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Entenda as mudanças na legislação para a saída temporária de presos

O Comprova não encontrou registros de saídas temporárias de Natal anteriores ao dia 18, como consta na mensagem que circula nas redes

13 dez 2024 - 15h49
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Resumo
CONTEXTUALIZANDO - Publicações alarmistas nas redes sociais afirmam que até 50 mil detentos deverão deixar a prisão até o dia 18 de dezembro. Elas alegam que isso seria um aviso de todas as polícias e delegados presentes numa reunião do Conseg e pedem aos usuários que repassem a mensagem aos parentes e amigos. O Comprova mostra o que a legislação diz sobre as saídas temporárias de presos.
Foto: Reprodução/Projeto Comprova

Conteúdo analisado: Mensagem com um alerta de que a “última saidinha” temporária de presos vai acontecer “a partir de hoje até o dia 18”. O texto diz “que tem 50 mil presos saindo da prisão”, que o alerta foi “um aviso de todas as polícias e delegados na reunião da Conseg de ontem”, e conclui: “Isso afeta a capital e interior também. Repassem aos parentes e amigos”.

Onde foi publicado: X, Instagram, Threads, Facebook e WhatsApp.

Contextualizando: Em tom de alarme, diversas publicações nas redes sociais alegam que 50 mil presos deverão deixar a prisão por conta do benefício de saída temporária até o dia 18 de dezembro. O Comprova contextualiza o assunto mostrando o que diz a legislação sobre o tema.

A Lei 14.843, de 11 de abril de 2024, restringiu a saída temporária somente a presos que estejam cursando supletivo profissionalizante, ensino médio ou superior e define condições para o benefício. No entanto, presos que começaram a cumprir pena anteriormente não são alcançados pela norma e podem, cumpridos os pré-requisitos, ter saída temporária autorizada no Natal.

Segundo o advogado criminalista Henrique Attuch, consultado pelo Comprova, não há como estabelecer com antecedência um número de presos que receberão o benefício, pois ele não é concedido automaticamente, sendo necessária a avaliação dos critérios estabelecidos na Lei de Execução Penal, caso a caso.

Em resposta ao Comprova, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), estado com a maior população carcerária do país, confirma que ainda não há definição de quantos detentos terão direito à saída temporária no Natal. “Os juízes avaliarão caso a caso, frente à alteração legislativa. Não é possível adiantar futuras decisões, porque a concessão dos benefícios segue alguns requisitos que serão verificados pelos magistrados no momento oportuno, assim como serão analisados os reflexos da lei para cada sentenciado”, esclarece o TJ-TJ.

No Natal de 2023, segundo levantamento do G1, a saída temporária beneficiou pouco mais de 52 mil presos no país. Desses, 49 mil (95%) retornaram à prisão no período estipulado.

Calendários definidos por estados para a saída temporária de Natal e notícias do benefício concedido, no ano passado, em outras unidades da federação mostram que elas acontecem às vésperas do feriado, e não até o dia 18, como alegam as postagens nas redes sociais.

O que diz a Lei de Execução Penal e quem tem direito à saída temporária?

A Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal), sancionada em 1984, estabeleceu as bases do sistema penitenciário brasileiro, incluindo as regras para a concessão de saídas temporárias. Ela foi modificada este ano pela Lei 14.843, de 11 de abril, para restringir a saída temporária de presos apenas aos casos em que o apenado esteja cursando supletivo profissionalizante, ensino médio ou superior. Apesar de, na prática, a lei extinguir a liberação temporária em feriados e datas comemorativas, ela não alcança presos condenados anteriormente à sua vigência. Segundo jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribunal de Justiça (STJ), “as normas mais gravosas não podem retroagir para prejudicar o executado”.

Mantêm, portanto, o direito ao benefício os presos que estão no regime semiaberto e já cumpriram, no mínimo, um sexto da pena total, se forem réus primários, e um quarto, se forem reincidentes. Além disso, eles devem manter uma boa conduta dentro do sistema penitenciário e não podem ter sido condenados por praticar crime hediondo ou com violência, ou grave ameaça contra pessoa.

