STF impede que Lula seja preso até 4 de abril, quando retoma julgamento de habeas corpus
Por 6 votos a 5, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu na noite desta quinta-feira conceder uma liminar ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que ele permaneça em liberdade até pelo menos 4 de abril, quando será retomado o julgamento do habeas corpus preventivo impetrado pela defesa do petista no Supremo.
Na prática, a decisão do STF impede que Lula seja preso mesmo se a 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) rejeitar na próxima segunda-feira os embargos de declaração da defesa do ex-presidente, que questionam pontos da condenação a 12 anos e 1 mês de prisão imposta em janeiro a Lula no caso do tríplex do Guarujá (SP).
Esses embargos são tidos como o último recurso da defesa do ex-presidente para evitar que ele comece a cumprir a pena de prisão em regime fechado imposta pelo TRF-4.
Lula --líder nas pesquisas de intenção de voto ao Palácio do Planalto na eleição de outubro-- ainda corre o risco de ser barrado de concorrer em razão da Lei da Ficha Limpa, embora essa questão não fosse objeto do pedido que começou a ser julgado nesta quinta.
O julgamento havia sido marcado na véspera pela presidente do Supremo, Cármen Lúcia, após forte pressão de defensores de Lula e de advogados criminalistas, que pretendiam colocar em julgamento a revisão do entendimento da corte de iniciar o cumprimento da pena após condenação em segunda instância.
ADIAMENTO
Após usarem praticamente toda a tarde desta quinta discutindo a análise de uma questão preliminar --que poderia inviabilizar a análise do mérito do pedido de habeas corpus--, alguns ministros alegaram ter compromissos pessoais e até mesmo se queixaram de cansaço para pedir o adiamento do julgamento. Marco Aurélio Mello, por exemplo, disse que tinha uma viagem marcada para esta noite.
Foi aí que o advogado Roberto Batochio, que representa Lula, pediu da tribuna a concessão da liminar para evitar que seja expedido um mandado de prisão contra o petista se os embargos forem rejeitados antes do julgamento do mérito do habeas corpus.
O ministro Edson Fachin, relator do habeas corpus, posicionou-se contra o pedido e defendeu o prosseguimento do julgamento, no que foi seguido logo em seguida por Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso.
Contudo, a ministra Rosa Weber abriu a divergência e concordou com a tese da defesa.
"Se suspendermos o julgamento, entendo eu que se deve conceder a ordem", disse a ministra.
Alinharam-se a Rosa os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello. Ficaram vencidos, além de Fachin, Moraes e Barroso, o ministro Luiz Fux e a presidente da corte, Cármen Lúcia.
O julgamento pelo STF não poderá ser retomado antes porque na próxima semana não haverá sessão do plenário do Supremo em razão do feriado de Páscoa.
NEM MAIS, NEM MENOS CIDADÃO
Desafeto declarado de integrantes do PT, Gilmar Mendes defendeu a concessão da liminar. Ele destacou, contudo, que não se está a antecipar o julgamento do mérito do habeas corpus.
"Não deve ser ele (Lula) privilegiado, mas também não deve ser ele perseguido pela condição de ex-presidente. Ele não é mais cidadão, mas também não é menos cidadão", disse.
Ao término da sessão, outro advogado de Lula, o ex-presidente do STF Sepúlveda Pertence, elogiou a decisão do Supremo.
"Na atual circunstância, era o que podia esperar do tribunal", disse ele, que não quis fazer prognósticos sobre o mérito do habeas corpus.
Na saída da sessão, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, disse que o Ministério Público está confiante de que o STF vai manter decisão segundo a qual "não fere princípio da presunção de inocência o início da execução provisória da pena após decisão de tribunal que cumpre o duplo grau de jurisdição".
"Essa decisão da corte é importante para o futuro da persecução penal do Brasil, sobretudo em face de crimes de corrupção, de colarinho branco e crimes praticados pelo crime organizado", disse Dodge, em rápida entrevista coletiva.
PRELIMINAR
Antes de adiar o julgamento do caso, os ministros haviam decidido que era sim possível julgar o mérito do habeas corpus.
Primeiro a votar, Fachin manifestou-se contra a apreciação do mérito do recurso, com o argumento de que o tipo de ação usada pela defesa do ex-presidente não seria a correta.
Moraes, entretanto, abriu a divergência ao considerar que era sim possível apreciar o mérito do habeas corpus. Na sequência, Barroso acompanhou o entendimento de Fachin e Rosa seguiu a divergência. A ministra defendeu que não se pode "prestigiar a forma pela forma".
"Na jurisprudência do plenário, eu que privilegio o princípio da colegialidade, eu conheço deste habeas corpus, ressalvando a minha posição pessoal sobre o tema", disse Rosa, que é apontada como um voto decisivo na análise do mérito do habeas corpus.
A ministra se posicionou no passado contra a possibilidade de início do cumprimento da pena após condenação em segunda instância, mas, após entendimento do Supremo em sentido oposto, tem decidido em outros habeas corpus de acordo com o que definiu a maioria.
Do lado de fora, simpatizantes e contrários a Lula reuniram-se na frente do prédio da corte. A Polícia Militar chegou a fazer um cordão de isolamento entre os dois grupos.
Ainda assim, manifestantes contra Lula tentaram erguer um Pixuleco, boneco inflável com desenho do petista vestido de presidiário, mas a polícia impediu que isso ocorresse e jogou gás para dispersar os manifestantes, sem maiores confrontos.
No início do julgamento, em uma enfática sustentação oral, o advogado Roberto Batochio defendeu a concessão do habeas corpus preventivo para garantir o direito de Lula permanecer em liberdade.
Batochio atacou duramente a possibilidade de prisão do petista na próxima semana, ao citar que há "data marcada" para ocorrer por causa do julgamento dos embargos pelo TRF-4.
"Há uma certa volúpia em encarcerar um ex-presidente da República. Não que o ex-presidente esteja acima da lei, ninguém pode estar acima da lei, mas ninguém pode ser subtraído da sua proteção, da proteção do ordenamento jurídico", disse Batochio, para quem tem havido constrangimento ilegal do petista.