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Coronavírus

“Pós-pandemia, jamais seremos os mesmos”, diz psicanalista

Já é possível supor mudanças nas relações afetivas e interpessoais, segundo Dora Gurfinkel, ouvida pelo Terra

26 jun 2020 - 10h51
(atualizado às 15h42)
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O medo diante do imprevisível está em evidência desde a chegada oficial da covid-19 ao planeta. A falta de uma vacina e de remédios e tratamentos comprovadamente eficazes acentua essa percepção e dá luz à discussão de como lidar diante de uma ameaça que não distingue classes sociais e avança como um tsunami silencioso – cientistas preveem que só no Brasil o número de mortes provocadas pelo novo coronavírus deve chegar a 100 mil em agosto.

“Como se proteger daquilo que não se conhece? O inimigo pode ter se apoderado do próximo, daquele que está ao nosso lado, de quem usa o elevador conosco. Os países fecharam as fronteiras. As informações chegam fragmentadas 24 horas por dia, repletas de contradições e desconfianças. Tudo isso gera estresse. Por outro lado, sinaliza mudanças”, comenta a psicanalista Dora Gurfinkel, cofundadora da Escola Brasileira de Psicanálise Movimento Freudiano.

Dora Gurfinkel estuda aspectos da saúde mental em tempos de pandemia
Dora Gurfinkel estuda aspectos da saúde mental em tempos de pandemia
Foto: Divulgação

Ainda é cedo, ela reitera, para pontuar com precisão o impacto da pandemia na relação das pessoas com o cotidiano. Mas existem pistas. As manifestações de afeto, por exemplo, a partir do isolamento social e do temor do contágio, tendem a passar por um processo de readaptação.

O aperto de mãos, o abraço e o beijo, que ganham mais força quando se recorre a imagem de avós e netos, na nossa cultura, sob a égide da distância física, traduzem esse paradoxo – afastar-se de entes queridos para a proteção de todos.

“As crianças vivem intensamente essa experiência agora, tomam consciência de que estar com o outro é perigoso. Isso certamente vai ter reflexos no futuro. Quais seriam? Ainda não se sabe.”

Essa questão, claro, abrange todas as faixas etárias. A própria psicanalista e seus parentes não têm desfrutado mais da companhia do médico, o doutor Meer Gurfinkel, 99 anos. O pai de Dora vive nos últimos três meses contando com a ajuda de duas cuidadoras, preservado do contato com os filhos, netos e bisnetos para evitar eventual exposição ao coronavírus. Mas mantendo a comunicação virtual com eles.

“O mais incrível é que ele compreende com lucidez o momento e sabe que nós não o abandonamos.”

Outro aspecto não menos relevante diz respeito à importância das redes sociais – que, dependendo do uso, pode ser uma armadilha – no dia a dia da pandemia. “É importante filtrar o que chega e não se tornar refém de notícias e lives que nos são oferecidas a cada segundo. Para manter a saúde mental, o uso dessa tecnologia pode ajudar a fortalecer nossas redes de amigos, de suporte.”

Dora Gurfinkel também antevê a necessidade de um esforço coletivo para acompanhar esse movimento que exige atualização constante e adaptação. “Os mais velhos vão ter de seguir as gerações mais jovens para usar com independência os recursos da Internet. Também é importante pensar em como essas inovações contemplarão as pessoas que não puderem ter acesso a esse tipo de comunicação. Caso contrário, continuaremos a ter um grupo cada vez maior de excluídos. Temos de pensar sobre isso. É hora de mudanças.”

A psicanalista mantém um canal no Instagram (@doragurfinkel), no qual aborda questões relacionadas à saúde mental a partir da pandemia.

Fonte: Silvio Alves Barsetti
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