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Vídeo enganoso acusa Ibama de cometer crime ambiental ao lutar contra incêndios no Parque do Xingu

BRIGADISTAS USAM TÉCNICA CONHECIDA COMO 'QUEIMA PRESCRITA', FEITA APÓS O PERÍODO DE CHUVAS PARA EVITAR INCÊNDIOS FLORESTAIS NA SECA

28 jun 2024 - 15h40
(atualizado em 9/7/2024 às 10h34)
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O que estão compartilhando: que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) está cometendo crime ambiental ao contratar brigadistas indígenas para atear fogo ao Parque Indígena do Xingu.

Card indígenas denunciam Ibama
Card indígenas denunciam Ibama
Foto: Reprodução/Facebook / Estadão

O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. Os brigadistas do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (PrevFogo/Ibama) fazem a "queima prescrita". Essa é uma técnica prevista no Manejo Integrado do Fogo (MIF) usada em campos ou savanas para prevenir incêndios florestais, assim como os aceiros - faixas onde a vegetação é completamente suprimida para evitar que o fogo se alastre para uma área florestal.

"Basicamente, a técnica consiste em usar o fogo no final do período de chuvas para queimar o excesso de combustível (matéria orgânica morta/seca) e assim evitar a ocorrência de grandes incêndios florestais durante a estiagem", diz o Ibama, em nota. O instituto acrescenta que a queima prescrita cria um "fogo suave, que não provoca a morte de plantas ou animais".

Ainda de acordo com o órgão federal, os brigadistas responsáveis por fazer essa queima prescrita são indígenas e atuam em seus próprios territórios. A prática ocorre com a anuência de lideranças indígenas e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

A influencer indígena Ysani Kalapalo, autora do vídeo, foi procurada pelo Estadão Verifica, mas não respondeu até a publicação desta checagem. Em outro vídeo postado em sua conta pessoal no Instagram, Ysani criticou lideranças do Xingu que autorizam a queima prescrita. Disse que a prática acaba com ervas medicinais usadas pela aldeia.

Saiba mais: O vídeo foi gravado em 18 de junho de 2024. Ao menos três indígenas da etnia Kalapalo, que vivem no Parque Indígena do Xingu, interceptaram equipes da PrevFogo/Ibama. Os brigadistas faziam no local a chamada "queima prescrita", um fogo controlado feito no final do período de chuvas que visa reduzir o excesso de combustível - matéria orgânica morta/seca - para evitar a ocorrência de incêndios florestais no período da seca.

"É o uso do 'fogo bom' para evitar o 'fogo ruim'. A técnica é usada apenas em áreas de campos ou savanas, e não em áreas de floresta. Trata-se de um fogo suave, que não provoca a morte de plantas ou animais. A fumaça costuma ser mais branca, devido à umidade, e a vegetação rebrota logo em seguida", disse o Ibama, em nota.

Segundo o órgão, a técnica faz parte do Manejo Integrado do Fogo e requer treinamento e conhecimento da região onde será aplicada. No caso do Parque Indígena do Xingu, ela é feita por brigadistas indígenas, que atuam em seus próprios territórios. Neste mês de junho, o PrevFogo/Ibama iniciou a contratação de 1.803 brigadistas, sendo 132 especificamente para fazer as queimas prescritas.

Prática conta com apoio de 13 lideranças indígenas do Xingu

De acordo com o Ibama, a prática conhecida como queima prescrita conta com a anuência de lideranças indígenas e da Funai. Uma nota assinada por 13 lideranças vinculadas à Associação Terra Indígena Xingu (ATIX) confirma a declaração do Ibama. O grupo, formado pelas principais lideranças que compõem a governança do Território Indígena do Xingu (TIX), reafirmou o apoio às ações do PrevFogo e declarou que não compactua com o ato de violência registrado no vídeo.

"Hoje, entendemos e sentimos na pele os efeitos das mudanças do clima que está afetando nosso modo de viver e da nossa forma de relação com a natureza. A floresta cada vez mais seca está vulnerável aos grandes incêndios florestais e coloca em risco a destruição de toda matéria prima necessária para manutenção da nossa cultura e sobrevivência", diz a nota.

As lideranças que assinam a nota da ATIX afirmam que "as instalações e as ações do PrevFogo no Território Indígena do Xingu são resultados de longos anos de conversa para estabelecer acordos com as lideranças e comunidades para adoção de novas tecnologias e estratégias para a proteção de nossas florestas". Eles acrescentam que "os impasses que ocorrem nesse processo sempre foram tratados através de diálogos para busca de soluções".

Em entrevista ao G1 Mato Grosso, o cacique Kuikumuro Amuneri, da aldeia Aldeia Ipatse, confirmou o apoio da comunidade à queima prescrita: "É muito importante ter queima prescrita na nossa área e a nossa comunidade apoia e entende esse trabalho. A gente sempre fala aos chefes das brigadas e aos não indígenas para entender também a nossa preocupação."

