O que é lei Magnistsky? Ela poderia ser aplicada contra Alexandre de Moraes? Entenda
PUBLICAÇÕES SUGEREM QUE UMA SUPOSTA SANÇÃO DO PRESIDENTE DONALD TRUMP BLOQUEARIA AUTOMATICAMENTE AS CONTAS DE ALEXANDRE DE MORAES
A Lei Magnitsky é um dispositivo da legislação americana que permite que os Estados Unidos imponham sanções econômicas a acusados de corrupção ou graves violações de direitos humanos. Nas redes sociais, críticos do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes argumentam que a lei deveria ser usada contra ele nos Estados Unidos.
No entanto, especialistas consultados pelo Verifica questionam se a medida poderia ser aplicada contra o ministro, já que o processo requer a apresentação de provas robustas de condutas ilegais. Entenda mais sobre o tema abaixo.
O que é a lei Magnitsky?
Aprovada durante o governo de Barack Obama, em 2012, a lei prevê sanções como o bloqueio de contas bancárias e de bens em solo norte-americano, além da proibição de entrada no país.
A legislação foi criada após a morte de Sergei Magnitsky, advogado russo que denunciou um esquema de corrupção envolvendo autoridades de seu país e morreu em uma prisão de Moscou, em 2009. Inicialmente, a lei tinha como foco punir os responsáveis por sua morte.
Porém, em 2016, uma emenda ampliou seu alcance, permitindo que qualquer pessoa envolvida em corrupção ou abusos contra os direitos humanos pudesse ser incluída na lista de sanções.
Quem pode ser punido pela lei?
Para que sanções sejam aplicadas contra indivíduos estrangeiros, o presidente dos Estados Unidos deve apresentar provas confiáveis de infrações, incluindo execuções extrajudiciais, tortura e outras violações graves dos direitos humanos. Essas medidas podem ser impostas a agentes que reprimem denúncias de corrupção, cerceiam liberdades fundamentais ou atuam contra eleições democráticas.
Funcionários de governos e seus associados podem ser sancionados caso estejam envolvidos em esquemas de corrupção significativa, como desvio de recursos públicos, suborno e lavagem de dinheiro. A lei também prevê punições para quem financiar ou apoiar materialmente essas atividades ilícitas, garantindo que os responsáveis sejam impedidos de movimentar bens e acessar o sistema financeiro dos EUA.
Os alvos da Lei Magnitsky são incluídos na lista de Cidadãos Especialmente Designados e Pessoas Bloqueadas (SDN list) do Agência de Controle de Ativos Estrangeiros dos EUA (OFAC, na sigla em inglês).
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Quais são as sanções previstas?
Quem entra na lista pode enfrentar bloqueio de bens e contas bancárias no país, além de ter o visto cancelado e ser proibido de entrar nos EUA. Essas medidas são usadas contra pessoas, empresas ou organizações envolvidas em crimes financeiros ou violações de direitos humanos.
Para sair da lista, é preciso provar que não teve ligação com as atividades ilegais que levaram à punição, que já respondeu na Justiça por isso ou que mudou de comportamento de forma significativa.
Em alguns casos, as sanções podem ser retiradas se o governo americano entender que isso é importante para a segurança do país. O presidente deve avisar o Congresso com pelo menos 15 dias de antecedência antes de tomar essa decisão.
Quem decide quem é punido?
A decisão é do presidente dos Estados Unidos. Segundo o texto da lei Magnistksy, Donald Trump precisaria apresentar provas ao Congresso americano das supostas violações de direitos humanos. Vale lembrar que o republicano tem maioria nas duas casas legislativas americanas.
A advogada Eveline Brigido, especialista em Direito Internacional, proteção, planejamento patrimonial e sucessório, explica que o processo também envolve os Departamentos de Estado e de Tesouro dos Estados Unidos.
"Precisa ter um processo para coletar provas 'robustas', mas, não é um processo judicial, então a imparcialidade pode ser sim questionada. De qualquer forma, é preciso ter as provas, ainda que não judiciais, para a condenação", afirmou.
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Doutora em Direito Internacional pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Elizabeth Goraieb destaca que não é possível sancionar uma pessoa antes da conclusão de uma investigação minuciosa, conduzida por diversos órgãos do governo norte-americano.
No entanto, ela também aponta a "estranheza" da ausência de participação do Poder Judiciário nesse processo.
"Ocorre que se trata de uma questão de soberania, pois acontece dentro dos limites do território americano. Se, por acaso, o estrangeiro for preso lá, então seria instaurado um processo contra ele, ou seja, ele seria julgado pelo crime cometido, como, por exemplo, lavagem de dinheiro", explicou.
O bloqueio de contas é automático? Vale fora dos EUA?
O STF informou ao Verifica que o ministro nunca teve bens nos EUA. A advogada Eveline afirma que, mesmo que Moraes fosse sancionado pela Lei Magnitsky, não haveria um bloqueio automático de suas contas bancárias ou bens fora do país norte-americano.
Ela explica que decisões externas não se aplicam automaticamente em outros países. Para que uma legislação tenha efeito internacional, seria necessário um tratado ou acordo diplomático entre os governos envolvidos.
"De forma alguma haveria sanções automáticas ou bloqueio de contas bancárias fora dos Estados Unidos, justamente por conta da soberania nacional", explicou.
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Segundo ela, uma possibilidade seria a adoção voluntária dessas sanções por instituições financeiras americanas que operam no exterior, mas que mantêm sua sede nos EUA e seguem a legislação do país.
Elizabeth aponta outra possibilidade em caso de sanção a Alexandre. Segundo ela, se uma instituição financeira estrangeira também atuar nos Estados Unidos, o bloqueio de bens do ministro seria viável fora do país norte-americano.
"Se incluído na lista de sanções, Moraes enfrentaria o bloqueio de bens em qualquer instituição financeira com exposição ao sistema americano - o que abrange grande parte do sistema financeiro global - além da proibição de entrada nos EUA, afetando sua mobilidade e suas finanças pessoais", apontou.
Quais seriam as consequências da inclusão na lista Magnitsky?
Eveline comentou que uma sanção a Moraes não impactaria em nada na legitimidade dos casos analisados pelo juiz na Suprema Corte brasileira, por questões de soberania nacional.
O professor de Relações Internacionais Rodrigo Amaral, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), afirmou que uma sanção contra Moraes seria uma politização da Lei Magnitsky, com o objetivo apenas de constranger o ministro. Para ele, não haveria interferência direta nos assuntos internos do Brasil.
"Na minha visão, trata-se da instrumentalização de uma lei americana para atingir uma figura política brasileira", disse. "Mesmo sendo do Judiciário, Alexandre de Moraes assumiu um papel de protagonismo em temas que envolvem as Big Techs, como o Twitter, o que o coloca nesse cenário".
