"Cobrança de certidão da vacina deve ser como de passaporte"
Infectologista da Unesp critica verificação amostral da imunização dos viajantes pela Anvisa
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) iniciou nesta semana a cobrança do passaporte da vacina nos aeroportos e fronteiras, mas o órgão regulador admite fazer apenas verificação amostral. Passageiros relatam que o documento tem sido cobrado apenas de parte dos viajantes.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, também esclareceu que a medida vale apenas para quem sair do Brasil a partir desta quarta-feira, 15. Isso, segundo a Corte, para não surpreender passageiros que não haviam sido avisados antes da obrigatoriedade da vacinação. A Advocacia-Geral da União AGU) tentou argumentar que a apresentação de um documento de recuperação da covid-19 poderia substituir a certidão da vacina, tese que foi rejeitada pelo magistrado.
Para o infectologista Carlos Magno Fortaleza, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), a apresentação da comprovação de documento de recuperação não faz sentido. O médico também afirma que a cobrança do documento de vacina deve ter o mesmo rigor que a exigência do passaporte, para evitar riscos de espalhamento do vírus, sobretudo diante do avanço da variante Ômicron.
A forma amostral de cobrança do passaporte vacinal, como mencionada pela Anvisa, é eficiente no controle da entrada de novas variantes e pessoas infectadas?
Não. Quando temos necessidade de garantir de forma absoluta uma proteção ou garantir que nenhuma pessoa doente entre no nosso território, não podemos apelar para a representatividade amostral. Precisamos de sensibilidade máxima, tanto aos assintomáticos quanto aos não vacinados.
Precisamos da máxima sensibilidade de identificar os que têm sintomas e podem estar com covid e os que não estão vacinados. Chamamos isso de vigilância por sensibilidade, enquanto aquela por amostra é de representatividade, que acontece quando queremos imaginar quantas pessoas têm covid, com base em um pequeno grupo, como uma pesquisa eleitoral.
Toda pessoa que já viajou para o exterior sabe que há uma série de ritos na alfândega e na entrada do país. Exigir o comprovante de vacinação não aumentará em nada esse processo de trabalho.
De que forma esse controle deveria ser feito?
Esse controle deve ser feito com o mesmo rigor que se faz um controle de passaporte. Precisa ser avaliado o documento de 100% das pessoas que entram no País e, evidentemente, negado o acesso dos que não comprovaram.
A quarentena de cinco dias proposta pelo governo na regra anterior para a entrada de viajantes vindos do exterior poderia ter efeito objetivo no controle do vírus?
Essa medida sequer se sustenta tecnicamente, porque temos infectados que levam de 10 a 14 dias para desenvolver sintomas. Logo, cinco dias não seriam efetivos. Também é absurda do ponto de vista operacional, porque nenhuma instituição no Brasil é capaz de fiscalizar a quarentena por cinco dias de quem entra no País. É preciso ver a diferença de recursos humanos e estruturais entre vigiar
E o "comprovante de recuperação" proposta pelo AGU?
Essa proposta é uma lesão tanto sanitária quanto jurídica. Evidentemente, ela não se sustenta quando se sabe que a cura de um episódio não impede a reinfecção, a gravidade e nem transmissão do vírus. O comprovante de recuperação, absolutamente, não tem nenhum impacto. Seria o equivalente a pedir o comprovante de uma dose para vacinas que necessitam de duas.
Como convencer as pessoas que alegam "restrição de liberdade" sobre a importância do passaporte vacinal?
Primeiramente, há uma contradição de termos, porque restringir a liberdade de se movimentar por cinco dias aparentemente não é um problema, mas a do passaporte vacinal é. Imagina a quantidade de fiscais necessários… Quem assumiria essa responsabilidade, incluindo aquela por erros e fiscalizações inadequadas? Seria o âmbito municipal, a Anvisa, a vigilância sanitária? É evidente que essa proposta não será cumprida.