Em nota, a Funai informou que a atuação do PrevFogo em terras indígenas se dá devido a um acordo de cooperação técnica firmado com a entidade e classificou como infundadas as alegações de que o Ibama comete atos ilícitos no local sem autorização dos indígenas. "Nas terras indígenas jurisdicionadas à Coordenação Regional da Funai no Xingu, o PrevFogo conta com ampla aceitação das comunidades e tem se mostrado essencial na redução de danos ambientais causados pelo fogo. Dentre as técnicas de prevenção de incêndio existentes encontra-se a queima prescrita, cuja utilização no Território Indígena do Xingu está descrita no Plano de Queimas e prevista no Plano Trabalho Proteção Territorial, além de contar com autorização expressa de liderança da aldeia na qual será realizada a atividade", diz a nota.

Indígenas que aparecem no vídeo apreenderam veículo do Ibama

Nos segundos finais do vídeo, a autora do conteúdo afirma que apreendeu um veículo do Ibama e que ele só será devolvido quando a terra indígena for indenizada pelo "crime ambiental cometido". O Ibama confirmou que um veículo foi apreendido e solicitou a devolução do mesmo para a continuidade das ações.

"Os agressores exigiram que os brigadistas saíssem dos dois veículos e do UTV (Utility Task Vehicle) do Ibama, com a apreensão desse último. Temendo por sua segurança, os brigadistas tentaram permanecer dentro dos veículos, mas foram forçados a descer. Os agressores começaram a danificar as viaturas, primeiro tomando a chave de um dos veículos e, depois, ameaçando os brigadistas com as armas em punho", diz a nota.

Segundo o Ibama, após três horas, os brigadistas foram liberados para seguir em dois veículos. Eles registraram um boletim de ocorrência junto à Polícia Militar na cidade de Gaúcha do Norte (MT). O Verifica tentou contato com a PM e com a Polícia Federal, mas não recebeu resposta até a publicação desta checagem.

Em um vídeo feito com o intuito de "esclarecer" os fatos, Ysani Kalapalo aparece ao lado do pai e de outro homem, a quem chama de Guga, aparentemente irmão dela. Ele diz que flagrou os brigadistas colocando fogo no local e que pediu para que parassem, mas não foram ouvidos. "A única forma de pararem eles foi partindo pra cima do carro, pra cima deles. Com isso, acabou quebrando o retrovisor do carro. Esse carro não é dos brigadistas daqui, é do Ibama, do governo federal. O estrago que meu pai fez no carro não se compara com o que eles fizeram com a natureza", declara.

A ATAX repudiou o ato dos três indígenas da etnia Kalapalo e classificou o episódio como "isolado", mas que ameaçou a vida de algumas lideranças. "Os indivíduos que tentaram impedir com violência o trabalho dos brigadistas são pessoas com perfis já bastantes conhecidos em redes sociais que buscam nada mais que projeção em mídias e não representam o desejo e modo de agir das lideranças indígenas do Território indígena do Xingu", diz a nota.

Tebet se referia ao Pantanal quando disse que 'qualquer fogo ateado será considerado crime'

O governo federal anunciou uma série de ações de combate aos incêndios no Pantanal. Após uma reunião integrada entre ministros, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, disse que qualquer fogo ateado será considerado crime, mesmo aqueles controlados.

A fala vem sendo usada fora de contexto para alegar que o Ibama cometeu crime ambiental ao usar a prática da queima prescrita. Tebet se referia especificamente ao Pantanal, e não aos biomas do Cerrado e da Amazônia, onde fica o Parque Nacional do Xingu. A fala completa da ministra pode ser vista neste vídeo, a partir de 7 minutos e 42 segundos.

Usar fogo controlado está previsto em lei, mas cada um dos Estados onde isso é feito determina o período em que essa prática é permitida e proibida. No caso do Mato Grosso, o decreto deste ano proibia o fogo para limpeza e manejo de áreas entre 1º de julho e 30 de novembro, tanto nos biomas Cerrado e Amazônia quanto no Pantanal.

Dada a gravidade da situação das queimadas no Pantanal, a proibição do uso do fogo controlado neste bioma foi antecipada para 17 de junho e segue até 31 de dezembro. Além de não afetar o bioma Pantanal, a queima prescrita citada no vídeo investigado ocorreu em 18 de junho, dentro do período permitido pelo governo do Mato Grosso.

Indígena que aparece no vídeo

Quem aparece no vídeo é a influenciadora indígena Ysani Kalapalo, que possui mais de 930 mil seguidores no Instagram. Ela também utilizou o vídeo de Tebet fora de contexto para acusar o Ibama de crime ambiental.

Ysani se tornou conhecida após integrar a delegação oficial do Brasil à Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, em 2019, sob a presidência de Jair Bolsonaro (PL).

Na época, a escolha da indígena para integrar a delegação foi criticada por representantes de 16 povos do Xingu e considerada ofensiva por "dar destaque a uma indígena que vem atuando em redes sociais com o objetivo único de ofender e desmoralizar as lideranças e o movimento indígena do Brasil".

Este conteúdo foi publicado no Facebook e Instagram. Leitores do Verifica também pediram a checagem através do WhatsApp, no número (11) 97683-7490.

Estadão
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