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Coronavírus

Por que a vacina da Pfizer/BioNTech pode nunca chegar aos brasileiros?

Imunizante contra a covid-19 aprovado hoje no Reino Unido enfrenta uma série de barreiras para sua adoção pelo Ministério da Saúde. Entenda os argumentos de todos os interessados nesta questão.

3 dez 2020 - 07h30
(atualizado às 08h22)
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Pouco mais de dez meses após a identificação do Sars-CoV-2, o coronavírus causador da pandemia atual, o mundo já tem a sua primeira vacina testada e aprovada.

O Reino Unido anunciou na quarta-feira (02/11) que o imunizante BNT162b2, desenvolvido pelas farmacêuticas Pfizer e BioNtech, está liberado para uso no país e começará a ser aplicado nos cidadãos de lá a partir da semana que vem.

E o Brasil? Será que temos alguma perspectiva do uso deste produto em nosso país? Pelas informações divulgadas até o momento, não existe nenhuma definição e há o risco de ficarmos sem acesso a ele.

As declarações dadas nos últimos dias por representantes do governo colocam um grande ponto de interrogação sobre a disponibilidade dessas doses aos brasileiros.

Desafio logístico

Sem citar nenhuma farmacêutica em especial, o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, criticou as promessas feitas por algumas produtoras de vacinas hoje pela manhã, durante uma entrevista coletiva.

"São muito poucas as fabricantes que têm quantidade e um cronograma de entrega efetivo para o nosso país. Quando chega no final das negociações e vai para a entrega e as fabricações, os números são pífios. É um número de grande quantidade que reduz a uma, duas, três companhias. A maioria fica com números muito pequenos para nosso país".

A fala está em consonância com outra manifestação feita na terça-feira por Arnaldo Medeiros, secretário de Vigilância em Saúde do ministério. O representante disse que o Brasil priorizaria os imunizantes que se adequassem à infraestrutura das salas de vacinação espalhadas pelo país.

"Fundamentalmente que ela [a vacina] seja termoestável por longos períodos, em temperaturas de dois a oito graus. Por quê? Porque nossa rede de frios, nas 34 mil salas, é montada e estabelecida com aproximadamente 2° C a 8° C."

Mais tarde, num vídeo publicado no canal de YouTube do Ministério da Saúde, Medeiros destacou que nenhuma das concorrentes mais avançadas está eliminada da lista de opções do governo.

"É extremamente importante avisarmos a população brasileira que o Ministério da Saúde, através do Programa Nacional de Imunizações, não descarta nenhuma vacina. O que nós queremos é uma vacina que seja registrada na Anvisa e que mostre eficácia e segurança necessárias."

Mas o que isso tem a ver com o produto de Pfizer/BioNTech recém-aprovado no Reino Unido? A grande controvérsia é que suas doses precisam ser armazenadas a -75 °C, uma temperatura que demanda equipamentos especiais. Essa exigência pode dificultar o transporte e a chegada das doses a regiões mais afastadas e com pouca infraestrutura.

Outras candidatas, como a Sputnik V, a CoronaVac e os produtos desenvolvidos por AstraZeneca/Universidade de Oxford ou Johnson & Johnson requerem uma refrigeração que varia entre 2° C e 8° C, valor facilmente obtido pelas geladeiras convencionais.

O que dizem os fabricantes

Por meio de nota enviada à imprensa, a Pfizer deu a sua versão sobre os fatos e as alegações. A empresa diz que possui um plano logístico detalhado e ferramentas para o transporte, o armazenamento e o monitoramento das doses na temperatura preconizada.

"Entendendo os desafios que alguns programas de vacinação poderiam enfrentar, a Pfizer desenvolveu uma embalagem inovadora em caixas nas quais o armazenamento da vacina a -75 °C pode se dar por 15 dias, em gelo seco."

A companhia ainda argumenta que sua vacina, cujos resultados já foram enviados para análise da Anvisa, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, pode ficar num refrigerador comum por até cinco dias. "Isso viabiliza a vacinação, principalmente na situação atual em que se pretende vacinar o maior número de pessoas em curto espaço de tempo."

Por fim, a nota destaca que outros países da América Latina com uma condição parecida a do Brasil, como Chile, Peru, México, Panamá e Costa Rica, já assinaram acordos de compra e têm condições de operacionalizar a aplicação das doses a partir do início de 2021.

Em entrevistas recentes, o CEO da farmacêutica no Brasil, Carlos Murillo, disse que tentou conversar com o Ministério da Saúde em diversas ocasiões ao longo do segundo semestre de 2020 para negociar a venda antecipada de doses dessa vacina contra a covid-19. De acordo com o executivo, o governo não respondeu aos contatos.

Mais recentemente, algumas reuniões entre o governo e empresa aconteceram, mas não houve nenhuma definição até o momento sobre compra de unidades do imunizante ou uma eventual transferência de tecnologia.

Portanto, mesmo se o Brasil fizer um acordo com Pfizer e BioNTech nos próximos dias ou semanas, estará bem atrás na fila de espera. A prioridade de entrega dos primeiros lotes será para as nações que anteciparam os seus pedidos.

