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Coronavírus

Mais fusões que confusões

Empresas têm procurado fundos de investimento para viabilizar sua expansão ou sobrevivência

22 jun 2020 - 05h12
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A nomenclatura das transações de compra e venda de empresas no Brasil adota o jargão internacional de "M&A" (mergers and acquisitions, ou fusões e aquisições). Em termos práticos, o mercado brasileiro é composto apenas pelas aquisições - já que as fusões, no Brasil, juridicamente falando, são raríssimas. Mas, muitas vezes, a nomenclatura em seu sentido coloquial é conveniente para não expor vencidos e vencedores numa transação de M&A.

As fusões têm superado as confusões no campo corporativo, mas como está se comportando esse mercado no Brasil em tempos de pandemia e diversas outras instabilidades no campo político-econômico?

O mercado de M&A se tornou algo rotineiro na vida das empresas brasileiras nas últimas duas décadas. Aquilo que era um último recurso para os empresários tradicionais nos anos 80/90 passou a ser rotina em um mercado muito mais maduro e sofisticado.

Naquela época, vender uma empresa poderia ser considerado um sinal de derrota ou fraqueza de um grupo empresarial, mas agora pode ser visto como sabedoria, desprendimento ou até oportunismo.

Os agentes do mercado mudaram para melhor. Os empresários estão cada vez mais preparados e permeáveis para analisar diferentes fontes para financiar o crescimento de seus negócios em um ambiente de crédito escasso, abrindo espaço para receber investidores estratégicos e financeiros, nacionais e internacionais.

Os prestadores de serviços, como banqueiros, advogados, auditores e consultores, conseguem, também, cada vez mais executar uma transação com profissionalismo, sofisticação e agilidade, comparáveis com qualquer outra jurisdição de primeiro mundo.

Certamente, esse é um dos aspectos do Brasil que funciona muito bem. Além de avanços legislativos que trouxeram mais estabilidade para o ambiente das transações de M&A e atratividade para o capital estrangeiro, como a lei de arbitragem, lei anticorrupção, criação do Novo Mercado e outros segmentos de listagem da Bolsa de Valores (B3), entre outras, os participantes do mercado perceberam que realizar uma transação de venda de uma sociedade pode evitar muita confusão para seus stakeholders, especialmente em tempos de incertezas.

A figura de perenidade da empresa tem se sobreposto à perenidade dos sócios, e isso tem sido muito saudável para a continuidade dos negócios, preservação de empregos, fomento de crescimento, sofisticação das empresas e do seu corpo profissional e, principalmente, acesso a capital.

Repartir o mando e muitas vezes a participação acionária tem sido uma forma eficaz de manter o crescimento de empresas. A figura do dono deu lugar à figura do sócio. E a figura do sócio, muitas vezes, não se confunde com a figura do gestor. 

No meio da crise econômica que estamos vivendo, não seria impossível pensar numa paralisação quase integral nas operações de M&A no Brasil, com o incremento apenas de recuperações judiciais e falências. Não obstante esses dois últimos institutos, de fato, terem crescido nos últimos meses, felizmente a paralisação dos M&As não se concretizou.

Entramos em meio à crise da covid-19 com um ambiente de negócios muito mais preparado para possibilitar "saídas à mercado" que nas crises anteriores. Empresas têm procurado fundos de investimento para viabilizar sua expansão ou sobrevivência, competidores têm se juntado para lidar melhor com a crise e os próprios cidadãos estão cada vez perto dessas transações, por meio do incremento da participação de pessoas físicas nas operações estruturadas e de mercado de capitais.

Os desafios da crise e do desenvolvimento econômico do Brasil são enormes, mas um mercado de fusões e aquisições cada vez mais maduro é importante para continuar a atrair investimentos estrangeiros e para evitar que as confusões decorrentes de intermináveis litígios e processos de insolvência dominem a pauta dos departamentos jurídicos das empresas.

Por fim, vale ressaltar que ainda existe muita melhora a ser conquistada no ambiente legislativo para a atratividade de investimentos estrangeiros. Um bom exemplo é a necessidade de regras claras e estáveis para os investimentos dos fundos de private equity no Brasil, a fim de possibilitar maior segurança jurídica, principalmente em relação à temas tributários na estruturação de seus investimentos, bem como às consequências para as empresas que eventualmente não conseguem desempenhar como o esperado e acabam se tornando uma dor de cabeça eterna para os fundos e seus gestores.

Ainda existe muita oportunidade para melhora, mas a maturidade com que o mercado de M&A no Brasil tem se portado diante de uma crise global com características inéditas nos deixa otimistas e indica que estamos no caminho certo.

SÓCIO DO ESCRITÓRIO MATTOS FILHO

Estadão
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