Como funciona o algoritmo capaz de prever ataques cardíacos em pacientes
Órgão que regulamenta medicamentos e alimentos nos EUA aprovou uso de software que analisa sinais vitais e assim ajuda a antecipar ataques do coração ou falhas respiratórias seis horas antes que ocorram.
Imagine se você pudesse saber que vai sofrer um ataque do coração horas antes de ele ocorrer.
Embora pareça cena de filme ou série de ficção científica, isso já é realidade - pelo menos para alguns pacientes de hospitais nos Estados Unidos.
A FDA, agência americana que regula os setores de medicamentos e alimentos, acaba de aprovar o primeiro algoritmo que pode prever mortes repentinas por episódios cardiorrespiratórios.
Trata-se de um software que analisa os dados de pacientes monitorados em hospitais e calcula o risco que existe de eles virem a sofrer um ataque cardíaco ou uma falha respiratória.
O algoritmo, que foi desenvolvido utilizando os registros médicos de milhares de pacientes, pode detectar qualquer um desses episódios até seis horas antes de sua ocorrência e alertar médicos e enfermeiros.
"Hoje em dia, os serviços de saúde estão atravessando uma tempestade perfeita: as pessoas vivem mais anos, mas têm mais doenças crônicas. E muitos dos médicos com mais experiência estão se aposentando", diz à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, Lance Burton, diretor-geral da ExcelMedical, empresa médica tecnológica que desenvolveu o algoritmo.
"Os pacientes estão sendo monitorados, mas muitas vezes os médicos e enfermeiros só reagem quando ocorre um evento catastrófico, não antes", afirma ele.
Em muitos hospitais, os profissionais do saúde precisam cuidar de muitos pacientes ao mesmo tempo. E mesmo que houvesse pessoas dedicadas exclusivamente a coletar e a analisar os sinais vitais, é improvável que pudessem antecipar todos os problemas.
"Nós, humanos, não podemos processar toda a informação de um paciente. Fica muito difícil poder saber quando ele irá piorar", explica Burton.
O sistema, batizado de Plataforma Clínica WAVE, cruza toda a informação e "antecipa padrões nas informações que não são reconhecidas pelo olho humano".
Mas mesmo que o sistema pareça promissor, ele ainda não pode ser utilizado fora do ambiente de uma unidade de terapia intensiva.
Os criadores da plataforma esperam, porém, um dia também conseguir desenvolver um sistema que antecipe e previna ataques cardiorrespiratórios na população em geral.
Outra limitação do WAVE é que ele não pode antecipar derrames cerebrais, outra das causas mais frequentes de invalidez e de morte.
Terceira causa de morte
De acordo com uma pesquisa da Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, 10% de todas as mortes ocorridas nos Estados Unidos se devem a erros médicos.
Essas mortes inesperadas ou evitáveis que ocorrem nos hospitais, muitas vezes devido à incapacidade das equipes de saúde para detectar os riscos, comunicá-los e atuar antes dos sinais clínicos de piora, representam a terceira causa de morte no país.
Os criadores da plataforma WAVE acreditam que muitas das mais de 250 mil pessoas que morrem em decorrência disso todos os anos no país (números da pesquisa da John Hopkins) poderiam ter sido salvas.
O sistema é muito simples de usar e não necessita de nenhum equipamento específico - ele utiliza o sistema de monitoramento já existente na maioria dos hospitais.
O software analisa cinco variáveis-chave: o ritmo cardíaco, o respiratório, a pressão sanguínea, a temperatura corporal e a saturação de oxigênio.
Por meio de um aplicativo de celular, tablet ou computador, a equipe de saúde dos hospitais pode acessar esses dados em tempo real.
Ou seja, é possível monitorar os pacientes sem estar a seu lado - e até sem necessariamente estar no hospital.
Mas a grande novidade do WAVE é seu algoritmo único, que tem o nome oficial Visensia Safety Index.
Esse algoritmo - o primeiro do tipo a receber o selo de "bom" da FDA - cruza toda a informação sobre cada paciente e quantifica seu nível de risco em uma escala que vai de 0 a 5.
Isso permite aos médicos e enfermeiros precisar checar apenas esse dado para saber o estado dos pacientes.
Se algum deles ultrapassa o número 3 na escala, o sistema automaticamente envia um alerta para que a equipe médica faça alguma intervenção.
Os testes clínicos com o ExcelMedical no Centro Médico da Universidade de Pittsburgh, na Pensilvânia, foram bem-sucedidos.
Entre os pacientes que não utilizavam o WAVE, houve seis mortes inesperadas em um período de oito semanas. Entre aqueles monitorados com o software, nenhuma.
Nem todos podem ser salvos
O diretor-geral da ExcelMedical, que desenvolveu o algoritmo, reconhece que nem sempre uma detecção precoce irá salvar um paciente de um iminente ataque cardíaco ou falha respiratória.
"Há pacientes que entram em um hospital e que sabemos que não irão sair", afirma Burton.
"Queremos ajudar especificamente aqueles que morrem de maneira inesperada, que sofrem uma piora seja por complicações após uma operação de rotina ou devido ao efeito de certos medicamentos", exemplifica.
Burton conta que a empresa está trabalhando no desenvolvimento de outros algoritmos que poderiam antecipar - e no final prevenir - causas conhecidas de morte. "Nosso próximo projeto é sobre septicemia", diz, referindo-se à infecção que afeta 20 milhões de pessoas por ano no mundo e mata 8 milhões.