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Coronavírus

Precisamos aplicar terceira dose de vacinas em idosos?

Especialistas dizem que a revacinação para essa faixa etária será necessária, mas veem com ressalvas uma injeção extra agora. Outros países, como Chile e Israel, já aplicam o reforço

13 ago 2021 - 05h10
(atualizado às 07h22)
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A morte do ator Tarcísio Meira, de 85 anos, vítima da covid-19, e o aumento de internações de idosos no Rio e em São Paulo levantaram o debate no Brasil sobre a necessidade de dar uma terceira dose para os idosos. Especialistas ouvidos pelo Estadão dizem que a revacinação para essa faixa etária será necessária, mas veem com ressalvas uma injeção extra agora, uma vez que boa parte dos adultos brasileiros ainda não foi completamente imunizada. Outros países, como Chile e Israel, já aplicam o reforço em grupos mais vulneráveis.

Tarcísio Meira faleceu aos 85 anos, após ter se vacinado com as duas doses da vacina contra covid-19
Tarcísio Meira faleceu aos 85 anos, após ter se vacinado com as duas doses da vacina contra covid-19
Foto: Renato Rocha Miranda / Globo / Divulgação / Estadão Conteúdo

Tarcísio Meira já havia completado a vacinação contra a covid-19 em março, mas não há confirmação sobre qual imunizante. Internado desde 6 de agosto no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, o artista foi intubado, mas não resistiu. A mulher dele, a atriz Glória Menezes, de 86 anos, também foi internada, com quadro mais leve.

A morte do ator não sugere ineficácia das vacinas. Em um momento de alta circulação do vírus, as infecções - mesmo em pessoas vacinadas - podem ocorrer. No caso de idosos que receberam as doses, os quadros podem evoluir para a morte, embora os riscos sejam pequenos. Os mais velhos e as pessoas imunocomprometidas, como pacientes de câncer, têm sistema imunológico mais enfraquecido e a produção de anticorpos - para qualquer vacina - é menor e cai com o tempo.

Carla Domingues, epidemiologista e ex-coordenadora do Programa Nacional de Imunizações (PNI), afirma que ainda faltam evidências científicas para definir a melhor estratégia de revacinação. Também diz que dados sobre internações e mortes de idosos vacinados não são conclusivos para que o País corra para dar a 3ª dose a esta faixa etária. "Essa decisão não pode ser tomada de forma assoberbada."

Estudo conduzido pela Fiocruz com pesquisadores do Observatório Covid-19 BR projetou aumento de internações de idosos com covid-19 nas últimas semanas. Em São Paulo, segundo os dados compilados pelo grupo, o crescimento ocorre tanto na faixa etária de 70 a 79 anos quanto na de idosos com mais de 80 - a subida é maior neste último grupo.

Os números não permitem dizer que o aumento de internações tem relação com a diminuição da proteção das vacinas, mas essa é uma das hipóteses, segundo Leonardo Bastos, do Programa de Computação Científica da Fiocruz. "A diferença entre os grupos é a cobertura vacinal. Eles (os idosos de mais de 70) receberam a vacina antes."

Os dados de internação da Fiocruz são projeções a partir de números oficiais do Ministério da Saúde, registrados com atraso. Para fazer a análise, os pesquisadores "aprendem" com o a demora de registros e estimam a situação real vivida nos hospitais. No Estado do Rio, a alta de internações é mais acentuada entre os maiores de 80, mas também já foi verificada na faixa etária de 60 a 69 anos em agosto.

Em julho, o Ministério da Saúde iniciou pesquisa para indicar a necessidade da 3ª dose para idosos que tomaram a Coronavac. O Estadão apurou que a câmara técnica do Plano Nacional de Imunização (PNI) vai discutir nesta sexta-feira a tendência de internações de idosos. Oficialmente, o ministério diz apenas que acompanha estudos de efetividade das vacinas e, "caso seja necessária a administração de doses adicionais, o tema será levado à Câmara Técnica Assessora em Imunização e Doenças Transmissíveis".

