IBGE não maquiou taxa de desemprego; critério é o mesmo usado desde 2012
CONTA EXCLUI QUEM ESTÁ DESOCUPADO, MAS NÃO PROCURA EMPREGO; DOS BENEFICIÁRIOS DO BOLSA FAMÍLIA, 13,4 MILHÕES TRABALHAM
O que estão compartilhando: texto afirma que há desconfiança a respeito dos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre a taxa de desemprego e alega que a taxa real de desempregados seria de 40,9%, e não de 6,8%. No cálculo dos 40,9%, estariam incluídos 37 milhões de desempregados do Bolsa Família e 5 milhões de jovens adultos "nem-nem", que não trabalham nem estudam. O texto analisado sugere que os números estariam sendo manipulados para favorecer o governo atual.
O Estadão Verifica apurou e concluiu que: é enganoso. A taxa de desemprego do IBGE é calculada na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. A metodologia considera em situação de desemprego aqueles que tentaram e não conseguiram encontrar trabalho no período analisado. Os que não estão empregados, mas não buscaram vaga, são considerados fora da força de trabalho e não entram no cálculo.
Essa metodologia foi definida e recomendada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), e é aplicada pelo IBGE desde o início da Pnad, em 2012. O modelo de cálculo, portanto, antecede em mais de uma década o atual governo. O dado mais recente da Pnad Contínua mostra taxa de desemprego de 6,2%, o menor patamar da série histórica.
O número citado como de "desempregados" do Bolsa Família não é verdadeiro. Atualmente, há 32,6 milhões de beneficiários do Bolsa Família com mais de 15 anos - a Pnad Contínua considera aptos a trabalhar aqueles acima de 14 anos. Porém, existem 13,4 milhões de beneficiários que trabalham, com ou sem carteira assinada. Não é requisito estar desempregado para receber o auxílio.
O Verifica entrou em contato com o site que publicou o texto com dados enganosos e com um dos perfis no Instagram que reproduziram as mesmas informações.
Saiba mais: A Pnad Contínua do IBGE é a principal pesquisa sobre a força de trabalho no Brasil. Um dos seus indicadores é a taxa de desemprego. O dado atual, divulgado em 29 de novembro, é de 6,2% no trimestre encerrado em outubro, o menor patamar desde o início da série histórica da pesquisa, iniciada em 2012. A taxa equivale a 6,8 milhões de pessoas desocupadas. O dado utilizado no blog, reproduzido na postagem, é anterior, e se refere ao trimestre encerrado em julho.
Postagem engana ao comparar número de carteiras assinadas a beneficiários do Bolsa Família
Postagem engana ao comparar número de carteiras assinadas a beneficiários do Bolsa Família
Postagem engana ao associar Bolsa Família a artigo de 1966 sobre sobrecarga do bem-estar social
No site da OIT, consta que o critério para classificar desemprego foi definido em 1982, na 13ª Conferência Internacional de Estatísticos do Trabalho (ICLS, sigla é inglês). O encontro ocorre a cada cinco anos e serve de meio para estabelecer as normas de estatísticas do trabalho. No relatório da 13ª ICLS consta (página 17, item 95) que o comitê concluiu que a definição de desemprego deve se basear em três critérios: pessoas sem emprego, disponíveis para trabalhar e que procuram emprego - exatamente os critérios adotados pela Pnad Contínua do IBGE.
Em outro documento, intitulado "Guia rápido para interpretar a taxa de desemprego", a OIT reforça a importância de usar simultaneamente os três critérios para definir a pessoa em situação de desemprego. "A flexibilização de qualquer um desses critérios resulta em uma distorção considerável das estatísticas, dificultando significativamente o valor analítico do indicador, a comparabilidade internacional e a análise de tendências", afirma a OIT na página 6.
Taxa de desemprego não faz distinção de beneficiários de programas sociais
Segundo o IBGE, o recebimento de algum benefício de programas sociais como o Bolsa Família não tem relação direta com o cálculo da taxa de desemprego. "Esses beneficiários, por exemplo, podem ser classificados como parte da força de trabalho (como ocupados ou desocupados) ou estarem fora da força de trabalho", diz o órgão em texto em seu site.
O texto exemplifica: "Pode ocorrer também de beneficiários do programa bolsa família ou do BPC não estarem trabalhando e nem terem tomado providências para conseguir trabalho, dessa forma, serão classificados também como "fora da força de trabalho".
Por outro lado, uma pessoa pode estar trabalhando e ainda assim receber o Bolsa Família, basta que sua faixa de rendimentos a torne elegível para ser incluída no programa. "Esse deve ser o caso de muitos trabalhadores por conta própria, por exemplo", disse o IGBE por e-mail, acrescentando que o questionário da Pnad Contínua, que é aplicado a moradores de 211 mil domicílios em 3,5 mil municípios, não inclui perguntas sobre benefícios sociais.
Desemprego não é critério para o Bolsa Família
Como o Estadão Verifica já mostrou, estar desempregado não é critério para estar elegível para o Bolsa Família, mas sim a faixa de renda familiar, que deve ser de, no máximo, R$ 218 por mês por pessoa. Mas há uma exceção em caso de aumento de renda familiar por indivíduo que não ultrapasse meio salário mínimo (R$ 706). Em julho de 2023, foi criada pelo governo a Regra de Proteção, que garante o pagamento do auxílio mesmo quando há o aumento de renda, o que pode acontecer por meio de uma colocação profissional. Na Regra de Proteção, 50% do valor do Bolsa Família ao qual a família teria direito continua sendo pago, por um período de até 24 meses. O valor médio do benefício é de R$ 678,36. Neste mês, cerca de 2,74 milhões de famílias que estão na regra de proteção recebem, em média, R$ 370,33.
Segundo o "Estudo sobre contratação de trabalhadores beneficiários de programas sociais", da Fundação Getulio Vargas (FGV), entre janeiro e setembro de 2024, das cerca de 2 milhões de vagas de trabalho criadas no mercado formal do País, 54,4% foram ocupadas por beneficiários do Bolsa Família. Já no período entre janeiro de 2023 e setembro de 2024, do total de 4,4 milhões de novos empregos, 71% foram ocupados por beneficiários do auxílio. O estudo analisou o perfil das contratações no Brasil considerando empresas registradas no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
De acordo com o painel Observatório do Cadastro Único, há 13,4 milhões de beneficiários do Bolsa Família que trabalham, com ou sem carteira assinada. Os dados podem ser visualizados ao selecionar os filtros "Benefícios sociais" e "Trabalho". Atualmente, segundo o informe mais recente do Bolsa Família (17 de dezembro), há 54,3 milhões de pessoas de famílias beneficiárias. Destas, 21,7 milhões estão na faixa entre 0 e 15 anos de idade.