeiro, pode ser o que for."
Zé Trovão então se dirige diretamente a Bolsonaro: "Presidente da República, se o senhor realmente quer que nós abrimos (sic) as pistas (...) eu tenho duas coisas para dizer para o senhor. Primeiro, a minha vida hoje está destruída, porque eu estou sendo perseguido politicamente com mandato de prisão (...). Outra coisa: nós queremos que o senhor fale isso para o povo brasileiro. Que faça um vídeo, que fale a data, fale o dia e que o senhor peça a nós caminhoneiros para abrir [as estradas]. Porque aí sim, nós vamos fazer vídeos pedindo para liberar as pistas. Sem isso, presidente, eu não vou fazer."
"Não dá mais para confiar em áudios, em vídeos sem data, sem nada, porque pode ser coisa antiga. O que nós precisamos, é disso."
Ele termina falando para a câmera, mas se dirigindo a Bolsonaro, que está na rua lutando "pelo teu governo, pelo senhor".
6. Manhã de quinta-feira: Zé Trovão fala para 'não afrouxar'
Na quinta-feira, novo vídeo de Zé Trovão voltou a circular. Ele dá "bom dia a todos", constata a data do dia (quinta-feira, dia 9) e fala que a "noite foi longa e cansativa".
Ele pede que os caminhoneiros mantenham o bloqueio das estradas.
"Mas aqui vai ficar o meu recado. Pessoal: não afrouxa não. Segura isso aí. Vamos segurar as pistas. Não é pra afrouxar não. Vamos manter o nosso foco, manter a nossa força. Nós não podemos afrouxar. Se nós afrouxar (sic) agora, nós perdemos o nosso país."
E agora?
O ministro Tarcísio Freitas postou em seu Twitter uma sequência de vídeos mostrando estradas que estavam supostamente bloqueadas com tráfego normalizado.
Mas há relatos de que algumas rodovias e a Esplanada dos Ministérios seguem bloqueadas por caminhoneiros.
Na manhã desta quinta-feira, Bolsonaro disse a apoiadores que se aglomeram na frente do Palácio do Alvorada que pretende se reunir com caminhoneiros "hoje para a gente tomar uma decisão".
Mas ele não especificou com quem exatamente pretende conversar, já que as lideranças tradicionais dos caminhoneiros não participaram dos bloqueios — e Zé Trovão está foragido da Justiça.