"É premente que o Ministério da Saúde estude o assunto para planejar", diz Carla. Antes de iniciar a 3ª dose, porém, ela acredita que o Brasil precisa acelerar a vacinação com a segunda dose, considerando o avanço da variante Delta, mais transmissível. Estudos já demonstraram que só uma dose das vacinas não protege contra a cepa. A possibilidade de revacinação, segundo a epidemiologista, deve ser estudada para todas os imunizantes - e não apenas para a Coronavac. Mas já se sabe que vacinas produzidas com vírus inativado, como é o caso da Coronavac, exigirão reforço no futuro.

No exterior, campanha do reforço já começou

Nos países que estão mais à frente na cobertura vacinal, a estratégia de revacinação já começou. É o caso de Israel, que iniciou este mês a aplicação da 3ª dose do imunizante da Pfizer em maiores de 60 anos. O país tem 62% da população totalmente imunizada graças a uma rápida campanha que começou em dezembro. No Brasil, só 22,4% da população tomou as duas doses.

Nos Estados Unidos, que têm metade da população totalmente imunizada, a Food and Drug Administration (FDA) analisa a liberação de doses de reforço contra a para pessoas imunocomprometidas. E, nesta quarta-feira, vacinados com duas doses da Coronavac no Chile começaram a receber uma 3ª dose da vacina da AstraZeneca.

A 3ª dose no Chile começou a ser aplicada para maiores de 86 anos, mas o plano nacional contempla vacinar com a dose extra os maiores de 55 anos nas próximas quatro semanas. O país andino conduziu uma das campanhas de vacinação mais eficientes do mundo, que já alcançou 82% do público-alvo com duas doses e quase 87% com uma dose.

Para a epidemiologista Ethel Maciel, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), o Brasil tem dificuldades de fazer esse debate porque parte significativa da população ainda não tomou nenhuma dose. "O Brasil precisa fazer esforços para ter mais doses e proteger as pessoas que têm diminuição da resposta imunológica."

Em Estados ou municípios com vacinação mais adiantada, o dilema de prioridades se impõe. A capital paulista, por exemplo, deve iniciar a vacinação de adolescentes este mês - e disse aguardar definição do Ministério da Saúde e do governo do Estado para planejar a 3ª dose aos idosos. Procurado sobre a intenção de aplicar a dose extra, o governo estadual paulista não respondeu. A prefeitura do Rio já informou que pretende aplicar uma terceira dose de vacinas em idosos antes do mês de outubro.

Ao Estadão, o presidente do Instituto Butantan, Dimas Covas, disse que, embora estudos da Sinovac já tenham mostrado que uma dose adicional potencializa a resposta imunológica no caso da Coronavac, "não podemos pensar em um novo ciclo quando apenas pouco mais de 20% da população recebeu a segunda dose" da vacina. "Temos de ter uma imunização de porcentual elevado, de 80% a 85% da população com as duas doses, para, inclusive, termos uma resistência maior às variantes", afirmou. Ele lembra que a Organização Mundial de Saúde não recomenda a terceira dose enquanto a cobertura entre adultos nos países segue baixa.

Segundo Ethel, uma eventual decisão de postergar a vacinação de adolescentes para atender idosos é complexa. "É difícil tomar decisões no cenário de escassez, não deveríamos ter de fazer essa escolha. E nossos adolescentes também merecem ser vacinados". Ela destaca que os EUA vêm registrando aumento de internações entre crianças e adolescentes, associado à variante Delta.

Uma saída nesse caso, diz, seria destinar a Coronavac para adolescentes e aplicar vacinas de RNA, como a da Pfizer, nos idosos. Estudos mostraram boa eficácia da Coronavac em crianças, mas o imunizante ainda não está aprovado no Brasil para esta faixa etária. O Butantan, responsável pela produção da Coronavac, aguarda a liberação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Já na opinião do infectologista Evaldo Stanislau, do Hospital das Clínicas da USP, uma vez observada alta de internações em idosos, a vacinação de adolescentes deveria ser adiada um pouco para dar preferência aos idosos. E medidas não farmacológicas têm de ser intensificadas no Brasil, segundo os especialistas. "Como estamos com transmissão acelerada, não tem medida única. Mesmo que a 3ª dose possa acontecer, precisamos usar máscara", diz Ethel. Outras medidas, como o distanciamento social, continuam recomendadas. /COLABOROU ROBERTA JANSEN

Estadão
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