MPF cobra explicações do ministro da Saúde sobre subnotificação do coronavírus
Procuradores citam aumento de mortes por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e querem saber detalhes da metodologia usada pelo Ministério da Saúde para computar casos do novo coronavírus
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) do Ministério Público Federal (MPF) questionou nesta quarta-feira (29) o novo ministro da Saúde, o médico Nelson Teich, sobre a provável subnotificação do número de mortes provocadas pelo novo coronavírus no Brasil. A petição é assinada pelos procuradores Deborah Duprat e Marlon Weichert.
Os procuradores deram o prazo de cinco dias úteis para que o Ministério responda aos questionamentos.
Na peça, os procuradores questionam o Ministério da Saúde sobre os aumentos nos números de sepultamentos em várias cidades brasileiras — que são muito maiores do que indicam os números oficiais de mortos pela epidemia.
"Informações oriundas de diversas fontes indicam um aumento substancial no volume de sepultamentos pelos serviços funerários em diversas cidades. Essas notícias, aparentemente, estão em desacordo com o Boletim Epidemiológico nº 14 (BE-14), no sentido de que a taxa de mortalidade por Covid-19 no Brasil se encontraria entre as mais baixas do mundo (20 óbitos por 1 milhão de habitantes)", diz um trecho do documento.
Duprat e Weichert também questionam sobre o aumento na quantidade de pessoas internadas e mortas com o diagnóstico de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG).
Segundo os procuradores, muitas das mortes não foram "devidamente esclarecidas e (ficaram) sem atribuição direta à covid-19, definidas como 'em investigação' nos boletins epidemiológicos", diz o ofício encaminhado ao ministério.
Até as 14h desta quarta-feira, o Ministério da Saúde registrou mais 449 mortes em decorrência da covid-19 e 5.466 novos casos da doença, no intervalo de 24h.
Recentemente, o site do Ministério da Saúde sobre o novo coronavírus passou a incluir uma aba onde é possível consultar também a evolução dos casos registrados como SRAG. O gráfico indica um aumento consistente no número de casos, e a maioria das ocorrências aparece como "em investigação" (cor amarela no primeiro gráfico).
Questionamentos
No ofício, os procuradores dirigem 12 perguntas ao Ministério da Saúde.
A PFDC busca saber, por exemplo, se o Ministério da Saúde está mantendo algum controle sobre os casos diagnosticados pelo critério clínico-epidemiológico.
É o que ocorre quando o paciente não foi testado para o novo coronavírus, mas apresentou os sintomas da doença depois de ter contato com alguém infectado.
Além disso, a PFDC quer saber se pessoas diagnosticadas pelo critério clínico-epidemiológico estão sendo incluídas nos números divulgados diariamente pelo Ministério da Saúde, sempre no fim da tarde.
Outro questionamento da PFDC diz respeito ao tempo decorrido entre a notificação de um caso suspeito do novo coronavírus, pelo critério clínico-epidemiológico e a confirmação por um teste laboratorial.
"Ou seja, em média, os dados divulgados em determinada data seriam correspondentes a suspeitas ocorridas quantos dias antes?", perguntam os procuradores.
Outra pergunta até agora sem resposta feita por Duprat e Weichert: há alguma explicação para o aumento do número de internações e óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave a não ser o novo coronavírus?
Por fim, os procuradores perguntam se o ministério está mantendo um registro do número de pessoas que morrem antes que possam fazer o teste para a covid-19.
"Como são computados os casos de pacientes diagnosticados clinicamente que vão a óbito antes da coleta de material para exame laboratorial? O Ministério possui a informação de quantos casos estariam nessa situação?", diz o texto.
Manaus: enterros quadruplicam, mas só 7 casos são registrados
O problema de subnotificação descrito pelos procuradores da PFDC é exemplificado pela situação na capital do Amazonas, Manaus.
Na semana passada, a cidade voltou a ganhar destaque no noticiário nacional por um motivo trágico: o aumento no número de sepultamentos em meio à pandemia do novo coronavírus.
Na quarta-feira (22), os cemitérios manauaras registraram 120 sepultamentos — quatro vezes a média diária de antes do novo coronavírus, que era de cerca de 30 enterros por dia, segundo a prefeitura.
Oficialmente, no entanto, Manaus registrou apenas sete mortes confirmadas pelo novo coronavírus naquele dia. A discrepância entre os dados foi reconhecida pela prefeitura da cidade. "A causa da morte não está sendo bem definida", disse um porta-voz da prefeitura à BBC News Brasil, na ocasião.