O casal de idosos que descobriu por acaso a covid-19 e venceu a doença em Alagoas
Casados há 65 anos, Jovino e Zélia Feitosa enfrentaram o novo coronavírus ao mesmo tempo e são considerados recuperados; no Brasil, 73% das mortes foram de pacientes com mais de 60 anos.
Há 65 anos, os alagoanos Jovino Feitosa, de 92 anos, e Zélia Feitosa, de 85, prometeram um para o outro que estariam juntos "na saúde e na doença".
Esse juramento nunca fez tanto sentido como há poucos dias, quando descobriram, por acaso, que estava com covid-19. Os dois se trataram e se curaram da doença provocada pelo novo coronavírus.
Pela idade, os dois faziam parte do grupo de risco para a doença. O casal mora em Maceió e não é de muitas palavras. À BBC News Brasil, apenas o agropecuarista aposentado Jovino falou, de maneira breve.
"Estou muito bem. O corona veio, eu peguei ele pelas orelhas e botei pra fora", brincou. "Estou muito bem e acompanhado pela família, graças a Deus."
Em um vídeo gravado por Jovino, ele se despede da doença: "Adeus, covid, até nunca mais".
Segundo um dos netos do casal, o empresário Sérgio Feitosa, os avós não apresentavam os sintomas da doença, e a descoberta só veio após Zélia ter ido a um hospital particular para tratar um corte na perna que não cicatrizava.
"Isso aconteceu em 30 de março. Levamos ela ao hospital e quando tiraram os sinais vitais dela, ela estava com a saturação (de oxigênio) baixa. Foi aí que fizeram uma exame que deu pneumonia e suspeitaram da covid-19", comentou.
De acordo com ele, foram feitos dois testes para covid-19, analisados em laboratórios de diferentes Estados.
O de Alagoas deu negativo, mas o feito em Minas Gerais deu positivo. "Aí foi preciso fazer um terceiro teste rápido, em Maceió, que apontou resultado positivo", contou o neto.
A essa altura, havia uma grande preocupação também com a probabilidade de Jovino, o avô, também ter pego o coronavírus.
Jovino é sete anos mais velho do que Zélia e tem fibrose pulmonar - por isso, já precisa usar um cilindro de oxigênio.
"Ele sempre ficou em alguns momentos mais cansado e teve diarreia e falta de apetite. Não achamos que ele estava com a doença, porque esses sintomas sempre foram 'normais'. Mas, quando fizemos o teste nele, deu positivo", disse Feitosa.
Os membros da família e três funcionários que trabalham na residência também fizeram os testes, mas todos deram negativo para covid-19.
Não se sabe como os avós contraíram o vírus, já que eles não saem de casa. "Acredito que foi alguma visita, ou alguém assintomático. Estamos achando que está acontecendo muita desinformação em relação aos casos de coronavírus no Estado. Se a gente não tivesse levado minha avó para o hospital, não saberia que ela estava doente", explicou.
Tratamento separado
Ambos foram tratados por médicos particulares. Zélia precisou ser internada, mas Jovino ficou em casa. Mesmo separados, os dois receberam praticamente o mesmo tratamento.
O pneumologista Tadeu Lopes, do Hospital Memorial Arthur Ramos, tratou Zélia e contou à BBC News Brasil que a idosa ficou internada por 13 dias, alguns deles na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Segundo o médico, o caso foi considerado grave, mas ela não precisou ficar entubada. Ela foi tratada com uma combinação de hidroxicloroquina, dois antibióticos (azitromicina e ceftarolina) e um antiviral, o Tamiflu, indicado para gripe.
"Ela evoluiu bem e respondeu satisfatoriamente às medicações, não apresentando reações à hidroxicloroquina ou efeitos colaterais", explicou o médico.
Segundo Lopes, Zélia pode ser considerada recuperada. "Se levarmos em conta os critérios clínicos, sim, ela está assintomática no momento", disse o médico.
Já Jovino foi tratado em casa por uma equipe de profissionais da saúde, entre eles a pneumologista Fátima Alécio, que disse que o estado de saúde de Jovino era considerado "moderado estável."
"Seguindo o protocolo do Ministério da Saúde, utilizei o tratamento com hidroxicloroquina e azitromicina. Mas ele estava estável, sendo tratado em casa, com assistência médica 24h e tinha toda uma estrutura de hospital", disse ela.
Alécio enfatizou que não há recomendação para que as pessoas tomem medicamentos por conta própria sem supervisão médica. "Se alguém está sentindo algo, deve procurar uma unidade de saúde e receber orientação médica."
Para a família, a cura de ambos, diante de tantas mortes de idosos pela covid-19 — 73% dos pacientes que vieram a óbito no Brasil têm mais de 60 anos, de acordo com os dados mais recentes do ministério da Saúde —, pode ser considerada um milagre.
"A nossa família crê muito em Deus, e nós acreditamos que isso foi um milagre, que eles são muito abençoados. Eles estão bem em casa", disse o neto do casal.