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Caso Covaxin repete roteiro de compra investigada na Saúde

Dono da Precisa, empresa intermediária na compra de vacina indiana, também é proprietário da Global Medicamentos, que não entregou R$ 19,9 milhões em remédios de alto custo

7 jul 2021 - 09h21
(atualizado às 09h35)
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Pressão de autoridades do Ministério da Saúde, pedido de pagamento antecipado, recusa de servidor da pasta em assinar documentos e ingerência externa fizeram parte do processo de compra da vacina indiana Covaxin em fevereiro deste ano, segundo registrou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, no Senado, em depoimentos e documentos. Mas não foi a primeira vez que isso aconteceu com uma negociação entre a pasta e empresas de Francisco Maximiano, o sócio da Precisa Medicamentos, que intermediou o contrato alvo de investigação agora.

Precisa Medicamentos solicitou à Anvisa autorização para uso emergencial da vacina Covaxin
Precisa Medicamentos solicitou à Anvisa autorização para uso emergencial da vacina Covaxin
Foto: Divulgação/Bharat Biotech / Estadão Conteúdo

Em 2017, uma compra de medicamentos de alto custo contra doenças raras da Global Gestão em Saúde, outra empresa de Maximiano, virou alvo do Ministério Público Federal, que denunciou a firma por participação em um esquema de desvio de recursos públicos. Na ocasião, o Ministério da Saúde pagou a ele R$ 19,9 milhões antecipadamente pelos remédios, que nunca foram entregues.

Em depoimentos a procuradores sobre o caso, servidores da pasta relataram suspeitas envolvendo a aquisição dos remédios. Os pontos em comum com o caso atual são: 1) pedido de pagamento antecipado dos R$ 19,9 milhões à Global; 2) pressão do então chefe Departamento de Logística, Davidson Tolentino, nome ligado ao Centrão, para fazer o pagamento; 3) recusa de um servidor em assinar o pagamento antecipado; 4) a ingerência de Maximiano diretamente a um servidor do Ministério da Saúde, via e-mails; 5) a participação de Thiago Fernandes da Costa, que foi coordenador de Compra por Determinação Judicial da pasta e atualmente é assessor do Departamento de Imunização de Doenças Transmissíveis.

Cinco anos depois, o chefe da área de importação do Ministério da Saúde, Luis Ricardo Miranda, denunciou um roteiro semelhante envolvendo a compra da Covaxin. Em depoimento à CPI da Covid, no último dia 25, o servidor disse ter sofrido "pressões atípicas" de seus superiores para acelerar a compra de 20 milhões de doses da vacina por R$ 1,6 bilhão — entre eles, Robero Ferreira Dias, nome ligado ao Centrão e que, até a semana passada, comandava o Departamento de Logística.

Segundo Luis Ricardo, uma fatura que previa pagamento antecipado chegou a ser enviada ao seu setor, mas ele se recusou a assinar e acionou seu irmão, o deputado Luis Miranda (DEM-DF). Os documentos entregues pelos irmãos Miranda à CPI indicaram ainda a participação de Thiago Fernandes da Costa na compra da Covaxin. Costa é réu na ação por improbidade administrativa pelo pagamento à Global. Hoje líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (Progressistas-PR) foi ministro da Saúde entre 2016 e 2018, quando o negócio com a Global foi fechado.

O envolvimento de Barros é outro ponto de convergência entre os dois casos. À CPI, Luis Miranda disse que levou as suspeitas de corrupção no contrato da Covaxin ao presidente Jair Bolsonaro, em reunião no Palácio da Alvorada no dia 20 de março deste ano. Na ocasião, segundo o parlamentar, Bolsonaro se referiu às denúncias como "mais um rolo" de Barros.

No caso dos medicamentos nunca entregues por Maximiano, o MPF sustenta que o então ministro atuou pessoalmente para a liberação do pagamento. A pressão foi relatada por Victor Lahud, servidor do Ministério da Saúde que chefiava a Coordenação de Execução Orçamentária e Financeira.

Segundo Lahud, Toletino, então diretor do Departamento de Logística indicado pelo Progressistas, partido de Barros, solicitou, mais de uma vez, que fosse feito um pagamento antecipado de R$ 19,9 milhões para a Global. O fluxo normal é que este tipo de pagamento ocorra após o recebimento do produto.

Lahud declarou, em depoimento no inquérito, também ter "recebido alguns e-mails de Francisco Maximiano, sócio da empresa Global". Na ocasião, respondeu que o pagamento antecipado dependia de uma série de requisitos que não haviam sido cumpridos.

O servidor relatou que recebeu telefonema do gabinete do Departamento de Logística, no dia seguinte ao e-mail de Maximiano, cobrando o pagamento antecipado à Global. Ele citou o nome de Alexandre Lages, então diretor substituto do Departamento de Logística.

"As cobranças partiam do Sr. Alexandre Lages, bem como de outras pessoas ligadas ao gabinete, alegando sempre que o diretor (Tolentino) e o próprio ministro (Barros) estavam cobrando; que todos os telefonemas sempre mencionavam o nome do ministro, como forma de pressionar à providência", apontou o depoimento.

Ao MPF, Lahud disse não ter assinado a ordem bancária de pagamento antecipado. Segundo o servidor, o documento deveria ser validado pelo gestor financeiro, que seria ele, e pelo ordenador de despesas, que seria o diretor de Logística.

"Como o declarante se recusou a pagar, a ordem foi assinada pelo DLOG (Tolentino) e pelo Sr. Alexandre Lages, que assinou como gestor financeiro; que, para se resguardar de qualquer responsabilidade, o declarante relatou a situação por e-mail ao DLOG e sugeriu, inclusive, a submissão dos autos à CONJUR (Consultoria Jurídica do Ministério da Saúde)", relatou Lahud no depoimento.

Apesar dos pontos em comum entre os dois casos investigados, servidores da pasta que lidam diretamente com licitações consultados pelo Estadão apontam algumas diferenças. No contrato da Global, havia uma decisão judicial que determinava a compra dos medicamentos, o que foi usado como justificativa pelos gestores da época para autorizar o pagamento antecipado. Já no caso da Covaxin, havia uma demanda emergencial para a compra, em modalidade criada por lei específica e, até o momento, não houve pagamento.

Procurado, o ex-diretor Davidson Tolentino não se manifestou, assim como o empresário Francisco Maximiano, proprietário da Global e da Precisa. A reportagem não localizou a defesa de Alexandre Lages. Ele chegou a ser subsecretário de logística em Saúde do Governo do Distrito Federal. Acabou exonerado após apenas cinco meses, ainda em 2019.

A defesa de Thiago Fernandes da Costa informou que quando o servidor entrou no Ministério da Saúde, os fatos narrados pelo Ministério Público Federal na ação sobre o caso da Global já haviam ocorrido. Os advogados responsáveis alegaram que ele não participou das supostas irregularidades.

Estadão
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