Script = https://s1.trrsf.com/update-1731009289/fe/zaz-ui-t360/_js/transition.min.js
PUBLICIDADE

Coronavírus

'Manda nudes': a busca por prazer na internet durante a quarentena

Sem a possibilidade de encontros devido à pandemia, pessoas recorrem a nudes e conteúdo pornô nas redes sociais como forma 'descarregar a tensão sexual' e se 'sentirem desejadas', dizem especialistas.

13 abr 2020 - 06h33
(atualizado às 07h54)
Compartilhar
Exibir comentários
Segundo sexóloga, pessoas buscam 'descarregar a tensão sexual' por meio de troca de fotos, chamadas de vídeo e conversas
Segundo sexóloga, pessoas buscam 'descarregar a tensão sexual' por meio de troca de fotos, chamadas de vídeo e conversas
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

"Nudes e um copo de água não se nega a ninguém". Assim a estudante de medicina Luma*, de 19 anos, deu pistas, em uma rede social, de como lidaria com vontades sexuais neste período de isolamento social.

Sem sair de casa há 25 dias por causa da pandemia de coronavírus, a jovem paranaense que costumava frequentar baladas no fins de semana e manter parceiros sexuais regulares não teve muita opção.

"É o tal do tesão acumulado. Como não tem como ver a pessoa pessoalmente, a melhor coisa é interagir pela internet, mandando foto, entrando numa ligação. Dá para matar um pouco a vontade", conta a jovem, que passa o período de quarentena em casa com a irmã, em Foz do Iguaçu.

A atitude de Luma dialoga com os conselhos que estão vindo de todos os cantos do mundo.

Em Nova York, a prefeitura divulgou um guia em que sugere a masturbação como melhor forma de evitar o contágio. "Você é seu parceiro sexual mais seguro", diz o comunicado.

O Ministério da Saúde da Colômbia, por sua vez, orientou pessoas que não estão em um relacionamento fixo para adiar os encontros ou optar pelas relações virtuais.

No Brasil, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, liderado pela ministra Damares Alves, divulgou uma cartilha em que aconselha profissionais do sexo a fazer atendimento online.

Com um isolamento que atinge bilhões de pessoas no mundo inteiro, o consumo e o compartilhamento de conteúdos sexuais vêm aumentando.

Acessos ao site PornHub, por exemplo, uma das principais plataformas de vídeos adultos do mundo, chegaram a crescer 28,9% no Brasil em relação à média diária, no último dia 29 de março, que registrou o pico na curva de ascensão. No índice mundial, o crescimento foi de 24,4%, segundo dados do próprio PornHub.

No Twitter, uma das poucas redes sociais que permitem o compartilhamento público de conteúdo adulto, hashtags que estimulam o compartilhamento de fotos sensuais, nudes ou a paquera apareceram entre os assuntos mais comentados da plataforma no Brasil, nas últimas semanas.

"Vamos agitar essa quarentena, me enviem fotos para avaliar", comentou uma jovem que pedia imagens a usuários masculinos da rede social.

Descarregar a tensão

Para a sexóloga Ana Canosa, membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Sexualidade Humana (SBSH), esse movimento é natural.

"A sexualidade é uma fonte de prazer importante para a vida humana e você pode obtê-lo sozinho, não precisa do outro. Num momento como esse, de isolamento, usar as ferramentas de tecnologia para essa busca é comum", diz.

O uso de celulares para fins de paquera e sexo não é um fenômeno novo, alertam os especialistas. Mas, sem opção do encontro "carne e osso" devido à pandemia, pessoas que até então não se interessavam por esse tipo de uso da tecnologia acabam experimentando.

"As pessoas já usavam a tecnologia para a descarga da tensão sexual e algumas até preferem mesmo as relações virtuais. Mas a satisfação é individual. Para quem gosta do encontro offline com o parceiro, não vai ser uma substituição, apenas uma forma de descarregar a tensão sexual daquele momento", lembra Canosa.

Plataforma popular de compartilhamento de conteúdo adulto, PornHub viu acessos aumentar no mundo inteiro
Plataforma popular de compartilhamento de conteúdo adulto, PornHub viu acessos aumentar no mundo inteiro
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

É o caso de Luma. Na quarentena, a jovem está fazendo com frequência algo que não fazia parte de sua rotina. Antes, ela conta que não compartilhava tanto conteúdo sexual com seus parceiros.

"Agora, quando bate a vontade, eu já chamo para aquele papinho mais quente. Nada supera a conexão do calor humano, mas já ajuda a não surtar".

O sociólogo Richard Miskolci, professor no Departamento de Medicina Preventiva e em Saúde Coletiva da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), ressalta que, por trás do isolamento social há uma questão de saúde pública que afeta o imaginário das pessoas, inclusive em termos eróticos e sexuais.

