Antecipar feriados em 2020 ajudou a frear a covid em SP?
Índice de isolamento no período de 20 a 25 de maio do ano passado subiu apenas 1,5 ponto percentual em relação à média da semana anterior
O prefeito Bruno Covas (PSDB) anunciou nesta quinta-feira, 18, que a cidade de São Paulo irá antecipar dois feriados municipais deste ano e outros três de 2022 para os dias 26, 29, 30 e 31 de março, e 1º de abril. Somados com o fim de semana e a Páscoa, a capital terá dez dias seguidos de recesso. O objetivo é reduzir a circulação de pessoas diante da explosão de infecções pela covid-19 e falta de leitos no País. No ano passado, medida semelhante foi adotada e não alavancou os índices de isolamento social. Especialistas, que têm defendido lockdown rigoroso para frear o contágio, veem risco de fuga de paulistanos para o interior e o litoral.
Em 2020, houve antecipação dos feriados de Corpus Christi, da Consciência Negra, além do ponto facultativo decretado pela prefeitura de São Paulo para os dias 20, 21 e 22 de maio do ano passado. Já o governo estadual antecipou o feriado de 9 de julho para a segunda-feira subsequente, dia 25, com o mesmo objetivo de reduzir o contágio.
A variação do índice de isolamento social na capital paulista nos seis dias de feriado em comparação à semana anterior, sem feriado, foi de apenas 1,5 ponto percentual. Entre os dias 20 e 25 de maio do ano passado, a média de paulistanos que ficaram em casa foi de 51,83%, enquanto nos mesmos dias da semana anterior, em que não houve feriado, foi de 50,33%, conforme o Índice de Isolamento do governo do Estado de São Paulo.
Especialistas em saúde afirmam que é necessário um índice de 70% de isolamento para ter redução significativa do contágio. Na quinta-feira, 18, último dia com dado disponível, a taxa de paulistanos em quarentena na cidade estava em 44%, conforme os dados do governo. Os dados oficiais são baseados em sinais capturados pelas antenas de operadoras de telefonia.
Em 20 de maio, dia do início daquele feriado, a média móvel de infecções confirmadas era de 1.295. Este número subiu para 1.400 no dia 27, e para 2.502 em 3 de junho. Especialistas afirmam que é preciso pelo menos duas semanas para começar a sentir os efeitos de medidas restritivas ou de um lockdown. Em relação a mortes, a média móvel registrada era de 91,57 em 20 de maio, subiu para 98,71 no dia 27, alcançou 105,43 no dia 3 de junho e teve queda para 95,43 no dia 10 do mesmo mês.
A nova decretação do feriado adiantado já opõe Covas e o governador João Doria (PSDB), que viu precipitação. Segundo ele, "uma medida como essa deveria ser discutida previamente com governo estadual e prefeitos da região metropolitana e do litoral". Em resposta, Covas disse que falta senso de urgência. "Aqui na Prefeitura tem menos falação, foco no trabalho e colaboração. Faço o máximo que posso para defender o povo da minha cidade. Sempre aberto a colaborar com outras cidades e com o governo do Estado. Mas cada um precisa assumir suas responsabilidades."
O prefeito de Santos, Rogério Santos (PSDB), fez apelo para que os paulistanos não viajem para a praia nos dias livres. A Baixada Santista criou restrições no transporte público e vai fechar supermercados no fim de semana. A gestão Doria suspendeu a Operação Descida no Sistema Anchieta-Imigrantes, na tentativa de reduzir o fluxo nas estradas. Segundo as regras da fase emergencial vigente no Estado, o acesso às praias está restrito e continuam proibidas as festas e aglomerações. Cidades do interior, como Socorro e Ibitinga, também vetaram o aluguel de chácaras para evitar visitantes.
Antecipar feriado pode piorar o cenário, diz professora
Epidemiologista da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ethel Maciel vê dificuldade em ter êxito com a medida no cenário atual. "Se não houvesse polarização tão grande, com o presidente dizendo que vai entrar no STF contra medidas de governadores para restringir a circulação, seria possível que as pessoas compreendessem e utilizassem esse feriado para ficar em casa e não se deslocarem, para ficar sem grandes interações sociais a fim de diminuir os contatos diários", afirma.
A especialista avalia que a decisão pode criar um deslocamento para locais turísticos e agravar o quadro destas cidades menores. "Com a cadeia hoteleira sendo considerada serviço essencial, o que avalio um erro, a probabilidade de termos pessoas que vão para cidades litorâneas ou que saiam para fazer turismo é grande. Leva o risco a essas cidades pequenas com menor infraestrutura de atendimento, onde estas pessoas vão interagir, saindo de um lugar com maior risco e levando alguém infectado que pode aumentar a transmissão do vírus na região", aponta Ethel.