Após 9 anos, nenhuma meta da gestão do lixo foi cumprida no País
Brasil ainda tem cerca de 3 mil lixões a céu aberto, segundo associação de empresas de limpeza; produção de lixo aumentou 28%, quando meta era reduzir
SÃO PAULO - Nove anos após a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), o Brasil não conseguiu cumprir nenhuma meta para a gestão do lixo. Em alguns aspectos, o País inclusive caminha na direção contrária de diretrizes que levaram duas décadas para serem aprovadas no Congresso.
A produção de lixo aumentou 28% de 2010 a 2017, segundo os dados mais recentes da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), divulgados nesta sexta-feira, 2. A meta para este ano era reduzir, na mesma proporção, a produção de resíduos destinados a aterros.
O País ainda tem 3 mil lixões a céu aberto, que deveriam ter sido extintos em 2014. A taxa de reciclagem ficou praticamente estagnada - foi de 2% para 3% no período. Cerca de 7 milhões de toneladas de lixo por ano continuam fora do sistema de coleta regular e não vão sequer para os lixões, segundo a Abrelpe.
"As práticas de gestão de resíduos no Brasil vão na direção contrária daquilo que é recomendado, e que já foi entendido como a direção correta a ser seguida", diz o presidente da Abrelpe, Carlos Silva Filho. "Ninguém se mobilizou até o momento para tirar a lei do papel."
Os motivos apontados por especialistas para o fracasso da PNRS vão da penúria financeira de prefeituras à falta de articulação entre municípios, Estado e a União. Boa parte das normas previstas na lei, que servem para regulamentar a política, não foram publicadas pelo governo federal. Segundo Silva Filho, isso deixou municípios sem orientação para como desativar lixões, por exemplo, ou incentivos para a reciclagem.
O Índice Índice de Sustentabilidade Urbana (Islu), elaborado pelo Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (Selurb) e pela consultoria PwC Brasil, mostra uma espécie de abismo entre o desempenho de cidades que cobram taxas para a gestão do lixo e aquelas que dependem apenas de orçamento próprio. Quase 80% dos municípios que têm arrecadação específica para o lixo usam aterros sanitários. Entre as cidades que não cobram pelo serviço de coleta, só 35% estão em situação regular.
"Precisamos modernizar nosso modelo de custeio. Estamos com um modelo de custeio do século passado", diz o diretor de sustentabilidade do Selurb, Carlos Rossin.
Prejuízo
A Abrelpe estima que o País desperdice entre R$ 13 bilhões e R$ 15 bilhões por ano com as falhas no cumprimento da PNRS. Só o prejuízo pela falta de reciclagem do que vai para aterros é calculado entre R$ 8 bilhões a R$ 10 bilhões por ano. São gastos, ainda, cerca de R$ 5 bilhões com medidas de recuperação ambiental e com tratamentos de saúde por problemas causados pelo descarte irregular de lixo.
Há uma enorme desigualdade entre regiões, como mostram dados do Islu. O uso de aterros sanitários chega a 88,6% dos municípios pesquisados na região Sul. O índice foi praticamente igual ao do ano anterior. A região Norte piorou seu desempenho - de 14,1% para 12,8%. O maior avanço foi no Sudeste, onde subiu de 51,1% para 56,9%. No Centro-Oeste, foi de 14,4% para 18,6%. O Nordeste é a região com o pior resultado, mas melhorou seu índice de 11,4% para 12,6%.
Dos 3,3 mil municípios pesquisados, o índice mostra 51% com desempenho considerado médio. Outros 35% têm desempenho baixo ou muito baixo, e apenas 14% nível alto ou muito alto. Para o economista Jonas Okawara, responsável pelo estudo que elabora o Islu, a dificuldade de se adequar à lei do lixo foi agravada pela crise econômica que o país viveu, especialmente a partir de 2014.
"Os municípios que já tinham dificuldade para pagar a execução da coleta e o custeio da destinação (aterros), e acabam optando por soluções 'mais baratas', reativando lixões", diz Okawara. "Aqueles que tinham a possibilidade de manter o custeio por causa da arrecadação específica, eles sim conseguiram mantar a gestão de resíduos adequada e avançar no cumprimento da PNRS."