"O medo de se contaminar tende a ser maior que o desejo de contato físico, mas não inibe tampouco supre a necessidade de ser reconhecido como atraente ao outro", explica.

O prazer de ser desejado

Foi numa brincadeira em que pedia "nudes para avaliação" que o estudante de rádio e TV Luiz*, de 28 anos, começou a receber centenas de imagens de pessoas nuas em seu perfil no Twitter, em 2016.

Naquela época, impressionando com a quantidade de homens que queriam se expor, o mato-grossense resolveu criar um perfil para concentrar e divulgar essas fotos. "É um jogo de avaliação e prazer", diz o criador da hashtag que vem aparecendo com frequência entre as mais comentadas na rede social.

Luiz conta que, desde início do período em que as pessoas começaram a adotar o isolamento social, os números do perfil dispararam. Se antes recebia cerca de 100 fotos quando lançava a hashtag para a "disputa", agora recebe mais de 400. Os seguidores cresceram quase 100%, chegando a mais de 250 mil.

"Parece que está todo mundo à flor da pele, muita gente pedindo para a gente compartilhar conteúdo. A minha ideia tem a ver com a exposição, e as pessoas gostam de receber avaliação", explica Luiz.

Para o sociólogo Richard Miskolci, as conclusões fazem sentido. "É um desejo de ser desejado, amado, confortado em tempos de incerteza e solidão que nos fragiliza e faz sentir mais vulneráveis, inclusive em termos afetivos", opina.

Para sociólogo, medo de pegar a doença e maior do que a vontade de ir a um 'date'
Para sociólogo, medo de pegar a doença e maior do que a vontade de ir a um 'date'
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

O antropólogo Horácio Sívori, coordenador do Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos (Clam) da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), vai além e destaca que "no meio da catástrofe, o flerte, o sexo online, o pornô, a própria troca de nudes, podem não ser apenas formas de entretenimento, de combater a solidão, mas também de cuidar uns dos outros como coletivo."

Os especialistas ressaltam, entretanto, que o significado da troca de nudes será bem diferente para pessoas de diferentes gerações, idade, gênero, orientação sexual e raça. "Nem todo mundo estará em condições de participar de determinadas práticas do mesmo modo", lembra Sívori.

Internet e o 'sexo seguro'

A busca de meios tecnológicos para paquera, parceiros sexuais e amorosos também tem a ver com o histórico de epidemias.

De acordo com Richard Miskolci, as pesquisas mostram que foram os segmentos sociais que sofriam mais restrição a paquerar em público no passado que primeiro usaram a internet com esse fim, como homossexuais e mulheres.

Na época da epidemia da Aids, nos anos 1980 e 1990, homens gays passaram a se utilizar bastante de meios de paquera como os classificados nos jornais e revistas e os serviços telefônicos. Com a chegada da internet comercial, em 1995, os bate-papos e os sites de busca de parceiros também ganharam impulso.

"Isso se devia principalmente por que homens 'fora do meio' evitavam frequentar espaços de sociabilidade LGBT."

"Agora também há um incentivo - não mais restrito a apenas um ou outro segmento social - a usar os meios tecnológicos disponíveis para vivenciar o erotismo com segurança em tempos em que o contato físico está interditado. Trata-se de algo compreensível e com precedente histórico", explica Miskolci.

O fenômeno que seria mais recente, diz o sociólogo, é a expansão do uso de serviços de rede social não especializados para o mesmo fim. Ou seja, em vez de usar o Tinder, por exemplo, mais pessoas usam o Instagram, o Twitter e até o Facebook para paquera.

A sexóloga Ana Canosa alerta, entretanto, que não pode esquecer que "não há controle sobre o conteúdo compartilhado com os contatos". "Tem que ter cuidado para quem manda foto, com fotos mostrando rosto e com os dispositivos compartilhados com a família".

Para o cenário pós-pandemia, a especialista visualiza a oportunidade de se aproximar - e fazer sexo - com pessoas com quem foram criados laços mais fortes. "As pessoas estão alimentando esse tesão e têm a oportunidade de se fazer conhecer mais intimamente".

Já para Miskolci, o tempo de conversas online pode mostrar um "outro caminho" nessas relações. "Isso pode restaurar o interesse por afinidades para além das eróticas e sexuais, de maneira que o adiamento do encontro sexual traga até vantagens. Mas, apenas pesquisas a posteriori poderão avaliar o que agora se passa agora", conclui.

BBC News Brasil BBC News Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização escrita da BBC News Brasil.
Compartilhar
Publicidade
Seu Terra












Publicidade