A disponibilidade desse imunizante em clínicas privadas ao longo de 2021 também é remota. Afinal, a fabricação estará 100% voltada para suprir a necessidade dos governos mundo afora.

Falta de estrutura?

Outro lado a se manifestar nas últimas horas foi o Conselho Nacional de Climatização e Refrigeração, que reúne as 15 maiores entidades do setor no Brasil.

Por meio de um comunicado, o órgão assegura que o país tem capacidade de fornecer a tecnologia necessária para o armazenamento das doses de quaisquer vacinas, mesmo que elas precisem ficar a -75 °C:

"Se faz necessário esclarecer que o Brasil dispõe de uma forte cadeia de frio, com inúmeros fabricantes no território nacional, com tecnologia disponível. Além disso, o setor de serviços possui profissionais com conhecimento robusto para instalações de baixíssima temperatura, tanto que instalações de criogenia encontram-se presentes operando há muitos anos no Brasil. Portanto, o setor de frio nacional pode adequar a infraestrutura e disponibilizar soluções para qualquer temperatura, inclusive -70 °C, com planejamento e investimento."

O que resta ao Brasil?

Desde que as primeiras candidatas evoluíram para a fase 3 de pesquisas, a última etapa antes da aprovação, o mundo passou por uma verdadeira disputa, em que cada país se planejou para garantir as doses de uma ou de diversas farmacêuticas.

Algumas nações preferiram diversificar suas apostas — afinal, caso um imunizante se saísse mal nos testes clínicos, haveria outras opções de reserva.

O Canadá é o melhor exemplo disso: o acordo que os governantes deste país fizeram garantiram uma média de 9 doses de vacina para cada habitante, de acordo com informações compiladas pela revista The Economist. Logo atrás, aparecem Austrália e Reino Unido, com cinco doses por pessoa.

O Brasil, pelo contrário, lançou todas as suas fichas numa parceria para compra e transferência de tecnologia da formulação desenvolvida por AstraZeneca e Universidade Oxford.

Outra fonte importante de imunizantes ao país é a Covax Facility, uma iniciativa da Organização Mundial da Saúde para distribuição de algumas das vacinas às nações menos desenvolvidas.

Há ainda alguns acordos feitos pelos Estados. É o que acontece com Paraná e Bahia, que têm contrato assinado para receber futuramente a Sputnik V, do Instituto Gamaleya de Pesquisa, da Rússia.

O cenário é parecido com a CoronaVac, do laboratório chinês Sinovac, que firmou um convênio com o Instituto Butantan, em São Paulo.

O governador de São Paulo, João Doria, apresenta a embalagem da CoronaVac, desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac e testada no Brasil pelo Instituto Butantan. A taxa de eficácia dessa candidata ainda não é conhecida
O governador de São Paulo, João Doria, apresenta a embalagem da CoronaVac, desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac e testada no Brasil pelo Instituto Butantan. A taxa de eficácia dessa candidata ainda não é conhecida
Foto: Rodrigo Paiva/Getty Images / BBC News Brasil

Passos finais da corrida

Antes de aplicar qualquer vacina, é necessário que os estudos preliminares de fase 3, que testam a eficácia e a segurança do produto, sejam divulgados. Essa etapa já foi cumprida por quatro concorrentes: Pfizer/BioNTech, Moderna, Instituto Gamaleya de Pesquisa e AstraZeneca/Universidade Oxford.

Os três primeiros tiveram uma taxa de eficácia superior a 90%, que foi considerada ótima. Já no caso de AstraZeneca/Universidade Oxford, justamente a aposta do Ministério da Saúde, houve um erro na condução dos testes clínicos. Isso levantou algumas dúvidas sobre os resultados e pode atrasar um pouco a sua chegada.

Armazenamento das doses numa temperatura muito baixa é o principal entrave do uso da vacina de Pfizer/BioNTech no Brasil
Armazenamento das doses numa temperatura muito baixa é o principal entrave do uso da vacina de Pfizer/BioNTech no Brasil
Foto: FrankyDeMeyer/Getty Images / BBC News Brasil

Quando esse trabalho científico está concluído e atingiu seus objetivos, os documentos e relatórios são enviados às agências regulatórias, que avaliam a solidez daquelas informações e decidem se a vacina poderá ser usada ou não em determinado local. Foi o que aconteceu hoje no Reino Unido, o primeiro país a dar sinal verde a uma vacina contra a covid-19 no mundo. No Brasil, o órgão responsável por esse processo é a Anvisa.

Feita a liberação, o imunizante pode finalmente ser importado ou fabricado e distribuído para finalmente ser aplicado nas pessoas.

Diante das últimas informações, o clima por enquanto é de indefinição: ainda não sabemos quais das vacinas serão realmente utilizadas no país. Isso vai depender do avançar das pesquisas e, claro, da negociação que será conduzida a partir de agora pelo Ministério da Saúde.

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