Candidaturas afro-religiosas são reação à violência, diz estudo
Um dos fatores apontados para o baixo número de candidatos de religiões de matriz africana é a resistência histórica dessas comunidades em relação ao engajamento político
O cenário eleitoral brasileiro de 2024 traz à tona uma análise interessante sobre as candidaturas com viés religioso. Dos 463.386 registros de candidaturas, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sinaliza que 8.731 possuem essa característica, um reflexo da diversidade religiosa do país. Um aspecto que chama atenção é que, destas, apenas 3,3% são associadas a crenças de matriz africana, segundo estudo realizado pelo grupo de pesquisa Ginga da Universidade Federal Fluminense (UFF).
A coordenadora do grupo, Ana Paula Mendes Miranda, explica à Agência Brasil que essa análise foi possível através de um levantamento detalhado que cruzou dados do TSE, perfis em redes sociais dos candidatos e informações de sites de notícias. Essa iniciativa não foi apenas para registrar números, mas sim entender o porquê do baixo número de candidaturas afro-religiosas e a violência enfrentada por essas comunidades.
Por que o número de candidaturas afro-religiosas é tão baixo?
Um dos fatores apontados para o baixo número de candidatos de religiões de matriz africana é a resistência histórica dessas comunidades em relação ao engajamento político. Muitos líderes religiosos acreditam que suas práticas devem permanecer isoladas das esferas públicas. No entanto, a crescente violência contra terreiros pode estar impulsionando uma mudança de postura. Candidatos veem a política como um meio de lutar por direitos e proteger suas comunidades.
Quais são as principais questões enfrentadas pelos candidatos de matriz africana?
A violência direcionada a terreiros de umbanda e candomblé tem sido um dos principais motivadores para o aumento de candidaturas de matriz africana. De acordo com dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, houve um aumento significativo nos casos de intolerância religiosa em 2023, com 80% das violações sendo direcionadas a essas religiões. Isso está gerando uma resposta mais ativa por parte dessas comunidades, que buscam representação para garantir a segurança e respeito às suas práticas religiosas.
A representatividade e a identidade nas candidaturas religiosas
Nas eleições de 2024, observou-se uma forte presença de candidaturas afro-religiosas em estados como Bahia, São Paulo e Rio Grande do Sul. Porém, houve também um aumento notável no Rio de Janeiro. As vestimentas e nomes tradicionais como "pai" e "mãe" de santo carregam grande importância, servindo não só como um marcador cultural, mas também como um manifesto político.
- 395 candidatos religiosos no estado do Rio de Janeiro
- 41 se associam a crenças de matriz africana
- Os evangélicos totalizam 88,4% das candidaturas religiosas
Os partidos e o Brasil religioso
Na análise de filiações partidárias, candidatos de religiões de matriz africana mostram uma tendência maior a se relacionarem com partidos progressistas, como o PSOL. Há um predomínio de pautas ligadas aos direitos humanos e à proteção das minorias. Isso contrasta com o cenário evangélico, que tem relação forte com partidos diversos e conservadores.
A ascensão das candidaturas evangélicas está ligada a projetos políticos consolidados, como o da Igreja Universal do Reino de Deus, que busca influenciar tanto o campo religioso quanto o eleitoral. Essa dinâmica sugere que o Brasil poderá se tornar majoritariamente evangélico até 2030, caso continue a atual tendência de crescimento deste grupo religioso.