Há um calendário para a saída de presos?

Henrique Attuch explica que o calendário para a saída temporária de presos é definido por alguns estados, o que acaba ficando a cargo das unidades prisionais ou dos juízes da execução. Em São Paulo, por exemplo, a Portaria nº 2/2019 define que a saída no Natal deve ocorrer entre o dia 23 de dezembro e 3 de janeiro do ano seguinte. No Distrito Federal, do dia 23 ao dia 27 de dezembro. No Maranhão, entre 20 e 26 de dezembro. No fim de 2023, a saída de Natal no Rio de Janeiro foi do dia 24 ao dia 30 de dezembro. Já em Minas Gerais, há registros de saídas entre 18 de dezembro de 2023 e 1º de janeiro de 2024.

O Comprova não encontrou registros de saídas temporárias de Natal anteriores ao dia 18, como consta na mensagem que circula nas redes sociais.

Qual é o percentual de evasão após saída temporária?

A mensagem diz que muitos detentos não vão voltar para a prisão. O não retorno de presos que recebem o benefício da saída temporária é uma realidade, porém dados recentes mostram que os percentuais são baixos.

Segundo o Relatório de Informações Penais (Relipen), que reúne os dados fornecidos pelas Secretarias de Administração Prisional de todos os Estados, do Distrito Federal e do Sistema Penitenciário Federal, o total de saídas temporárias entre janeiro e junho, em presídios masculinos e femininos, foi de 173.577 em todo o país. Minas Gerais e São Paulo foram os estados com mais saídas temporárias, 66.246 e 64.410, respectivamente.

Os dados apontam que o total de abandonos foi de 6.055, ou 3,4% do total, sendo o Estado de São Paulo como primeiro no ranking, com 2.591 presos que não retornaram, seguido de Minas Gerais, com 723, e Santa Catarina, com 631.

Já em relação ao Natal do ano passado, levantamento do g1 mostrou que 95% dos presos que tiveram direito à saída temporária no país voltaram para a cadeia no período estipulado.

O que são os Consegs?

A sigla Conseg se refere a Conselhos Comunitários de Segurança, grupos formados por membros da sociedade civil e da área de segurança pública nos bairros e municípios para discutir temas locais. Há exemplos em São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Curitiba. É enganosa, portanto, a referência que as mensagens postadas nas redes sociais – e que deram origem a este Contextualizando – fazem a uma suposta reunião do Conseg cujo resultado afetaria capital e interior.

Fontes consultadas: O Comprova consultou a Lei de Execução Penal e a Lei 14.843/2024, que a alterou, e sua tramitação no Congresso Nacional. Consultou o advogado criminalista Henrique Attuch, fez buscas sobre calendários de saídas temporárias nos estados e jurisprudência sobre o tema. A equipe ainda fez contato com a Secretaria Nacional de Políticas Pens (Senappen), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e os tribunais de Justiça de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, estados com a maior população carcerária, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024. Somente a Senappen e o TJ-SP responderam, com os dados de saídas temporárias nos estados compilados pelo Relipen.

Por que o Comprova contextualizou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está sendo descontextualizado, o Comprova coloca o assunto em contexto. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: O UOL Confere e o Boatos.org concluíram que a mensagem que circula nas redes sociais é falsa. Em junho deste ano, a AFP mostrou ser enganosa uma mensagem com texto similar. O Comprova já esclareceu também que o auxílio-reclusão é garantido por lei desde 1960 e seu valor é equiparado ao salário mínimo, que prisão de Putin em possível vinda ao Brasil depende do Judiciário e não de Lula e que projeto de lei não prevê prisão para quem se recusar a tomar vacina contra a covid-19.

* Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada e mantida pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros --incluindo o Terra-- para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais.

Fonte: Redação Terra
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