Nise insiste que cloroquina funciona em tratamento precoce
Afirmações da médica divergem de depoimentos já prestados à comissão, como do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta e do diretor da Anvisa
A médica Nise Yamaguchi e o senador Rogério Carvalho (PT-SE) protagonizaram discussão acalorada nesta terça-feira, 1º, durante a sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid no Senado.
O debate teve início após Nise voltar a insistir que a hidroxicloroquina tem eficácia no tratamento contra a covid-19. "O que acontece é que essas medicações têm sido bastante eficientes em tratar pacientes precoces, e não dá pra misturar todos os casos em todos os níveis conforme tem sido colocado", afirmou Nise apesar do uso do medicamento carecer de evidências.
Segundo Carvalho, Nise faria parte do núcleo negacionista do 'gabinete paralelo' que assessorou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nas questões relacionadas à pandemia da covid-19. "Chamamos de núcleo negacionista, mas eles são o núcleo teórico da imunidade natural de rebanho. Porque eles não são negacionistas, eles têm uma teoria nefasta, fúnebre, de expor à própria sorte os brasileiros com relação à doença", afirmou Carvalho.
"Eu tenho que colocar o meu repúdio a essa citação em que estou colocada ali dentro de um gabinete de exceção. Eu estou me sentindo bastante agredida nesse sentido", afirmou a médica. Em resposta, Nise disse entender a "indignação" do senador.
"Se a hidroxicloroquina nos tratamentos iniciais não funciona, aí realmente o senhor teria razão. O que acontece é que essas medicações têm sido bastante eficientes em tratar pacientes precoces", afirmou a médica. "Para mim, neste momento, é bastante importante (dizer) que o governo é um só, o País é um só. Nós precisamos estar nos relacionando entre os diversos partidos a partir de uma coerência e um conjunto de ações", reforçou.
Decreto para mudar a bula
Em seu depoimento, Yamaguchi também negou que tenha havido uma minuta de decreto para mudar a bula da cloroquina e incluir o medicamento no tratamento contra a doença. As afirmações da médica divergem de dois depoimentos já prestados à CPI: o do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta e o do diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres.
"Eu não minutei nenhuma mudança de bula", disse a médica ao relator da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), Renan Calheiros (MDB-AL). "Não houve nenhuma tentativa de decreto de mudança de bula nessa ocasião", sustentou.
Segundo ela, na reunião relatada por Mandetta e Barra Torres, o que ocorreu foi uma discussão sobre um rascunho de instrumento legal para a disponibilização do medicamento.
À CPI, Mandetta contou ter participado de reunião no Palácio do Planalto onde foi avaliada a possível mudança na bula. Na ocasião, relatou ter visto esboço do decreto para incluir na bula da cloroquina, medicamento para malária e doenças autoimunes, a indicação para tratamento contra covid-19.
Segundo ele, Barra Torres afirmou de maneira incisiva que a mudança não poderia ocorrer e em seguida auxiliares de Bolsonaro afirmaram que tratava-se apenas de uma "sugestão". Depois, também em depoimento à CPI, Barra Torres confirmou a reunião e acrescentou que teria reagido de forma pouco cortês à iniciativa.
Diante das reiteradas negativas de Yamaguchi nesta terça-feira, o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM) afirmou que "o certo é a gente fazer uma acareação" para confrontar as declarações da médica.
Yamaguchi aproveitou para negar que tenha participado de um gabinete paralelo, explicou que se reuniu quatro ou cinco vezes com o presidente Jair Bolsonaro - mas nunca individualmente - e disse que tem exercido o papel de "colaboradora eventual de qualquer governo que precisar".
A médica admitiu conversas com a área técnica do Ministério da Saúde sobre o uso da cloroquina, principalmente sobre dosagens, ainda que não haja eficácia comprovada do medicamento contra a doença.
No depoimento desta terça, Yamaguchi disse ser contra uma vacinação "aleatória" da população e reforçou a defesa do que chama de tratamento precoce. E, após tumulto na CPI, que chegou a ser interrompida por alguns minutos, afirmou que o "tratamento precoce não compete com o preventivo da doença".
Com informações da Reuters.
Assista também: